Natal: culturas «cristã» e «comercial» excluem-se

Laicidade é «ditadora» e quer impor «pensamento único», avisa D. Manuel Linda, bispo auxiliar de Braga

As culturas “cristã” e “secular-comercial” desconhecem-se e excluem-se e a laicidade é “ditadora” e quer impor um “pensamento único”, defende D. Manuel Linda, bispo auxiliar de Braga.

No artigo ‘A Europa sofre de Alzheimer?’, que escreveu para o semanário da Agência ECCLESIA, o prelado defende que a “emancipação do pensamento e das formas de vida social da tutela religiosa cristã” tem conduzido à construção de “novos dogmas, incontestados e incontestáveis”.

Depois de sustentar que a laicidade “é um dos pilares da cultura ocidental” e possui “valores assinaláveis”, D. Manuel Linda adverte que o seu “perigo” reside na apetência para “excluir violentamente o que não se coaduna com ela e pretender dissolver os elementos que asseguram a coesão da cultura ocidental, com destaque para o religioso cristão”.

Segundo o prelado, a “profanidade” do mundo e o “alto apreço pela materialidade” estão na base de um “‘encantamento’ de substituição em tudo paralelo ao que se contesta”.

A superação deste fenómeno passa, de acordo com D. Manuel Linda, “pela capacidade de contestação e diferença e pela redescoberta da verdadeira chave de acesso ao acervo da grande cultura”, sem esquecer as expressões artísticas contemporâneas.

O prelado recorda que a cultura “liga o presente, seus hábitos, símbolos, produções, tradições e conceitos básicos, à longa história da humanidade”.

“Se faltam códigos de reconhecimento ou chaves de interpretação, por mais valiosos que sejam os conteúdos da cultura, ela funciona como museu fechado do qual se perdeu a chave da porta: nem se entra nem se desfruta”.

O bispo auxiliar de Braga dá como exemplo obras artísticas, literárias e musicais que perdem parte essencial do seu significado quando não são entendidas à luz das referências que as motivaram.

Para D. Manuel Linda, é preciso “desmascarar e pôr a ridículo alguns desajustes chocantes da realidade”, como “iluminações com renas e trenós, em Faro, onde nunca qualquer rena passeou ou neve caiu”, ou o “Pai Natal agasalhado até ao nariz, nas praias do Brasil, onde a temperatura asfixia e obriga a aligeirar a roupa”.

Diante destas imagens e das “representações de luxuosos embrulhos de prendas, com laços e fitinhas, estrategicamente colocados junto a bairros sociais de carências absolutas”, “o que fazem os cristãos?”, interroga o prelado, questionando: “Embarcam no mesmo ridículo ou investem em símbolos com criatividade?”.

No entender de D. Manuel Linda, a “indigência cultural” está a ameaçar “os fundamentos sólidos” da cultura ocidental “para os substituir pelo delírio”, fenómeno que o prelado qualifica de “doença grave”.

Domingos Terra, professor da Faculdade de Teologia, lembra por seu lado que “a fé cristã ganha consistência colectiva através de acontecimentos que lhe dão visibilidade e a fazem comunicar vid”, como é o caso daqueles que “dão corpo ao Natal cristão”.

“O reforço identitário colectivo, que de tudo isto resulta, não pretende fomentar espírito de gueto. Está aberto às interpelações que lhe chegam do exterior, designadamente às grandes necessidades humanas”, sublinha. 

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Agência ECCLESIA

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