Mobilidade humana e evangelização: os desafios de um novo milénio

Conferência de D. Antonio Maria Vegliò

XI ENCONTRO DE FORMAÇÃO PARA AGENTES SÓCIO-PASTORAIS DAS MIGRAÇÕES
“Mobilidade humana e evangelização: os desafios de um novo milénio”
Fátima (Portugal), 16 de janeiro de 2011.

S.E. DOM ANTONIO MARIAVEGLIÒ
Presidente do Conselho Pontifício para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes

Suas Excelências,
reverendos sacerdotes, religiosos e religiosas,
queridos irmãos e irmãs,

O tema que me foi confiado para este encontro é “Mobilidade humana e evangelização: os desafios de um novo milénio”. Este sugere uma forma de avaliar e programar, dado que fala do anúncio cristão aos imigrantes do terceiro milénio. Quero agradecer ao Director da Obra Católica Portuguesa de Migração, Pe. Francisco Sales Diniz, pelo seu gentil convite. Cordialmente dou as boas-vindas a todos os participantes deste XI Encontro de Formação de Agentes Sócio-Pastorais.

 

1. Um Continente em contínua ebulição

O cristianismo está presente há dois mil anos na Europa. No entanto, este Continente está marcado por um profundo movimento de descristianização. Perante esta situação paradoxal, João Paulo II escreveu na Exortação Apostólica Ecclesia in Europa, de 29 de junho de 2003, que “a Igreja apresenta-se no início do terceiro milénio com o mesmo anúncio de sempre, que constitui o seu único tesouro: Jesus Cristo é o Senhor; só há salvação n’Ele, e em mais ninguém (cf. Act 4, 12). A fonte da esperança, para a Europa e para o mundo inteiro, é Cristo; e a Igreja é o canal pelo qual passa e se difunde a onda de graça que brotou do Coração trespassado do Redentor”.

A Europa é um Continente em que coexistem nações, povos e culturas diferentes. Há zonas geográficas com sua identidade, língua e tradição. Nenhum país europeu, no entanto, se pode considerar, hoje, livre das problemáticas do macrofenómeno das migrações contemporâneas. Segundo estimativas oficiais, os não-nacionais presentes na União Europeia, em 2007, eram 28 milhões, ou seja, 5,5% da população total; 32% destes, vindos de países europeus não pertencentes à União, 22% da África, 16% da Ásia e 15% das Américas. Naturalmente, estes números são mais elevados se tivermos em conta os que, neste entretanto, adquiriram a cidadania. Em termos absolutos, a Alemanha, França, Espanha, Reino Unido e Itália registam actualmente o maior número de cidadãos estrangeiros.

Tendo em consideração estes dados, surgem em toda a parte sinais preocupantes de esmorecimento e confusão, mesmo sob o impulso do fenómeno migratório. O primeiro destes é a busca excessiva de autonomia do homem em relação a Deus. A pessoa humana, na verdade, cada vez mais tenta concentrar a sua actividade científica, técnica, cultural e política nas suas próprias mãos. Assim, a partir do século XVIII, Deus foi posto à margem do mundo, mas sem interferir nas actividades do homem. Desta forma, também o universo é deixado ao homem como o único dominador, que o manipula a seu belo prazer, com o risco de provocar danos irreparáveis em todo o ecossistema, mas também no complexo mundo das relações interpessoais e, até mesmo, na busca de valores e sentido da existência.

Um segundo elemento a ser considerado refere-se às mudanças éticas que estão ocorrendo na sociedade contemporânea, com particular destaque para a desintegração da família, para a pouca valorização do casamento, para o apelo ao aborto, para o uso e consumo da sexualidade como utilidade comercial sem amor, para a falta de protecção da vida nascente, para a depreciação do idoso e, em geral, das pessoas com deficiência.

