Nasceu Cristo, a nossa Esperança!
1. Completam-se, este ano, 800 anos do primeiro presépio feito por S. Francisco numa gruta, em Greccio, na Itália. Queria contemplar a pobreza e a ternura do Filho de Deus, o Menino Jesus.
O Filho de Deus, criador de todas as coisas com o Pai e o Espírito Santo, escolhe uma gruta e faz-se carne na fragilidade desconcertante de um bebé. Naquele dia, o Céu e a terra ficam do mesmo lado, como hoje.
Um Menino nos foi dado, veio habitar no meio de nós, mas, antes, habitou um ventre de mulher, Maria e uma casa de família com José. Uma família que também foi gruta de acolhimento para Jesus. Que bela a família cristã! Imitando Jesus, Maria e José, cada família pode ser tão divina quanto humana! Penso e peço por todas, todas, todas as famílias. Peço que Jesus possa ser o seu encanto e lhes traga, como prenda, os dons da alegria, da paz, da ternura e do amor que gera unidade. Lembro também quem não tem família e os que a perderam.
2. Ele é o “Deus connosco”! Deixemo-nos mover pela fé, contemplemo-Lo e a celebremo-Lo juntos! Veio para os Seus, mas, o pior que se poderá dizer é que não O receberam.
Diz o Evangelho que muitos vieram adorar o Menino. Terão vindo porventura alguns curiosos para verem esta família sem casa nem lugar na hospedaria! Porém de quem se fala é dos humildes pastores avisados pelo Anjo e dos abastados reis. Os primeiros eram incultos, sem vida religiosa, marginalizados e muitas vezes desprezados, sem casa para habitar, dormiam mesmo com os rebanhos! Os Reis Magos eram de outra cultura, representavam todos os povos da terra, seriam de outra religião, mas que, seguindo os sinais no céu, O encontraram e adoraram. Deus não deixa ninguém sem sinais de pista para se fazer encontrar.
3. A gruta de Belém, na sua simplicidade, ajuda-nos a compreender o essencial: Cristo nasceu e veio para todos, todos, todos. Não permite que deixemos alguém para trás, marginalizado, abandonado, descartado.
Celebramos este Natal num tempo difícil. As noites escuras do mundo continuam a fazer-nos sofrer com os gritos da humanidade: a guerra, a fome, a falta de habitação, as dificuldades financeiras de tantas famílias, a doença, a exclusão, a privação da liberdade, são experiências duras que nos convocam a redescobrir a esperança cristã e a plantá-la no coração de quem vive estes problemas mais de perto.
O Natal cristão não pode ser apenas feito de bonecos de barro no presépio ou ser reduzido a uma festa social. Tem que ser festa marcada pela Esperança.
No cuidado ao outro, como Maria e José cuidaram de Jesus naquela noite em que todas as portas foram fechadas; no amor confiante, de nos sabermos filhos acolhidos nos braços amorosos de Deus Pai; na ajuda ao próximo, com a coragem de nos abrirmos a uma solidariedade concreta, na certeza de que a Estrela de Belém, do Natal de Jesus, irradiam luzes de amor e confiança que continuam a ser mais poderosas que as trevas.
Não haverá crise política que sempre dure, pobreza que sempre exclua, dignidade humana que seja sempre roubada, abuso que seja sempre tolerado…
A esperança cristã abre sempre caminho a outra vida: a gestos gratuitos de amor, de ternura e de compaixão, que alimentam uma cultura do cuidado.
4. A esperança, a segunda das virtudes teologais, é o tema central do próximo biénio na nossa diocese: “Todos, todos, todos: Caminhar na esperança”.
Neste Natal, peço-vos que nos disponibilizemos todos, todos, todos para darmos continuidade ao caminho que já iniciamos e que iremos trilhar até 2025, participando e refletindo, a partir da Igreja que somos. Podemos ser sementes de uma esperança renovada para o mundo.
As maiores esperanças nascem nos contextos mais sombrios, como nos recorda São Paulo: “A tribulação produz a paciência; a paciência, a firmeza; e a firmeza, a esperança» (Rm 5, 3-4). Que a nossa esperança seja, assim, animada pela audácia a que o tempo presente nos convoca, enraizada na história que nos orgulha e marcada pelo inconformismo dos jovens que nos desinstalam e nos abrem horizontes.
Neste Natal, olhemos para a nossa própria existência, com os mesmos olhos de Jesus, o verdadeiro autor da nossa esperança, como nos lembra o Papa Francisco, ao ponto de ter convocado um Jubileu da Esperança, em 2025.
Sabemos que a esperança é uma virtude que nunca desilude, porque opera em nós a mudança necessária para transformar o mundo. Não se trata de uma poção mágica, mas da essência da vida que nos é dada por Cristo.
5. Oxalá todos os dias sejam dias de Natal, porque dias de uma esperança. Depende de todos, porque todos contamos. Deus está e caminhará connosco.
Desejo que cada família, cada comunidade eclesial, cada hospital, Estabelecimento Prisional, Instituição pública ou privada onde as pessoas estão no centro , sejam, neste Natal, uma gruta acolhedora para todos os irmãos, a começar pelos mais frágeis e necessitados. Aí nascerá Deus, porque os espaços onde vence o amor torna-se gruta onde Deus se faz presente!
Tenho presente, sobretudo cada doente, cada esquecido e só, mas também cada diocesano, cada colaborador- padre, religioso ou religiosa, leigo ou leiga- a todos e a cada um, desejo a luz e a força para serem testemunhas do Natal do Senhor.
Um santo Natal para todos, um Natal pleno de alegria e um ano de 2024 com todos, todos, todos, sempre animados pela esperança.
D. Armando Esteves Domingues, bispo de Angra