Mensagem e Plano de Acção dos episcopados católicos de África para o Dia Mundial da Luta contra a SIDA

“A abstinência para os solteiros e a fidelidade para os casados são a melhor forma de evitar a infecção de si mesmo e dos outros através do HIV” Caros irmãos e irmãs na fé, “Que Deus, nosso Pai, e Jesus Cristo, nosso Senhor, vos dêem felicidade e paz!” (1Cor 1,3) Nós, Cardeais, Arcebispos e Bispos de África e Madagáscar, saudamo-vos na fé e com muito afecto. Reunidos na 13ª Assembleia Plenária das nossas Conferências Episcopais de África e Madagáscar (SCEAM), debruçámo-nos sobre a pandemia da SIDA e as suas terríveis consequências. Ao fazê-lo, estabelecemos uma comunhão muito estreita convosco, caros irmãos e irmãs infectados e afectados pelo HIV/SIDA, e também com todos aqueles que se sentiram motivados para se juntarem ao combate contra o flagelo da SIDA. I. ESTAMOS SOLIDÁRIOS “Assim como o corpo é um só e tem muitas partes e todas elas, apesar de muitas, formam um só corpo, assim acontece também com Cristo.” (1Cor 12,12). Esta imagem eloquente exprime bem a solidariedade que sentimos para com todos aqueles que sofrem, mas em especial em relação a vós, nossos irmãos e irmãs cristãos, que são um só corpo, com milhões de pessoas que constituem as comunidades de África e Madagáscar. É a vós que apelamos para que se unam para enfrentar a pandemia cuja gravidade ninguém pode ignorar. Que esta solidariedade seja correspondida por um conhecimento apurado da gravidade da ameaça que temos perante nós. Milhões de vidas já foram desperdiçadas prematuramente, há famílias inteiras desfeitas e um número incontável de crianças que ficaram órfãs e/ou infectadas pelo HIV. E são elas que, mais do que ninguém, necessitam de protecção, carinho, alojamento, educação e pais adultos. II. SEJAMOS SINCEROS CONNOSCO PRÓPRIOS Como dirigentes das nossas comunidades cristãs, comprometemo-nos a disponibilizar os recursos da nossa Igreja, quer se trate das nossas instituições de ensino e de saúde, quer de serviços sociais. Trabalharemos em colaboração estreita com todos os doadores que estiverem dispostos a apoiar e a trabalhar com as organizações cristãs e fundamentadas na fé. Estamos abertos a parcerias com os mesmos e com outros que estejam dispostos a colocar os seus recursos ao serviço deste combate, e que o façam sabendo bem que trabalhamos com as convicções que o Evangelho criou em nós. Porque “nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus.”(Mt 4,4). A moral que ensinamos em nome de Deus procura respeitar e afirmar a vida humana que encontra o seu valor e dignidade no facto de ser um dom inviolável do nosso Pai que cria todos os seres humanos e a todos chama a uma vida em plenitude. Assim, a abstinência para os solteiros e a fidelidade para os casados são, não só, a melhor forma de evitar a infecção de si mesmo e dos outros através do HIV, como também, e mais importante ainda, a melhor maneira de assegurar o progresso no sentido da felicidade duradoura e de uma verdadeira realização. “Por isso, meus queridos irmãos e irmãs, permanecei firmes e inabaláveis, aplicando-vos cada vez mais à obra do Senhor, tendo sempre presente que o vosso trabalho no Senhor não é em vão.” (1 Cor 15,58). III. MUDEMOS O NOSSO COMPORTAMENTO Para além de ensinarmos a moralidade da Igreja e de partilharmos as convicções morais desta com a sociedade civil, e para além de informarmos e alertarmos as pessoas para os perigos da infecção pelo HIV, queremos ensinar correctamente e promover aquelas alterações ao nível das atitudes e dos comportamentos que privilegiem a abstinência e o auto-controlo antes do casamento e a fidelidade matrimonial. Queremos envolver-nos na educação da afectividade e na educação sexual para toda a vida, para ajudar os jovens e os casais a descobrirem a maravilha da sua sexualidade e das suas capacidades no domínio da reprodução. A partir dessa admiração e desse respeito surge uma sexualidade responsável e um método de gestão da fertilidade no respeito mútuo entre o homem