Enfim, a União Europeia actualmente está-se deparando com uma forte crise económica. Muitos postos de trabalho foram perdidos e especialmente os migrantes estão enfrentando condições de grave insegurança. De facto, no contexto dos movimentos migratórios, é óbvio para todos que não se reserva a devida atenção à defesa da dignidade da pessoa humana, criada “à imagem e semelhança” de Deus. Aliás, precisamente neste contexto, devemos denunciar, com tristeza, que em muitas regiões da Europa ocorrerram, nos últimos anos, desprezíveis ataques contra os imigrantes, que muitas vezes foram vítimas de intolerância, discriminação e xenofobia, com episódios de racismo, ainda que isolados (1).

 

2. A Chaga da Irregularidade

O confronto com a realidade da imigração irregular tornou-se inevitável. A este respeito é difícil ter números precisos, mas de acordo com avaliações recentes os imigrantes em situação irregular seriam entre 4,5 e 8 milhões, com um aumento calculado entre 350.000 e 500.000 por ano. As áreas de fronteira, onde são interceptados ou tentam entrar em maior número, são aquelas entre a Eslováquia e a Ucrânia, entre a Eslovénia e a Croácia, entre a Grécia e a Albânia e entre a Grécia e a Turquia. Além disso, é claro, são consideradas zonas extremamente “quentes” Ceuta e Melilla, as Ilhas Canárias e a Sicília. Entre os migrantes irregulares vindos do Sul há sobretudo marroquinos (cerca de 70%), seguidos pelos subsaarianos, eritreus e egípcios.

A Política Migratória Europeia atualmente encontra-se numa fase crítica, pois, à necessidade de coordenação e harmonização, contrapõe-se a dificuldade de cada um dos Estados em ceder a algumas prerrogativas nesta área. Ao mesmo tempo, continua ainda o fecho das fronteiras, resultando na impossibilidade para os imigrantes de entrar regularmente, para além das quotas admitidas.

Finalmente, não podemos permanecer silenciosos diante das chagas do tráfico e do comércio de seres humanos, envolvendo especialmente as jovens – recrutadas por organizações criminosas e forçadas à prostituição – e as crianças, com o desprezível desenvolvimento do tráfico de órgãos.

 

3. A Voz do Magistério da Igreja

A Instrução Erga Migrantes Caritas Christi, publicada em 2004 pelo nosso Conselho Pontifício (2), adiciona a essa sumária descrição: “a emigração dos núcleos familiares e a feminina, tornando-se, esta última, cada vez mais consistente. Contratadas frequentemente como trabalhadoras não qualificadas (trabalhadoras domésticas), e empregadas no trabalho submerso, as mulheres são privadas, amiúde, dos mais elementares direitos humanos e sindicais, quando não caem vítimas do triste fenómeno conhecido como “tráfico humano” que já não poupa nem mesmo as crianças” (n. 5). Além disso, o Documento estigmatiza esta realidade como “um novo capítulo da escravidão” (Ibidem). Como visão positiva, então, incentiva “a busca de uma nova ordem económica internacional para uma mais justa distribuição dos bens da terra, que contribuiria não pouco, de resto, para reduzir e moderar os fluxos de uma numerosa parte da população em dificuldade. Daí a necessidade também de um empenho mais incisivo para criar sistemas educativos e pastorais, com vista de uma formação à “mundialidade”, isto é, a uma nova visão, da comunidade mundial, considerada como família de povos, à qual finalmente são destinados os bens da terra, numa perspectiva do bem comum universal” (n. 8).

