»Se ficar calada, se tiver inércia, não está a cumprir o seu papel», alerta sociólogo
Fátima, 19 out 2022 (Ecclesia) – Pedro Góis, sociólogo e investigador na área das migrações, afirmou hoje que a Igreja tem a capacidade, pela sua presença junto das populações, de mostrar à sociedade que os migrantes são essenciais na sociedade.
“Temos de pedir à hierarquia da Igreja que fale mais, que seja mais Igreja. Se a Igreja não fizer este trabalho – se ficar calada, se tiver inércia – não está a cumprir o seu papel. Se o conseguir fazer, ficamos mais ricos”, explicou, no 34º Encontro da Pastoral Social, que decorreu em Fátima.
Falando sobre as consequências dos conflitos militares e da pandemia no fenómeno migratório, o professor na Faculdade de Economia na Universidade de Coimbra, destacou que “a guerra trouxe 53 mil ucranianos para Portugal, invisíveis socialmente”.
“Não ouvimos falar deles, não causaram problemas. Se os soubermos acolher, ficarão e trarão novas pessoas para a sociedade e isso acrescenta”, acrescentou.
Para o docente universitário, a pandemia veio mostrar o quão essencial foi o trabalho de pessoas imigrantes: “Os senhores das empresas de transportes, das cadeias de logística que transportam alimentos. Isso mostrou a sua importância essencial”, evidenciou.
Pedro Góis afirmou não ser possível a sociedade portuguesa viver sem os imigrantes, e afirmou que a transição demográfica está em curso.
“Se não recebermos muitos migrantes nas próximas décadas o país e a economia vão encolher de tal forma que se vai tornar insustentável viver aqui. É de vital importância começarmos a falar sobre isto. Não há turismo sem trabalhadores, não há agricultura sem mão-de-obra que já não existe no pais. A população já não chega. Nos últimos anos saiu muta gente que já não volta. Vamos ter de acolher milhares de pessoas”, evidenciou.
Felizmente temos um país atrativo para as pessoas, elas estão a vir espontaneamente. Não tenho a certeza de que no futuro continuamos a ter capacidade de atração, que vão ser atraídas por outras economias. Temos que saber não cometer os mesmo erros: não deixar que sejam os primeiros a perceber o emprego, não podemos deixá-los acreditar que não os apoiamos quando precisarem de nós, já que nos apoiaram quando precisámos. E este é um caminho que não vejo suficientemente comunicado”.
Pedro Gois pediu respostas mais céleres nas instituições de acolhimento, “o SEF demora muito tempo na regularização”, com salários baixos “o reagrupamento familiar é dificultado”, as Universidades “demoram muito tempo” a reconhecer diplomas, uma realidade que deve ser mudada.
O investigador explicou ainda que a educação para a “multiculturalidade” deve começar na escola.
“Temos de conviver com vizinhos novos que chegam de Timor e Nepal. E temos de os integrar de forma natural. Ainda não estamos a fazer isso”, lamentou.
Carlos João Diogo, por sua vez, desenvolveu o tema ‘Transição digital’ e evidenciou como a tecnologia está a aproximar as pessoas e a dar-lhe tempo para o que é “especificamente humano” poder ser feito.
“A tecnologia tem uma contribuição enorme para definir o que somos como pessoas, mas precisamos pensar para que é que a queremos e qual o seu propósito, porque tem a missão de unir e aproximar as pessoas. Nos lugares onde estamos devemos ajudar a fazer isso, destacando o que é especificamente humano. Há muitas coisas automatizadas, mas há características humanas que as máquinas não vão fazer: elas são boas a fazer mas não a ser”, referiu.
Para Carlos João Diogo, os cristãos devem assumir a transição em curso e adequá-la à missão que também as instituições sociais têm, no trabalho com os idosos e com as crianças.
“Os cristãos têm como missão fazer parte de tudo o que está a acontecer. A transformação do mundo não se dá nos templos fechados, mas no meio da realidade. Como cristãos, há que ajudar a definir um bom futuro para nós. E efetivamente a transição tecnológica aproxima. Basta pensar nos exemplos de como as famílias comunicavam com os meios tecnológicos durante a pandemia”, recordou.
O 34.º Encontro da Pastoral Social, com o tema ‘A pandemia, a guerra e os pobres’, foi uma organização conjunta do Secretariado Nacional da Pastoral Social e da Comissão Nacional da Pastoral da Saúde.
LS