Mensagem de Páscoa do bispo de Angra

A Páscoa é a grande festa dos cristãos, o centro do ano litúrgico. É que a Ressurreição de Jesus é o fundamento da fé cristã. Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé – adverte S. Paulo (1 Cor 15, 17). Ressuscitando, Jesus afiança a Sua mensagem libertadora e a promessa de salvação. Que é uma realidade, não apenas esperada, mas já presente. Por isso mesmo, a Ressurreição de Jesus, celebrada na Páscoa, é fonte e sólido fundamento da esperança cristã. Conforme a definição da Cartas aos Hebreus, a fé é esperança, no sentido de constituir a garantia do que se espera e a certeza do que não se vê. Est autem fides sperandarum substantia rerum, argumentum non apparentium: a fé é a “susbtância” das coisas que se esperam; a prova das coisas que não se vêem (Heb 11, 1). A fé não é simplesmente convicção subjectiva. «Dá-nos já agora algo da realidade esperada… Ela atrai o futuro para dentro do presente… Pela fé, de forma incoativa – poderíamos dizer em “gérmen” e, portanto, segundo a susbstância – já estão presentes em nós as coisas que se esperam: a totalidade, a vida verdadeira. E precisamente porque a coisa em si já está presente, esta presença daquilo que há-de vir cria também certeza: esta “coisa”, que há-de vir, ainda não é visível no mundo externo (não “aparece”), mas pelo facto de a trazermos, como realidade incoativa e dinâmica dentro de nós, surge já agora uma certa percepção dela» (Bento XVI, Spe Salvi, 2007, nº 7). Portanto, a esperança cristã não é optimismo ingénuo, de quem não vê os problemas e as dificuldades. Nem é mera probabilidade. É firme certeza. «É espera das coisas futuras, a partir de um dom já presente. É espera na presença de Cristo, isto é, com Cristo presente – que se completa no Seu Corpo, na perspectiva da Sua vinda gloriosa» (Ibid. 9). O que aconteceu à Cabeça, que é Cristo, acontecerá também aos membros do Corpo, que somos nós. A mensagem cristã não é apenas “informativa”. É “performativa”. Realiza o que anuncia. Mas, como explica Bento XVI, a “redenção” «não é um simples dado de facto». É-nos oferecida em esperança (cf. Ibid. 1). De facto, nós já fomos salvos, mas em esperança. Quando se vê aquilo que se espera, então já não é esperança, pois como é que alguém espera aquilo que já está a ver? Mas, se esperamos aquilo que ainda não vemos, esperamo-lo com paciência (Rm 8, 24). O que não significa resignação passiva. A esperança cristã é activa. Implica compromisso, realizado com confiança, perseverança e constância, isto é, «paciência», em sentido bíblico. Que é também «paixão», no sentido de dedicação total e de luta sofrida. É o que S. Paulo exprime, quando afirma: Bem sabemos que até agora o mundo todo geme e sofre, como se fossem dores de parto. Não é só universo, mas também nós, que já começámos a receber os dons do Espírito. Nós sofremos e esperamos… a nossa total libertação. (Rm 8, 22-23). – Assim, nesta perspectiva da fé pascal, nós cristãos deveríamos estar mentalizados e preparados para as mudanças necessárias, na sociedade em que vivemos e também na Igreja, a que pertencemos. Estamos realmente numa transição de época: saindo de um modelo, inadequado à situação actual e entrando noutro, ainda não bem definido. Isso é desconfortável. Exige roturas, também dolorosas, dentro e fora da Igreja. – Podem e devem-se discutir os conteúdos e os métodos das mudanças. Mas elas são um imperativo inadiável. Devem encontrar eco no cristão esclarecido e comprometido, que quer ser também um cidadão responsável. – Pouco adianta lamentar-se ou simplesmente protestar. Importa inserir-se no debate, dando o contributo positivo da visão cristã da vida e da história. Comprometendo-se com a mudança. Qual fermento, que leveda a massa. A vida cristã é uma caminhada permanente de conversão e, portanto, de mudança, também na forma histórica de presença no mundo. – Todas as realizações humanas, porque limitadas e condicionadas circunstancialmente, são relativas e efémeras. A realidade última e definitiva é a Páscoa de Jesus, que já marcou o destino da humanidade, abrindo caminho ao Reino de Deus. Sempre em construção, mas já presente no meio de nós. – Por isso mesmo, os cristãos deveriam ser homens e mulheres do futuro, abertos às mudanças, que se impõem na sociedade e na Igreja. Porque acreditam na regeneração humana, comprometem-se. Não desistem perante as inevitáveis dificuldades. Encaram o futuro com esperança. Porque acreditam em Jesus Ressuscitado, possibilidade divina das impossibilidades humanas. Oportunas, também para nós hoje, as palavras que Jesus dirigiu outrora aos Apóstolos: No mundo tereis aflições, mas tende confiança: Eu venci o mundo (Jo 16, 33)! Feliz Páscoa! D. António Sousa Braga, Bispo de Angra

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