O Papa Bento XVI, na Mensagem para a Celebração do Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, que coincide justamente com a data de hoje (doravante DMMR 2011), convida a considerar que a humanidade é “uma só família de irmãos e irmãs em sociedades que se tornam cada vez mais multi-étnicas e intra-culturais”, graças também às migrações, que geralmente constituem uma experiência difícil, embora nas variegadas tipologias, que o fenómeno assume. De facto, existem as migrações “internas ou internacionais, permanentes ou periódicas, económicas ou políticas, voluntárias ou forçadas”, escreve o Papa. Trata-se de movimentos que levam, em todos os casos, a uma mistura de etnias, culturas e religiões que torna o diálogo uma ferramenta necessária para “uma serena e frutuosa convivência no respeito das legítimas diferenças”. Com efeito, na Oração do Angelus, de 17 de agosto de 2008, ele advertira sobre episódios deploráveis de intolerância, que não deixam de ocorrer mesmo no nosso tempo, e tinha dito que “uma das grandes conquistas da humanidade é precisamente a superação do racismo. Infelizmente, porém, registram-se em vários países novas manifestações preocupantes. Oremos, para que em todos os lugares cresça o respeito por cada pessoa, juntamente com a consciência responsável de que somente no acolhimrnto mútuo de todos é possível construir um mundo caracterizado por uma verdadeira justiça e verdadeira paz” (3).

 

4. Uma Sociedade no Plural

As características que formam o vulto da Europa, hoje, são aquelas da multietnicidade e do multiculturalismo, que trazem consigo diferentes formas de pertença religiosa. Para tudo isso contribui directamente também a mobilidade humana, fenómeno maciço e estrutural que envolve não só os trabalhadores migrantes, mas também milhões de pessoas que fogem em busca de refúgio e protecção internacional, bem como aqueles que viajam por turismo ou por lazer, em qualquer parte do globo. Estamos diante de um novo quadro que os países europeus devem ter em consideração, para garantir a segurança e o bem-estar a quem vive no território há muito tempo, mas também dignidade, trabalho, casa e protecção dos direitos daqueles que chegam como migrantes.

“Pedimos força-trabalho, chegaram pessoas. Mas não devoram o nosso bem-estar, aliás, são indispensáveis para mantê-lo”, assim se expressava, em 1965, o escritor Max Frisch, referindo-se aos imigrantes italianos na Suíça (4). Muitos anos depois, podemos repetir as mesmas considerações em relação aos novos fluxos migratórios na Europa.

Hoje, aqueles que chegam aos Estados-Membros são, principalmente, cristãos e, entre eles, muitos são ortodoxos. Aqueles que pertencem ao judaísmo são cerca de três milhões, mas têm raízes históricas na Europa. A União Budista Europeia pensa que tem hoje na Europa de um a três milhões de adeptos. Os muçulmanos, pelo contrário, são cerca de 32 milhões. O diálogo não é nada fácil, sobretudo com o mundo islâmico, também porque palavras como justiça, verdade, dignidade e direitos humanos, laicidade, democracia e reciprocidade têm conteúdo diferente ao que lhe atribui a cultura europeia.

O encontro das diversidades não é uma novidade do nosso tempo, mas o facto novo é que hoje o fenómeno afecta a totalidade do planeta. Os historiadores observaram que, no dia em que uma civilização se abrir a outras culturas, esta mesma beneficia em termos de crescimento e fortalecimento. Pelo contrário, fraqueza e declínio começam precisamente quando essa não aceita o diálogo, o confronto e o intercâmbio mútuo no dinamismo do dar e receber recíprocos. É importante, no entanto, que as diferenças legítimas sejam mantidas e percebidas como positivas e enriquecedoras. A diversidade cultural como fonte de vitalidade, inovação e criatividade, é necessária para a humanidade como também a biodiversidade para a natureza. O pluralismo, com efeito, é uma das categorias que dão vitalidade ao desenvolvimento humano, entendido não apenas em termos de crescimento económico, mas também como meio para uma existência mais satisfatória do ponto de vista intelectual, emocional, moral e espiritual. Portanto, todos são responsáveis em preservar o património da humanidade espalhado nas diferentes culturas. Deve ser reconhecido e protegido para o bem das gerações presentes e futuras.

Bento XVI, na Mensagem para este dia do Migrante e Refugiado, considerando as mudanças ocorridas na sociedade, convida a humanidade a se ver como “uma só família, multi-étnica e intra-cultural, [embora] isto produza inevitáveis consequências para o indivíduo, a sociedade, os Estados e as Igrejas locais”.

