Teresa Costa Pereira, Diocese de Évora
O mês de Março é dedicado a S. José, pai adoptivo de Jesus e modelo, por excelência, tanto de crente como de pai. O dia 19 está-lhe especialmente consagrado e dedicado também, por seu intermédio, a todos os pais.
Só depois de muitos séculos de silêncio é que a Igreja lhe manifestou o seu profundo reconhecimento, tendo-se concretamente e para este efeito destacado, de um modo especial, Santa Teresa de Ávila (1515-1582), ao colocar todos os Conventos Carmelitas sob a sua protecção e afirmando assim no seu Livro da Vida 6,6.: «…tomei o glorioso São José como meu advogado e senhor e muito lhe confiei (…). Não me lembro até hoje de lhe ter implorado algo que não me tenha sido concedido».
Logo no início do pontificado do Papa Francisco, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos acrescentou em Decreto, datado de 1 de Maio de 2013, o nome de S. José nas Orações Eucarísticas II, III e IV do Missal Romano (“com a Virgem Maria, Mãe de Deus, com São José, seu esposo, os bem-aventurados Apóstolos…”).
De facto, o actual Papa, por uma evidente e bem expressiva devoção ao Patrono da Igreja Universal (assim declarado pelo Papa Pio IX, em 1870, através do seu decreto Quemadmodum Deus), em 16 de Janeiro de 2015, num Encontro de Famílias que teve em Manila, aquando da visita pastoral ao Sri Lanka e às Filipinas, revelaria a sua profunda devoção e confiança deste modo:
«Amo muito São José, porque é um homem forte e silencioso. Na minha escrivaninha, tenho uma imagem de São José que dorme e, enquanto dorme, cuida da Igreja. Sim! Pode fazê-lo, como sabemos. E, quando tenho um problema, uma dificuldade, escrevo um bilhetinho e meto-o debaixo de São José, para que o sonhe. Este gesto significa: reza por este problema».
Ao proclamar o ano de 2021 (de 8 de Dezembro de 2020 a 8 de Dezembro de 2021) como “Ano de São José”, por ocasião do 150º Aniversário da sua Declaração como Padroeiro Universal da Igreja, ofereceu-nos 12 Catequeses e a Carta Apostólica “Patris Corde” (Com coração de pai).
E tudo isto porquê? Centremo-nos então no muito que de S. José nos foi revelado com base e apenas nos poucos textos bíblicos que dispomos, mas que nos ressaltam a profundidade tão expressiva de uma autêntica vida crente:
1. Começando por se estabelecer um justo paralelismo entre o quadro da anunciação a Maria e o seu próprio quadro de anunciação (Cf. Lc 1,26-38 e Mt 1,18-25) encontramos estreitas semelhanças e, ao mesmo tempo, traços característicos muito peculiares.
Do mesmo modo que a Maria foi dito que iria ser mãe de Jesus (Cf. Lc 1,31), assim foi dito a José (Cf. Mt 1,21). Do mesmo modo que a Maria foi dito para não temer (Cf. Lc 1,30), assim foi dito a José (Cf. Mt 1,20).
Em confronto com o anúncio da promessa divina, Maria responde pela palavra: “Maria disse” (Lc. 1, 38). José, por seu lado, responde pela acção: “José fez” (Mt 1, 24). Ou seja, falou sem abrir a boca!
2. A vida de José sustenta-se, na verdade, numa fé de obras, entendida e tão bem expressa na verticalidade da sua existência. Nos curtos textos que dispomos para o conhecer repete-se claramente um movimento contínuo na sua resposta aos pedidos frequentes de Deus: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge…” (Mt 2,13) e “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e vai…” (Mt 2, 20). José só possui uma atitude: “Levantou-se… tomou o menino e sua mãe e partiu…” (Mt 2,14) e “Levantando-se, tomou o menino e sua mãe e voltou…” (Mt 2,21). “Retirou-se para a região da Galileia…” (Mt 2,22).
Como podemos comprovar pelas fontes que dispomos, José é um homem sempre pronto para servir, através de uma atitude vertical de permanente subida para Deus (Cf. Lc 2,4) e saída de si mesmo (um servo sempre em pé! ☺), mas também e sempre depois de uma atenta e horizontal escuta interior da Voz Divina (Cf. Mt 1,24; 2,13.19.22). Tais referências demonstram-nos que o seu sono não é resultado de uma postura passiva nem infrutífera, mas sim dos necessários momentos de paragem da voz do seu pensamento e vontade, de modo a escutar unicamente, e através dos sonhos, a Voz de Deus e a cumprir a Sua Vontade.
Contudo, o caminho de José não é linear, mas encontra-se sujeito à prova. O sofrimento faz também parte da sua vida (Cf. Mt 1,19-20; 2,13-23; Lc 2,6-7.3435.41-52), demonstrando assim que a experiência de uma vida crente não tolera passividade. Enquanto atitude realiza-se num permanente projecto dinâmico de atenção e cumprimento.
No caminho terreno que percorre com Maria, José vai à frente, mas sempre em sentido de uma prudente “rectaguarda”, sendo um claro exemplo do que significa verdadeiramente servir: quem está e/ou quem vai à frente é quem está e/ou quem caminha por detrás. Vai à frente precisamente porque se mantém “atrás”, ou seja, num verdadeiro espírito de entrega e serviço.
O exemplo de S. José, enquanto pai de Deus feito Homem, comprova-nos que o sentido da vida não se concretiza apenas no acto de abrir a boca…, nem na manifestação exclusiva de gestos visíveis e grandiosos, mas sim na dádiva generosa de si mesmo. Esta plena entrega de vida sustenta-se, de facto, numa permanente “paragem” e “saída” de si próprio, de modo a poder já participar da Vida e Missão do seu Filho Adoptivo que «não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida» (Mt 20,28).