Música: «A relação com a arte é semelhante à relação com Deus – pede demora, atenção, abre a perguntas» – padre Duarte Rosado

Jesuíta, autor dos trabalhos musicais «O grito de Isaías» e «Isaías e a Fragilidade», afirma que as surpresas na vida são «princípios de ressurreição» e que necessidades de «controlo» estreitam horizontes e geram «frustrações»

Foto: Agência ECCLESIA/MC

Lisboa, 19 fev 2025 (Ecclesia) – O padre Duarte Rosado diz que a relação que cada pessoa pode estabelecer com a arte é semelhante à relação com Deus, que pede “demora, atenção, abre a perguntas” sem apressar respostas.

“A relação que temos com a arte é análoga à relação com Deus. A arte vai nos ensinando a demora, estar com os olhos muito atentos. É uma relação que abre perguntas e não dá respostas imediatamente. Exige espaço, é algo aberto nada fechado”, dá conta à Agência ECCLESIA.

O padre jesuíta, autor dos trabalhos musicais «O grito de Isaías» e «Isaías e a fragilidade», valoriza o “espaço” que a Companhia de Jesus dá para que a vocação sacerdotal se possa expressar também através da arte.

“Não sou o único a fazê-lo: o João Sarmento é escultor, o Paulo Duarte mais na área da dança, o Nuno Branco com os diários gráficos e com o desenho. Existe de facto muita abertura e espaço para que possamos desenvolver algum lado artístico, o que eu acho importantíssimo”, valoriza.

“A arte toca mais diretamente as entranhas, não há filtro. A música, as cores, toca tudo o que é sensível. Talvez esteja relacionado com a beleza, mas a arte entra mais fundo, e a sensibilidade, o afeto são importantes”, acrescenta.

Convidado para o podcast «Alarga a tua tenda», o padre Duarte Rosado que integra a Pastoral Juvenil e Pastoral Vocacional dos Jesuítas, ensaiando propostas, formas de presença e acompanhamento na companhia, explica a importância de dar espaço na vida para as surpresas de Deus.

O então jovem Duarte Rosado estudou Psicologia durante três anos mas explica que o que hoje sabe sobre a área se deve ao “viver em comunidade”, ao confronto consigo e à escuta dos outros, reconhecendo que a área de estudo lhe foi mais indicada do que escolhida.

“Cresci numa escola onde a pedagogia dava mais respostas do que colocava perguntas. Sinto que não me ensinaram propriamente a pensar ou a fazer perguntas e por isso quando me dizem «tu deves ir para Psicologia», eu acedi. Era demasiado despreocupado em relação ao futuro, em relação à vida – a vida era fixe, tinha os meus amigos, não estudava muito, não era uma pessoa cheia de iniciativa”, recorda.

O dia 28 de agosto de 2006 marca o percurso do padre Duarte Rosado, quando no final de um campo de férias do Cantil e numa partilha de vida com um jovem no noviciado da Companhia de Jesus, sente uma “alegria gigante” e ousa fazer uma pergunta: «Deus, o que queres de mim?»

“Numa altura da minha vida em que começava a ter planos, Deus vem baralhar tudo”, resume.

A entrada no noviciado acontece em novembro desse ano e o caminho “duro, de amadurecimento” mas sem dúvidas sobre o percurso a seguir.

“Acho que muitos querem abolir a surpresa da vida para evitar coisas desagradáveis. Quer-se controlar tudo, planear, conhecer o futuro, mas o horizonte é extremamente amplo. Costumo dizer aos jovens da Missão País e dos campos de férias que temos 180 graus no horizonte e o que fazemos é encurtar este horizonte a uma frestazinha de nada para controlar, e se o plano não acontece como eu queria, sou frustrado, vivo triste, sem me abrir”, lamenta.

O padre Duarte, que foi ordenado em 2017, pede abertura, “confiança séria” e indica um “princípio de ressurreição” que importa cultivar.

“O Senhor tira vida das coisas, das coisas todas, tira vida de tudo, pode tirar vida. Agora eu preciso de abrir brechas e espaço para isto e parece-me que não estamos dispostos a que Deus nos venha a estragar os planos, em que a vida nos venha a estragar os planos, em que os outros nos venham a estragar os planos”, indica.

A música e a composição, a par do canto que não consegue dissociar da sua forma de compor, fazem parte do seu percurso, e se antes de ser ordenado padre, ainda pensou neste caminho como um possível percurso profissional, hoje gostaria que as suas composições, que quer mais distanciadas dos textos bíblicos, possam, de igual forma, falar à vida das pessoas, sejam elas crentes ou não.

A conversa com o padre Duarte Rosado pode ser acompanhada esta noite no programa ECCLESIA, emitido na Antena 1, pouco depois da meia-noite, disponível no podcast «Alarga a tua tenda».

LS

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