Padre José Vilaça aborda projetos em curso na Arquidiocese de Braga para ajudar no luto
Terras de Bouro, Braga, 01 nov 2014 (Ecclesia) – O padre José Vilaça, capelão hospitalar na Arquidiocese de Braga, alertou para “deslugarização” da morte e do luto na sociedade atual e destaca o serviço social e religioso do “sobrelotado” Centro de Escuta e Acompanhamento Espiritual arquidiocesano.
“Neste centro chegam situações muito diversas mas tenho de assentir que grande parte tem a ver com lutos não elaborados, com necessidades de reconciliação com pessoas que partem, no luto em pessoas que ficam ou um divórcio que dá origem a um luto”, explica à Agência ECCLESIA o capelão da Unidade Hospitalar de Famalicão e do Centro Hospitalar do Médio Ave.
O Centro de Escuta e Acompanhamento Espiritual, criado há quatro anos pelo Departamento Arquidiocesano da Pastoral da Saúde de Braga, tem profissionais especializadas em psicologia e psiquiatria, para além do acompanhamento religioso do padre José Vilaça.
“Como é óbvio temos sobrelotação, há lista de espera, precisamos de muitos mais recursos”, acrescenta o sacerdote.
O padre José Vilaça revela que existe “exploração” do relacionamento com aqueles que partem, “há todo um mundo espiritual que aproveita esta desconexão para abusar”.
Nesse sentido, alerta para o “défice” de escuta, oração e de acompanhamento espiritual por parte dos “pastores da Igreja no campo do luto, que é compensado por espiritualidades desviantes”.
Da realidade hospitalar enquanto capelão da Unidade Hospitalar de Famalicão e do Centro Hospitalar do Médio Ave, considera que existe “uma dificuldade natural em lidar com a morte”.
“A sociedade hoje valoriza modelos e paradigmas absolutamente contrários ao acompanhar alguém que morre” porque para além da morte ser “tabu” as pessoas não estão habituadas à sua “própria fragilidade”, que é visível “junto daqueles que estão para morrer”.
“Ao mesmo tempo vemos a morte pornograficamente em filmes e jogos para as crianças mas estamos cada vez menos capacitados para acompanhar aqueles que morrem e que precisam muitas vezes de muito pouco, sobretudo de reconciliar a vida”, alerta o padre José Vilaça.
Para o sacerdote a morte foi “deslugarizada” para os hospitais, pelo que se exige que “o paradigma cultural – sociológico e espiritual – tenha de ser alterado” e que a estrutura hospitalar permita “esta convivência entre os que permanecem à espera da morte e aqueles que partem”.
Além disto, as pessoas têm de sentir “a necessidade de transmitir a ternura a estes irmãos”.
“Deslugarizamos a morte mas não tiramos o problema da nossa vida”, observa o padre José Vilaça.
Neste contexto de transferência de lugares, o entrevistado destaca também a diferença entre a realidade da morte e do luto nas cidades e em ambientes rurais onde as pessoas “criam ritos”.
“É muito curioso ver nas aldeias o velar do morto. As pessoas são capazes de conversar sobre um assunto do dia-a-dia porque a morte está naturalmente nas suas vidas. É um facto absolutamente normal”, contextualiza.
Por isso, o padre José Vilaça comenta que “falta fazer a adaptação cultural” e considera que a escola é um lugar onde esse “processo” também deve ser realizado com psicólogos para acompanhamento em luto.
“A morte tem de entrar na escola não como o bicho papão mas como processo que exige, por exemplo, um despoletar de novas estruturas de apoio na escola”, sugere o sacerdote da Arquidiocese de Braga.
A entrevista pode ser ouvida este domingo, durante o programa ECCLESIA na Antena 1 da rádio pública (06h00) dedicado à comemoração de todos os fiéis defuntos.
PR/CB