 

5. Os Desafios da Evangelização

A pastoral da mobilidade humana, superada a emergência da ajuda humanitária que sempre está implicada nos movimentos migratórios e que responde à urgência da caridade, hoje enfrenta o desafio da renovada proclamação da Boa Nova aos migrantes. O esforço dos Agentes de pastoral, nesse contexto, tende a descobrir e explorar tudo o que há de belo, verdadeiro e bom nas diferentes culturas, em consonância com o apelo que já São Paulo dirigia à comunidade cristã de Filipos, com estas palavras: “ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, nobre, justo, puro, amável, honroso, ou que de algum modo mereça louvor (4,8). Promover a nova evangelização, na verdade, significa buscar o que permite a abertura ao Evangelho e seu acolhimento, preocupando-se em fazer crescer as “as sementes do Verbo” (Ad Gentes, n. 15). É por isso que – diz a Instrução Erga Migrantes Caritas Christi – “os Consagrados e as Consagradas, as Comunidades, os Movimentos eclesiais e as Associações de Leigos, e também os Agentes de pastoral, devem sentir-se empenhados em educar sobretudo os cristãos ao acolhimento, à solidariedade e à abertura aos estrangeiros, a fim de que as migrações se tornem uma realidade sempre mais “significativa” para a Igreja, e os fiéis possam descobrir os Semina Verbi [as sementes do Verbo] presentes nas diversas culturas e religiões” (n. 96).

A tarefa dos agentes de pastoral da mobilidade humana, portanto, é o de semear a Palavra de Deus, concentrando-se especialmente nos caminhos do acolhimento e nos meios mais adequados para a integração. Sobre estes temas, Bento XVI insistiu, saudando os participantes da Sessão plenária de nosso Conselho Pontifício, no último dia 28 de maio. Nessa ocasião, o Papa enfatizou que, para promover a coexistência dos povos, são necessárias “directrizes sábias e complexas para o acolhimento e integração, permitindo oportunidades de entrada na legalidade, favorecendo o justo direito do reagrupamento familiar, do asilo e do refúgio, compensando as necessárias medidas restritivas e contrabalanceando o lamentável tráfico de pessoas”.

A coexistência pacífica e a partilha de valores comuns são mais importantes do que as divisões e bairrismos. Os locais de intercâmbio social e participação, os espaços comuns de solidariedade, os âmbitos da escola e do trabalho são formas nas quais o diálogo pode realmente encontrar terreno fértil. Em particular, no diálogo inter-religioso, assume uma grande importância a reciprocidade (5). De facto, a relação fundamenta-se no respeito mútuo e na justiça, base da “atitude do coração e do espírito, que nos torna capazes de vivermos juntos, e em toda parte, com igualdade de direitos e de deveres” (EMCC, n. 64) (6).

A cooperação entre as Igrejas de origem e as de destino dos fluxos migratórios é fundamental para uma pastoral específica. A Instrução EMCC (n. 28 e 70-77) considera as Igrejas locais de partida e de chegada como pilares fundamentais na pastoral migratória. Por um lado, de facto, a comunidade cristã que acolhe os migrantes pode fornecer respostas adequadas às suas necessidades materiais e espirituais, como família autêntica que reconhece ter “um só Deus e Pai de todos” (Ef 4,6), que “nos chama para sermos filhos amados no seu Filho predilecto” e “para nos reconhecermos a todos como irmãos em Cristo” (DMMR 2011).

Por outro lado, é muito importante que as Igrejas de partida dos migrantes percebam a vocação missionária para não negligenciar aqueles que deixam a comunidade de origem para ir para outros lugares. Os contactos serão mantidos vivos por meio de visitas regulares dos Ordinários diocesanos e, onde for possível, com o envio de sacerdotes e agentes de pastoral que acompanhem os migrantes nas várias fases da emigração. O missionário dos migrantes, na verdade, é uma ajuda insubstituível para que os seus conterrâneos possam continuar a viver e crescer na fé cristã, mesmo enfrentando as tantas vicissitudes que inevitavelmente encontrarem, longe da família e dos costumes da terra natal.

