1. Atentas as dificuldades mundiais e nacionais, os dias de hoje convidam, cada vez mais, à coerência e à moderação. Os problemas da fome, do desemprego, das falências e vazios dos postos de trabalho, a falta de ânimo, os desequilíbrios entre os que possuem e os que nada ou pouco têm, a ausência de critérios éticos ou a hostilidade a razões de conduta, pedem uma mudança. Delicada como esta doença é a questão da justiça social, calada e ansiosa em muitos sectores e pessoas. A solidariedade não pode traduzir nem interesses assistencialistas nem soluções de ocasião em ordem a pôr cobro ao fatalismo da desigualdade. 2. Neste período da Quaresma e a caminho da Ressurreição, na Páscoa de Jesus, dever-nos-íamos todos interrogar por que não nos tocam intranquilidades dos que sofrem? Por que não nos dispomos a agir, pessoal e em conjunto, contra o que não é equitativo nem verdadeiro? Quais serão as possíveis causas do medo e do pouco jeito em falar destes descaminhos? Por que não pedir justiça para os que a não têm e apoio de toda a ordem, inclusive o económico-social, a favor de quem nada ou pouco tem? Porquê o receio de falar e de pedir para os outros? Como explicar a ausência habitual de contribuição generosa, desde há longos anos, como resposta a campanhas de partilha que a Igreja Católica tem promovido no âmbito das Forças Armadas e de Segurança? 3. Na Mensagem para a Quaresma deste ano, o Papa Bento XVI, a propósito da moderação nos hábitos alimentares, salienta que “o jejuar voluntariamente ajuda-nos a cultivar o estilo do Bom Samaritano, que se inclina e socorre o irmão que sofre”, na senda do Profeta Isaías (58, 1-9): “o jejum que me interessa é quebrar as cadeias injustas, (…) pôr em liberdade os oprimidos, repartir o pão com o faminto, dar pousada aos pobres sem abrigo (…)”. 4. Ouvido o órgão representativo dos Capelães militares, obtive a resposta unânime de que, destinando-se este ano a partilha quaresmal a favor de situações difíceis em Portugal, deveria a mesma contemplar o sector de crianças abandonadas e em risco, a quem se devotam as “Irmãs da Madre Teresa de Calcutá” (Congregação das Missionárias da Caridade), em Setúbal. Como quem me lê, tem o sadio hábito de pensar e, sem travos na língua, aponta logo o remédio e a salvação, aqui me tem a pedir-lhe que, agora, por obras, esteja ao lado de crianças desamparadas e desprotegidas. Um pobre nunca é livre! Sob a luz da coragem de Teresa de Calcutá, pisemos a estrada da libertação! Januário Torgal Mendes Ferreira, Bispo das Forças Armadas e de Segurança