Por ocasião do ‘dia mundial da criança’ (1 de Junho) ouviu-se uma observação sobre o crescente medo que alguns adultos manifestaram em terem para com as crianças gestos de carinho, pois não se sabe o que isso pode significar, tanto na mente dos outros adultos como nos receios/traumas das próprias crianças. Um palhaço dizia mesmo que agora deixou de fazer festas/carícias às crianças, se estas lhe são desconhecidas. Isso afectaria o seu trabalho e o atractivo da sua figura junto dos mais novos! Nesta paranóia colectiva entorno da pedofilia temos estado a ser intoxicados com inúmeros sinais de contradição: as crianças afectadas estão desprotegidas do contexto familiar e, porque este não existe, elas estão mais vulneráveis à desprotecção e desrespeito de qualquer tipo de abusos! De facto, há muitos adultos desequilibrados/traumatizados por vivências agressivas, violentas ou violadoras enquanto foram crianças… E isso repercute-se, posteriormente, no trato com os mais novos. Com efeito, como pode alguém dar carinho se foi educado ao repelão, por entre gritaria ou à custa de pancadaria? Como pode alguém ter gestos de ternura para os mais novos se foi educado por entre impropérios, palavrões ou mesmo vendo agressão entre os próprios pais? Como pode alguém ter segurança e transmiti-la aos mais novos se foi educado sendo desvalorizado ou pela negativa – ‘só fazes asneiras’, ‘nunca mais aprendes’… – em vez de terem olhado para o que ia fazendo bem ou, pelo menos, cada vez menos mal? É notório que a atenção à criança tem crescido tanto ao nível legislativo, como na dimensão sociológica, bem como na vertente religiosa e política. Mas é, sobretudo em aspectos de natureza educacional e cultural, que a criança tem estado a ser mais atendida, estudada e acarinhada. É de carinho (ou da falta dele) que se trata quando uma criança é vista na sua personalidade, isto é, como pessoa e não como mero – quantas vezes foi assim olhada por tantos ditos ‘pedagogos’! – adulto em miniatura. Quem não se lembra do que lhe fizeram – positivo ou negativo – quando criança? Desde o gesto, a atitude ou a palavra mais aparentemente inofensiva até àquilo que mais marcou… tudo está registado, consciente ou inconscientemente, na memória que agora nos faz ser, actuar e estar com os outros. . Auspiciamos que a nova lei da adopção seja um contributo para criar um ambiente mais saudável para tantas crianças à espera de ter família; . Desejamos que os casos de anormalidade comportamental de tantos adultos (mais recentemente noticiados) possam servir de remédio, no futuro, para que seja dada mais atenção às crianças desprotegidas; . Ansiamos pelo equilíbrio intelectual, emocional e cultural nos meios de comunicação social por forma a ser construída uma sociedade mais sensível aos valores da pessoa humana em qualquer das etapas da vida. Afinal as crianças precisam de gestos de carinho equilibrado, exigente e adulto! A. Sílvio Couto