Um último pensamento, que de alguma maneira entra na actividade missionária, refere-se à defesa dos direitos dos trabalhadores migrantes, aonde são violados. A denúncia naturalmente é um instrumento importante do anúncio evangélico, mas é óbvio que deve ser mediado pelo Magistério da Igreja, em consonância com as orientações pastorais do Ordinário local, e levado a termo na reflexão e oração. A denúncia deve lembrar, advertir e estimular novas idéias políticas, económicas e sociais, com o devido respeito à dignidade e aos direitos humanos, à política familiar, à habitação, ao trabalho, à saúde e aos serviços à pessoa do migrante. Toda a denúncia, para não ser superficial e emotiva, deve ser acompanhada pelo estudo, pela observação pontual e pelo debate fraterno.

 

6. Caminhos de Integração

É ainda importante que os imigrantes se integram no país de acolhimento “respeitando as suas leis e a identidade nacional”, afirma Bento XVI na Mensagem para este Dia (DMMR 2011). É verdade que “não é fácil encontrar os sistemas e ordenamentos que garantam, de forma equilibrada e justa, os direitos e os deveres tanto de quem acolhe como daquele que é acolhido” (GMP 2001, n. 12), mas é possível “identificar alguns princípios éticos fundamentais que sirvam de referência. Em primeiro lugar, há […] o princípio segundo o qual os imigrados hão-de ser sempre tratados com o respeito devido à dignidade de cada pessoa humana” (ibid., n. 13). Com certeza, é direito dos Estados “regular os fluxos migratórios e de defender as próprias fronteiras” (DMMR 2011), para garantir a segurança da nação, mas este direito deve sempre ter em conta o princípio acima mencionado. “Procurar-se-á então conjugar o acolhimento devido a todo o ser humano, sobretudo no caso de pobres, com a avaliação das condições indispensáveis para uma vida decorosa e pacífica tanto dos habitantes originários como dos adventícios (GMP 2001, n. 13)” (DMMR 2011).

Precisamente neste vasto campo de acção, insere-se também o importante papel do Agente de pastoral da mobilidade humana, fazendo apelo a toda a sua sabedoria e clarividência. O objectivo a ser alcançado será o da “síntese cultural”, que implica, por um lado, um processo dinâmico – ou seja, a reciprocidade do intercâmbio – e, por outro, uma integração que pressupõe a participação na criação e na alteração das relações sociais. Entendida assim, a “síntese cultural” envolve o processamento de modelos originais, surgidos das culturas presentes, sem, para isto, deixar-se reduzir em alguma delas; modelos que se inserem na cultura de base que, neste sentido, se fortalece.

De resto, a Igreja, consciente das tragédias passadas, que assolaram também o continente europeu, sabe que a integração plena de cada minoria é essencial para manter a concórdia civil e a democracia. Fundada na fé cristã, ela quer contribuir para a construção de uma Europa com um rosto mais humano, onde sejam protegidos os direitos humanos e os valores basilares da paz, da justiça, da liberdade, da tolerância, da participação e da solidariedade.

 

Conclusão

Os migrantes esperam da Igreja universal e em especial da Igreja local portuguesa, uma orientação e uma resposta às grandes questões sobre a fé cristã, conforto e ajuda humana capazes de devolver sentido e esperança às suas existências. A caminhada missionária que queremos percorrer no terceiro milénio deverá basear-se na evangelização e no testemunho da caridade. Não nos esqueçamos de que a caridade cristã tem uma grande força evangelizadora à medida que se faz sinal do amor de Deus entre os homens. Esta consiste na disponibilidade ao próximo em nome de Jesus Cristo (cf. Mt 25,31-46).

