Livro «De Belém a Greccio» dá a conhecer como surgiu e quem criou a primeira representação do nascimento de Jesus
Lisboa, 07 dez 2023 (Ecclesia) – O padre Isidro Lamelas, da Ordem Franciscana, considera que o presépio de São Francisco de Assis, que assinala o 800º aniversário, tem uma mensagem de “extrema atualidade” devido à conjuntura em que surgiu, em 1223, num mundo em conflito.
“Num contexto de uma guerra [da Quinta Cruzada, na Terra Santa] demasiado opulenta, demasiado preocupada em defender o seu poder e as suas posses, São Francisco tem este gesto, como quem diz, não vale a pena andarmos a lutar pelos lugares santos ou por pedaços de terra ou por fronteiras e muros. Precisamos, sim, de nos reunir à volta do presépio”, disse à Agência ECCLESIA.
O docente da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa apresentou o livro “De Belém a Greccio” que diz ter nascido do facto de não existir literatura “no panorama editorial português” sobre quem inventou e por que motivo as famílias constroem o presépio nas suas casas.
Segundo o entrevistado, São Francisco de Assis teve como objetivo propagar a mensagem de que “Belém pode ser em qualquer parte, pode ser em Greccio, pode ser em Lisboa” e que cada um pode ocupar o lugar de São José e Nossa Senhora “vivendo a mensagem de Jesus”.
“Quando estamos a fazer o presépio, é um ritual, digamos, anual, em que nós, naquelas pecinhas, nos estamos também a colocar um pouco, estamos a ocupar o lugar das tais figuras centrais”, destacou.
“O objetivo do presépio é isto, é que esse Deus da paz renasça em nós, e em vez de andarmos movidos por outros interesses, valores, se calhar o valor da paz, que foi o que Jesus nos trouxe, o reino da paz, a mensagem de paz, nos habite, e então, nesse sentido, sim, fazer o presépio”, defendeu o padre Isidro Pereira Lamelas, que detalhou ainda da existência de uma iniciativa da Ordem Franciscana para assinalar os 800 anos da primeira representação do nascimento de Jesus.
Os Franciscanos promovem um concurso nacional de presépios para celebrar o acontecimento, que começam a ser expostos já amanhã.
“Quisemos, de várias maneiras e com iniciativas diferentes, celebrar esta ocorrência, já que ela teve tanto impacto na nossa cultura, nas nossas tradições, hábitos de Natal, neste caso, especialmente no presépio”, explicou.
De acordo com o sacerdote franciscano, as peças apresentadas a concurso, que decorreu até 20 de novembro, podem ser encontradas em três núcleos diferentes.
“Quisemos que esta exposição também fosse um bocadinho disseminada, para possibilitar mais visitas e, por outro lado, a ideia era um pouco, quem visita a exposição do Museu do Azulejo, depois é convidado a ir visitar o Seminário da Luz. Quem visita a do Museu de Lisboa, de Santo António, o mesmo objetivo e vice-versa”, adianta, em entrevista que é emitida hoje no Programa ECCLESIA (RTP2).
Os trabalhos estão em exposição até dia 7 de janeiro.
HM/LJ/OC
Efetivamente, o Santo de Assis não pretendeu reproduzir um modelo já conhecido. Aliás – o que é surpreendente – o Poverello não convocou para o Presépio os protagonistas habituais: nem Nossa Senhora, nem São José… nem sequer (espanto!), o Menino! Os únicos elementos que requereu para a celebração da noite de Natal foram: um boi, um burro… e uma manjedoura com feno. O seu intuito foi, consequentemente, outro: realizar uma celebração inusitada, uma experiência singular: não se tratou apenas de uma representação da Natividade, mas também da «recriação» do nascimento de Jesus, com uma mensagem clara, de paz e bem, dirigida a todos. A intenção era que esta experiência fosse tão marcante que não necessitasse de se repetir. E Francisco, pelo menos nos mesmos moldes, não a repetiu.
(De Belém a Greccio. O Presépio de São Francisco de Assis) |
Francisco sente, na verdade, uma viva afeição pelos animais e pelas flores, e considera-as como irmãos e irmãs – e a razão profunda desta fraternidade é o facto de serem criaturas de Deus-Trindade, saídas, como ele, das «mãos» do Pai, queridas e amadas por Deus. […] Para ele, o Nascimento de Jesus significa uma nova criação, ou a renovação de todas as criaturas numa espécie de regresso ao paraíso, mas com o olhar no futuro do Cristo Total. Portanto, muito mais do que uma festa piedosa ou de devoção «cristã», o Natal assume, em Francisco, uma abrangência cósmica e universal.
(De Belém a Greccio. O Presépio de São Francisco de Assis) |
A iniciativa de Francisco é concebida como um exercício de reavivar a memória, contra o «esquecimento» de Jesus. Um esquecimento que tem como consequências o «adormecimento» que, por sua vez, traz o endurecimento dos corações. Para despertar de novo o Amor adormecido, não basta doutrina, mas é também preciso o «exemplo» que torne visível o invisível. Foi este o grande objetivo e resultado da «encenação» de Greccio.
[…] Com Francisco, o Natal passa a ser a festa dos sentidos e dos afetos representados, desde então, cada vez mais, no presépio. […] A celebração de Greccio alcançou o seu objetivo: despertar nos corações a consciência da presença de Deus na vida dos homens. Como fruto da emocionante pregação daquele Natal, Cristo ganhou vida no coração de muitos. Francisco lembra aos ouvintes do seu tempo e do nosso tempo que Deus nos é de tal modo próximo que é possível ignorá-lo, mas também é sempre possível encontrá-lo. (De Belém a Greccio. O Presépio de São Francisco de Assis) |
Publicações: Lançamento da obra «De Belém a Greccio – o Presépio de São Francisco de Assis»