e a mulher. Este tipo de educação só pode ser levado a cabo eficazmente através da colaboração de homens e mulheres leigos que falem não só dos princípios da moralidade, como também, enquanto jovens e enquanto casais, dêem um testemunho vivo de que a fidelidade a estes princípios morais produz uma vida afectiva e sexual humanizante e gratificante. Este tipo de educação contribui também para promover famílias saudáveis e estáveis que são a melhor prevenção contra a SIDA. Existem por toda a África organizações especializadas nesse tipo de educação para os jovens e casais e que estão a ter um grau de êxito que, embora pequeno, não deixa de ser gratificante. Dêmo-lhes o apoio e o encorajamento que merecem. IV. SEJAMOS RESPONSÁVEIS A solidariedade de que falámos há pouco une-nos numa responsabilidade comum pela resolução dos desafios globais e complexos que se nos deparam: guerras intermináveis e que se reacendem, conflitos e violência, onde a violação é frequentemente utilizada como uma arma, que é não só psicologicamente violenta como fisicamente destrutiva através do HIV/SIDA! Verificámos também que a pobreza caminha de mãos dadas com o HIV e a SIDA. Preocupa-nos o facto de que as nossas economias, já de si frágeis, fiquem ainda mais enfraquecidas porque uma grande parte da mão-de-obra qualificada se perde devido ao HIV e à SIDA. A pobreza facilita a transmissão do HIV, torna financeiramente incomportável o tratamento adequado, acelera a morte devida a doenças relacionadas com o HIV e multiplica o impacto social da epidemia. Relativamente a todos estes aspectos, “todos os membros [do mesmo corpo] tenham a mesma solicitude uns com os outros.” (1Cor 12,25). Esta solidariedade entre nós e esta fidelidade à nossa fé, esta determinação em mudar de comportamento e assumir toda a nossa responsabilidade pelo futuro do nosso continente, assumem agora uma forma concreta no seguinte Plano de Acção. Queremos comunicá-lo a vós para que também o aceiteis como vosso. PLANO DE ACÇÃO Nós, Cardeais, Arcebispos e Bispos do SC E AM, propomos aos membros do clero, irmãos e irmãs na vida religiosa, aos crentes e a todas as pessoas de boa vontade, o seguinte plano de acção: Em solidariedade convosco, comprometemo-nos a: 1. Utilizar e aumentar os recursos humanos, materiais e financeiros dedicados à resolução da situação provocada pelo HIV e pela SIDA nas nossas comunidades, e identificar pontos focais nas paróquias, dioceses e conferências episcopais nacionais com vista a apoiar a compilação de informação e o desenvolvimento de estratégias programáticas. No âmbito deste mesmo esforço, comprometemo-nos a coordenar as nossas iniciativas ao nível do continente no combate contra a pandemia. 2. Certificar-nos de que os serviços de saúde da Igreja, os serviços sociais e as instituições de ensino dão uma resposta adequada às necessidades das pessoas que estão doentes com SIDA. 3. Concentrar os nossos esforços na vulnerabilidade especial das raparigas e no pesado encargo suportado pelas mulheres no contexto da pandemia do HIV em África. 4. Defender com vigor o acesso ao tratamento para aqueles que estão impedidos de o obter devido à pobreza ou a injustiças estruturais. 5. Implicar aqueles que dispõem de conhecimentos sobre medicinas tradicionais e outros remédios naturais na investigação de meios de combate à SIDA. Fiéis às convicções que nos vêm do Evangelho, comprometemo-nos convosco a: 1. Colaborar com outras confissões cristãs e com pessoas de outras crenças que estejam a trabalhar nas suas comunidades respectivas no apoio às pessoas afectadas e infectadas pelo HIV/SIDA. 2. Promover parcerias mais estreitas com a sociedade civil, o sector empresarial, os governos, as Nações Unidas, as agências internacionais e inter-governamentais e d e modo particular com as organizações de pessoas que vivem com HIV e SIDA, de modo a aumentar a capacidade de prestação de cuidados e apoio, sem deixar de parte as nossas convicções evangélicas. Tendo perante nós a ameaça grave da SIDA, comprometemo-nos convosco a: 1. Promover as mudanças de mentalidade, atitude e comportamento necessárias para enfrentar o desafio da pandemia. 