Não é tolerante quem quer, apenas quem pode!

Os media, domingo passado, com réplica escrita ontem, deram merecido destaque a um acontecimento internacional de relevo, não apenas pelos seus notados protagonistas – mais de quatro dezenas de chefes de estado e de governo – mas também, e por certo sobretudo, pelas aspirações que aqueles responsáveis políticos souberam trazer ao convívio da comunidade global. A iniciativa teve lugar na estelar Paris de Sarkho e houve nome: «União para o Mediterrâneo». O primeiro-ministro de Portugal, além de repetir numa única conferência de imprensa por 27 vezes (contas da RR) a palavra “paz”, com que quis caracterizar a agenda do encontro de alto nível, sempre disse que aquele seria um espaço privilegiado de diálogo entre o Islão e o Ocidente. Se quanto à força de tão veemente apelo à paz cumpre saudar, sem hesitação, o empenhamento, já as balizas preconizadas para o diálogo sinalizado obrigam, quando menos, a alguma reflexão. Moderno, como é, o primeiro-ministro de Portugal falou do Islão e do Ocidente, contrapondo duas mundividências, mas sem as equacionar naquilo que lhes assegura um mesmo estatuto. A uma mundividência de matriz religiosa, que se revela politicamente organizada, contrapôs uma mundividência política, que se reclama, mais do que autónoma, totalmente imune ao religioso. Tal diálogo não se mostra, desde a base, paritário. Cabe às mulheres e aos homens de tão diferentes realidades sociais, políticas, culturais e religiosas, sejam ou não judeus, cristãos e muçulmanos, agarrar a oportunidade que lhes é oferecida para conduzirem esse diálogo a caminhos de genuína fraternidade. Como lhes cabe ainda não deixarem os respectivos governantes esquecer, por uma vez, um tão público e notório comprometimento com os desígnios da paz; nem permitirem que se esgotem os caminhos do diálogo na execução de projectos com dividendos económicos certos. Bem vistas as coisas, são estes últimos, para já, os que levam vantagem da cimeira de Paris. E é pena! Aprendi, há muito, que não é tolerante quem quer, mas apenas quem pode. Explico: só tolera quem conhece, e as religiões do livro sabem, mesmo quando o não praticam, que conhecer é amar. E é bem difícil um conhecimento assim, que nos desnuda a carne e alma face ao coração do outro! João Soalheiro

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