A Igreja, portanto, é chamada a viver no amor, a revelar ao mundo o amor de Deus e a contagiar o mundo com as obras do amor. Os Agentes de pastoral da mobilidade humana, por sua vez, são testemunhas do amor de Deus no acolhimento dos migrantes, no ajudá-los quando estão doentes ou passam por momentos de solidão, marginalização, irregularidade e prisão, na defesa corajosa e profética dos seus direitos, no incentivar os que, tentando observar seus deveres, estão lutando para se inserir em um contexto social e cultural diferente daquele em que nasceram e cresceram.

“A falta de fraternidade entre os homens e entre os povos é causa profunda de subdesenvolvimento e […] incide em grande medida sobre o fenómeno migratório”, diz o Papa Bento XVI (DMMR 2011). O desenvolvimento autêntico, de facto, vem da “partilha de bens e recursos”, que “não é assegurada pelo simples progresso técnico e por meras relações de conveniência, mas pelo potencial de amor que vence o mal com o bem (cf. Rm 12,21) e abre à reciprocidade das consciências e das liberdades” (Caritas in veritate, n. 9).

Na Mensagem para o Dia de hoje, o Santo Padre reafirma, por outro lado, que o crescimento na caridade vivida e concreta, especialmente para com os pobres e fracos, encontra força na Eucaristia, “fonte inesgotável de comunhão para toda a humanidade” (DMMR 2011).

Maria, que veneramos nesse lugar sagrado, esteja-nos próximo e nos infunda confiança em nosso empenho pastoral. Ela, com o seu Sim, acolheu o Senhor da vida, ofereceu ao mundo aquele que dá sentido e plenitude à existência de todas as criaturas humanas e estava junto ao seu Filho Jesus também nos momentos do sofrimento, da paixão e da Cruz. Maria esteja junto aos migrantes que vivem na Europa e especialmente junto à Igreja local portuguesa, para que esteja cada vez mais ao serviço dos migrantes, para que a cada um deles seja garantida uma vida conforme a dignidade humana.

 

Obrigado!

Notas

1. JOÃO PAULO II dedicou a Mensagem para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado de 2003 precisamente a esses temas específicos, com o título “Por um empenho para vencer o racismo, a xenofobia e o nacionalismo exagerado”: People on the move 90 (2002) 5-7.

2. Instrução Erga Migrantes Caritas Christi: AAS XCVI (2004) 762-822

3. L’Osservatore Romano, n. 192 (44.932), 18-19 de agosto de 2008, p. 8.

4. M. FRISCH, “Vorwort”, in: A.J. SEILER, Siamo Italiani, Zürich 1965, p.7.

5. Cfr. S. FUMIO HAMAO, “Il dialogo ecumenico, interreligioso e interculturale nei più recenti Documenti del nostro Pontificio Consiglio”, People on the Move, 96 (2004) pp. 25-36; P. SHAN KUO-HSI, “Inter-religious Dialogue in the Migrants’ World”: People on the Move, 96 (2004) pp. 115¬¬-137; ID., “Inter-religious dialogue in the migrants’ world”: People on the Move, 98 (2005) pp. 59-63

6. Na Mensagem enviada por ocasião do dia de estudos organizado pelo Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso e pelo Conselho Pontifício para a Cultura, em 3 de Dezembro de 2008, Bento XVI afirmou que o tema do diálogo entre culturas e religiões é hoje “uma prioridade” para a Europa e explicou que “a Europa contemporânea, que se aproxima do Terceiro Milénio, é o resultado de dois milénios de civilização. Tem as suas raízes no enorme e antigo património de Atenas e Roma e, acima de tudo, no fecundo terreno do Cristianismo, que provou ser capaz de criar novos patrimónios culturais ao mesmo tempo em que retoma a contribuição original de cada civilização”. “O tema do diálogo intercultural e inter-religioso – acrescentou o Papa – emerge como uma prioridade para a União Europeia e interessa de forma transversal aos sectores da cultura e da comunicação, da educação e da ciência, das migrações e das minorias, até chegar aos âmbitos da juventude e do trabalho”.

 

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Agência ECCLESIA

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