2. Trabalhar incansavelmente com o objectivo de eliminar o estigma e a discriminação e de desafiar quaisquer normas e práticas sociais, religiosas, culturais e políticas que perpetuem tal estigma e discriminação. 3. Desempenhar um papel importante na erradicação dos mitos nocivos do estigma e da discriminação através da dinamização do Aconselhamento e Teste Voluntários (VCT/A TV) para que aqueles que estiverem infectados possam beneficiar dos cuidados e do apoio de que necessitam. Deste modo, será também possível controlar melhor a transmissão de mães para filhos. 4. Defender a todos os níveis junto dos governos e das organizações inter-governamentais, o estabelecimento de prioridades em matéria de políticas que apoiem de forma adequada aqueles que estão afectados pelo HIV e pela SIDA, que providenciem o acesso a cuidados e tratamentos e a uma vida condigna para as pessoas que vivam com o HIV e com a SIDA, e que ponham em prática os compromissos assumidos nas várias reuniões inter-governamentais. Através de uma responsabilidade partilhada convosco, comprometemo-nos a: 1. Desenvolver programas educacionais que integrem o tema do HIV/SIDA na teologia e na formação religiosa. Estes programas incluirão igualmente princípios morais e competências práticas que visem a promoção de relações saudáveis e de uma sexualidade devidamente integrada. 2. Promover e aprofundar a reflexão teológica sobre as virtudes da compaixão , amor, cura, reconciliação e esperança, virtudes que permitem enfrentar o julgamento, a vergonha e o medo que tão frequentemente estão associados ao HIV e ao SIDA. 3. Organizar sessões de estudo a nível regional, nacional, diocesano e paroquial, com vista a aumentar os conhecimentos devidamente fundamentados e a sensibilidade relativamente a todas as questões associadas ao HIV e ao SIDA que sejam pertinentes para a nossa Igreja. 4. Incentivar as pessoas que vivam com ou sejam afectadas pelo HIV/SIDA a terem uma participação activa nas nossas comunidades locais como pessoas especialmente válidas na luta contra a epidemia. Por último, como Pastores da Igreja Família d e Deus em África na época da SIDA, queremos: 1. Dar formação ao clero, a os religiosos e a os leigos empenhados para que possam acompanhar as pessoas que vivem com e são afectadas pelo HIV e pela SIDA através da oração e do aconselhamento espiritual. 2. Providenciar formação doutrinal, espiritual e social, assim como a melhor formação profissional possível, para as pessoas que desejarem dedicar-se à prestação de cuidados e ao acompanhamento de quantos vivam com e sejam afectados pelo HIV/SIDA. 3. Acolher nas nossas igrejas as pessoas que vivam com HIV e com SIDA de uma forma carinhosa, compassiva e sem formulação de julgamentos e assegurar-lhes um “lugar à mesa do Senhor”. 4. Ministrar os sacramentos e sacramentais, conforme necessário e solicitado, aos católicos que vivam com o vírus. 5. Pôr em acção o desafio lançado pelo Santo Padre, o Papa João Paulo II, à Igreja do nosso continente , através da sua Exortação Apostólica “Ecclesia in Africa”. “A luta contra a SIDA deverá ser o combate de cada um de nós. Fazendo eco da voz dos Padres Sinodais, também nós pedimos aos trabalhadores da pastoral, que levem até aos seus irmãos e irmãs, afectados pela SIDA, todo o conforto material, moral e espiritual possível. Pedimos urgentemente aos cientistas e dirigentes políticos de todo o mundo ,movidos pelo amor e pelo respeito que é devido a todas as pessoas, que utilizem todos os meios disponíveis para porem fim a este flagelo.” (João Paulo II, “Ecclesia in Africa”) É nossa intenção criar um serviço HIV/SIDA ao nível do Continente que possa ajudar-nos a pôr em prática o nosso Plano de Acção. Dakar, Senegal, 7 de Outubro de 2003 (Assinado) Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar (SCEAM) em Sessão Plenária

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