O Natal é a época do ano que gera maior envolvência em todas as idades e camadas sociais. É certo que nem todos se referem ao Natal pelos mesmos motivos. Mas nem por isso deixa de ser verdade que esta quadra do ano exerce sobre todos uma forte atracção. Todos se lhe referem como algo extraordinário, carregado de uma espécie de magia, capaz de transformar os corações. E foi mesmo para transformar os corações dos seres humanos que o Verbo de Deus encarnou no seio de Maria e nasceu pobre e humilde em Belém. O Filho de Deus veio habitar no meio da humanidade para que os corações esfriados pela rotina se aquecessem no fogo do amor; os corações endurecidos pelo ódio se amolecessem na ternura do perdão; os corações agitados pela sede do poder se pacificassem na humildade do serviço; os corações fechados pelo egoísmo se abrissem à generosidade da partilha; os corações dominados pela tristeza do erro e do pecado se deixassem iluminar pela luz da verdade e do bem.
Com efeito, Jesus é a luz do mundo e veio à terra para vencer as trevas e comunicar a verdadeira luz aos corações que a querem receber, capacitando-os para espalharem à sua volta os reflexos da luz que os habita, através de palavras sábias, de gestos fraternos e acções de misericórdia. Nesse modo de proceder se reconhece a genuína celebração do Natal.
Há muitas celebrações natalícias que se afastam dessa perspectiva da fé. Acentuam as manifestações festivas, valorizam o convívio familiar, concentram-se no lazer e no descanso. Todas são legítimas. Mas esvaziam o Natal do seu sentido original e autêntico. O Natal cristão celebra o nascimento de Jesus, o Salvador, prometido na aurora dos tempos, anunciado pelos profetas, nascido da Virgem Maria, na “plenitude dos tempos”, na pequena cidade de Belém. E continua a nascer, ao longo dos tempos, não em grutas mas nos corações daqueles que lhe abrem a porta.
Nesta sociedade tão marcada por situações de carência económica, de abusos de confiança, de atropelos à justiça social, de desrespeito pela dignidade humana, a celebração do Natal perderá o seu sentido original se ignorarmos as carências que existem à nossa volta e permanecermos fechados no nosso pequeno mundo.
O Verbo de Deus saiu do seio do Pai e veio ao encontro da humanidade. O Natal convida-nos a sair da nossa zona de conforto para irmos ao encontro de quem precisa da nossa presença e da nossa ajuda. Comecemos por abrir os olhos e os ouvidos. Reparemos nas carências de vária ordem que existem à nossa volta. Ouçamos os clamores que se levantam perto de nós. Deus ouviu o clamor do povo e veio ao seu encontro. Ouçamos também nós as vozes dos que clamam por justiça, dos que pedem ajuda, dos que mendigam o pão de cada dia. São as vozes dos nossos irmãos, com os quais Jesus Cristo se identifica. Ouvir as suas vozes é ouvir a voz de Cristo!
Santo e Feliz Natal para todos!
+ José, Arcebispo de Évora