Nem rolo compressor nem bola de neve gigante

Octávio Carmo, Agência ECCLESIA

A religiosidade popular é um fenómeno complexo, que convive bem com a dimensão universal (católica) da Igreja, que não pretende ser uma religião de elites. A sua história faz-se dentro dos povos, com os seus membros diversificados, a sua tradição e cultura, a sua história e os seus projetos.

Admita-se que a relação entre religião “oficial” e manifestações populares nem sempre foi pacífica. Seria errado, no entanto, ver esta relação numa chave de contraposição ou, pior ainda, de anulação das respetivas identidades: o catolicismo não é um rolo compressor, que destrua tudo à sua passagem, nem uma bola de neve gigante que incorpore indiscriminadamente dentro de si tudo o que vai encontrando pelo caminho.

Vale a pena lembrar que a conversão da Europa, iniciada logo no século I, ainda pela mão dos primeiros discípulos de Jesus Cristo, foi um longo e lento processo que só em 1387 se completou, por assim dizer, com o “Batismo” da Lituânia – e porque Ladislau II tinha em vista o trono da Polónia. Esta ‘Christianitas’ marcou profundamente os destinos do Continente em todas as suas dimensões, que devem ser descodificadas e valorizadas: a preocupação da Igreja com a difusão do seu credo resultou num processo de síntese e adaptação e não numa simples sobreposição de uma cultura sobre a outra, com destruição, ou obliteração de algumas das práticas ancestrais.

Em muitas festas e celebrações, contudo, o aspeto folclórico tende a sobrepor-se a este fundo de significações e memórias: a dimensão religiosa está mais colocada ao lado, mas é importante que continue, é necessário garantir o aspeto religioso na festividade, como uma manifestação de júbilo da comunidade.

Num período de globalização, em que tudo parecer ser igual e em que há tendências para uniformizar a cultura, há uma forte necessidade de as comunidades se identificarem. E essa identificação faz-se, precisamente, através da revivescência das suas tradições, fundamentalmente ligadas ao religioso.

Octávio Carmo

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