Bispo de Setúbal presidiu à Eucaristia do Jubileu dos Migrantes na diocese, no Santuário de Cristo Rei, e pediu que quem chega ao país não seja utilizado como uma «bola de pingue-pongue» nos «debates político-partidários»

Almada, 28 set 2025 (Ecclesia) – O cardeal D. Américo Aguiar afirmou hoje, no Santuário de Cristo Rei, em Almada, que espera que a nova lei dos estrangeiros não seja alheia ao facto de Portugal estar historicamente ligado aos movimentos migratórios.
“Nós próprios temos uma marca profunda de procura no estrangeiro, ao longo dos séculos, de melhores condições de vida, de sonhos, de projetos, de realização de família. E, portanto, acho que esta legislação não deve esquecer essa carga histórica, essa herança histórica que significa Portugal no melhor que a gente possa definir”, referiu o bispo de Setúbal.
Setúbal celebrou hoje o Jubileu Diocesano dos Migrantes, no âmbito das celebrações dos 50 anos da diocese, com um programa que incluiu uma Eucaristia presidida por D. Américo Aguiar, no pavilhão do Santuário do Cristo Rei.
Em declarações aos jornalistas no final da Missa, o cardeal foi questionado sobre a nova versão da lei dos estrangeiros, apresentada na passada quarta-feira, expressando que deseja “sempre que qualquer processo legislativo, no fim, seja bom para as pessoas, seja bom para Portugal e para os portugueses”.
“O processo legislativo é muito elástico. E nós temos que fazer sempre um esforço para que, ao longo do tempo, vá melhorando naquilo que é a marca humanizante da legislação”, realçou.
Olhando para a diversidade de culturas presente no território diocesano, o bispo de Setúbal sublinhou que a “questão dos migrantes nunca foi um problema” em Setúbal, mas “uma oportunidade de aproximação”, de conhecimento, de amar e respeitar o outro.
“Não é propriamente qualquer coisa que nos deva atormentar. O que deve atormentar, sim, é a porventura à dificuldade pessoal, que eu possa ter ou não, de olhar para o outro e reconhecê-lo como irmão”, assinalou.
D. Américo Aguiar alertou para a exploração que os migrantes acabam por ser alvo, defendendo que são necessárias regras que signifiquem” maior respeito por aqueles que vêm” ao encontro de Portugal.
“Se fosse viável, se fosse possível, [receber] todos [os migrantes], sem qualquer tipo de constrangimento, era bonito e era simpático, mas isso não é verdade, não é possível”, indicou.
O cardeal considera que Portugal e restantes países da Europa e do mundo devem olhar para o movimento migrante como “uma oportunidade, com carinho, com amor, com reciprocidade e não como um problema”.
E muito menos, como acontece nos tempos que vivemos, como uma bola de pingue-pongue naquilo que são os debates político-partidários que não ajudam a encaixar nem a refletir livremente o assunto, porque depois fica refém ou da direita ou da esquerda ou de radicalismos. Isso não resolve o problema de ninguém”, vincou.
Com a aproximação das eleições autárquicas, marcadas para 12 de outubro, o bispo de Setúbal apela aos candidatos que tenham sempre em conta que migrantes são pessoas e não números, estatísticas, etnias ou raças.
“Estamos a falar de pessoas. E a partir daí tentarmos legislar com uma raiz judaico-cristã, cristã católica, humanizante, de maneira a tentarmos decidir aquilo que for o melhor para essas populações”, enfatizou.

A coordenadora do Secretariado da Pastoral das Migrações de Setúbal, Tânia Moreira, também participou na celebração e, aos jornalistas, deu conta que atualmente os principais desafios que os migrantes enfrentam no território são a o acesso à habitação e a documentação.
“Nós [Igreja] não temos, se calhar, a capacidade de resolver os problemas em si, mas temos muitos polos, tem alguns centros, tem algumas paróquias que conseguem orientar, encaminhar, muitas vezes esclarecer, ensinar e guiar o caminho”, explicou.
Sobre a relação entre a insegurança e os imigrantes, levantada por alguns grupos e políticos, Tânia Moreira realça que tal não responde à realidade e que Igreja tem o papel fundamental de mostrar que ao conhecer o próximo se está perante um irmão.
Nós não temos que ter medo das pessoas e temos que ter a capacidade de ir contra e de argumentar contra este discurso, dizendo que nós, a partir do momento que conhecemos o próximo, vemos que é um ser igual a nós. Podemos ter uma cor de pele diferente, os olhos diferentes, vestirmos de formas diferentes, mas no fundo somos todos iguais”, disse.
LJ/OC