O presidente da Conferência Episcopal de Moçambique (CEM), D. Lúcio Andrice, Bispo de Xai-Xai, manifestou preocupações após as eleições gerais do país, a 28 de Outubro passado, afirmando que há ainda um “caminho a percorrer” para a consolidação da democracia, que classifica como “muito sinuoso”.
De passagem por Portugal, o prelado disse à ECCLESIA que “o partido no poder tem muita força e usa de vários mecanismos para enfraquecer e eliminar os outros partidos”
“Temos por um lado o partido do poder (FRELIMO, ndr), que pretende ter o direito de governar porque lutou pela independência do país, e do outro lado a oposição (RENAMO, ndr), que também pretende dirigir os destinos pelo país, porque lutou pela democracia”, prosseguiu.
Em relação ao último acto eleitoral, recorda que “em todas as mesas do país, na altura das eleições, era possível encontrar um membro da FRELIMO, enquanto os outros partidos não têm meios nem funcionários que os possam acudir em todos os Distritos do Interior”, assinala, frisando que havia espaço para a “fraude”, embora sem ter “dados” para provar que a mesma tenha existido
Este responsável assinala que “o grande problema foi a exclusão de alguns partidos”, mas saúda a ausência de “situações críticas” durante as eleições, admitindo que a missão da comunidade internacional é “delicada”.
“A comunidade internacional está interessada numa verdadeira democracia no país e tem dado sinais disso. Nós, como Igreja, agradecemos estes sinais”, diz o presidente da CEM.
A Conferência Episcopal, refere D. Lúcio, tem chamado a atenção para a “partidarização” das instituições públicas do país. “Há situações em que um professor tem medo de passar para outro partido porque depois pode deixar de ser director da escola”, aponta.
Outro fenómeno assinalado pelo Bispo são as deslocações no interior de Moçambique, das famílias que nos períodos de seca vão à procura de água, “verdadeiros dramas” que são seguidos pela Igreja.
“Acredito que se tivesse pessoal missionário e fosse possível fundar paróquias, abrir furos de água, uma infra-estrutura sanitária, uma escola, as populações iriam crescer e seria possível ter mais estabilidade, com assistência, pelo menos, por parte da Igreja”, indica.
D. Lúcio Andrice destaca que os objectivos que guiam a Igreja não estão directamente ligados com a política nem são “politizáveis”.
A falta de sacerdotes impede que a Igreja contribua mais fortemente na formação das lideranças civis e contribuir para uma sociedade “verdadeiramente democrática”.
Seminários
A Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), que convidou o prelado para esta visita ao nosso país, publicou recentemente um relatório onde aborda as dificuldades sentidas pelas comunidades católicas moçambicanas devido à falta de padres.
Em Xai-Xai (76 mil quilómetros quadrados), há cerca de 30 padres, 15 diocesanos, pelo que “o grande investimento” tem de passar pela “formação sacerdotal”.
Os seminários estão “cheios”, por norma, mas o que mais preocupa o presidente da CEM é a falta de “condições financeiras” para pagar a formação dos seminaristas. Nesse contexto, destaca o apoio da AIS para “acudir às necessidades reais” das instituições, onde também começam a faltar formadores.
Quanto aos que, no processo de formação, abandonam o seminário, D. Lúcio indica que os Bispos procuram que permaneçam no país, “para intervirem mais eficazmente no processo de crescimento da Igreja”.
Este ano, a AIS dedica a sua campanha de Natal à Igreja de Moçambique, na sequência de uma recente visita feita a este país, com cerca de 21 milhões de habitantes e uma área oito vezes maior que Portugal. Cerca de 23,8% da população moçambicana é católica, existindo apenas 203 padres diocesanos, 95% dos quais se dedicam ao ensino.
Os fundos recolhidos na campanha reverterão para o Seminário Diocesano de S. Carlos Luanga, em Jecua, onde trabalham os Missionários de Guadalupe de origem mexicana, para poder oferecer alguma dignidade aos jovens que se preparam para o sacerdócio; e para o Seminário Propedêutico Santo Agostinho de Quelimane, com 90 seminaristas, cujas instalações são claramente insuficientes.