Não está aqui

Paulo Rocha, Agência Ecclesia

As referências à paixão e morte de Cristo, nos Evangelhos, são mais extensas, muito mais, do que as notas, breves, sobre a ressurreição. D. António Couto, no livro “A Nossa Páscoa”, afirma que, para os quatro evangelistas, a paixão é “um relato” e a ressurreição “uma notícia”. E ao contrário de outros acontecimentos onde o resultado final é o que basta para memória futura, no caso do itinerário de Jesus as maiores atenções fixam-se nas descrições do processo que leva à notícia, não na notícia. No Jesus da História, o drama da morte de Deus encerra com frequência crónicas e opiniões sobre dor, sofrimento, solidão, não atingindo a notícia essencial de todo o processo, a passagem, a nova vida, a Páscoa.

A notícia completamente nova, há dois mil anos como hoje, está no facto de Jesus aparecer diante daqueles que com Ele viveram e, não sendo reconhecido, ter de se anunciar. Porque de facto era uma novidade o que estava a acontecer. A reação imediata, nomeadamente de quem O procurou no túmulo e recebeu a novidade “ressuscitou, não está aqui”, corresponde a um recomeço, a algo novo a acontecer na pessoa a quem o ressuscitado se anunciou. Ouvir “não está aqui” não significou fim da história, mas a passagem para uma nova história, sem fim, com nova vida. E aí está a força de uma notícia, da notícia!

As considerações teológicas ao que aconteceu a partir de quem as investiga são o recurso para fixar o valor da notícia da ressurreição. Como todas as notícias, a brevidade com que é transmitida dá-lhes maior impacto, a novidade grande alcance e o realismo rapidamente se converte em poder transformador. Tudo assim aconteceu em torno desta notícia: “ressuscitou, não está aqui!”.

Hoje, o desafio é repetir esta “manchete”. Mais do que acentuar o relato dos acontecimentos anteriores à Páscoa, é urgente dar relevo à notícia principal. E o perigo é mesmo esse: após a Páscoa, tudo parece ter acabado!

A ressurreição exige prolongar o soar das campainhas pascais não só pelo dia, a oitava ou o Tempo Pascal, mas em todos os dias; e as festas ao Espírito Santo, tradições que decorrem da alegria e solidariedade pascais, podem alcançar o relevo de outros tempos e contagiar um número crescente de recetores da notícia pascal. Caso contrário, quando qualquer cidadão procurar referências ao realismo da ressurreição nos ambientes onde foi comunicado ao longo das gerações pode encontrar apenas portas fechadas, nos templos ou nos corações. Nessas situações não é possível testemunhar que “ressuscitou”. Apenas se consegue dizer “não está aqui”.

Paulo Rocha

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