Daniel Serrão
1. O Cnecv acaba de dar publicidade a um Parecer sobre os projetos de lei relativos a legalizar a gestação por substituição, alterando a Lei da Procriação medicamente assistida que está em vigor.
Este parecer não foi unânime, nem consensual, mas tal não foi noticiado. O que é de lamentar porque induz em erro a opinião pública.
Do que se trata, como aqui referi (ECCLESIA,n.º 1320 de 17 Jan.) é de “alugar” o útero de uma mulher que, mesmo sem benefício material, se disponibilize para ser instrumentalizada em benefício de outra mulher e, eventualmente, do casal.
Seis membros do Conselho, do maior prestígio, nacional e internacional – Michel Renaud, Ana Sofia Carvalho, Agostinho Almeida Santos, F. Carvalho Guerra, J. Germano de Sousa e Maria do Céu Patrão-Neves – votaram contra e elaboraram um contraparecer que só foi aceite como Declaração de voto. Em Países com uma Democracia mais antiga e mais integrada na sócio-cultura do Povo, como por exemplo a Dinamarca, os Pareceres do seu Conselho Nacional de Ética incluem sempre todas as opiniões dos membros, mesmo que seja apenas de um, no corpo do Parecer que é oferecido à opinião pública. Porque, como é óbvio, a ética não é uma questão de maiorias numéricas, nem é deliberativa. Neste caso concreto até se pode dizer que a maioria numérica do Cnecv, na sua composição atual, não reflete a maioria sociológica representada na Assembleia da República.
O texto do Parecer dos seis prestigiados Membros do Cnecv pode ser lido na Ecclesia online.
Aqui apenas posso informar que é de uma clareza meridiana no apontar das dificuldades que semelhante instrumentalização da mulher – reduzida, de facto, a um útero que fica grávido de filho alheio, que não lhe pertence, nem lhe pertencerá após sair do seu corpo-objeto – cria no plano social, psicológico, jurídico e, principalmente, ético.
Sendo certo, como este outro Parecer assinala, que é impossível garantir sempre que não haverá negócio envolvido, a legalização desta prática, exercida por médicos, abre a porta a desvios, até alguns aberrantes, muito difíceis de prever, de evitar e de punir.
O Relatório que antecede este outro Parecer, da responsabilidade de Michel Renaud, Professor de Filosofia e de Ética mas acolhido pelos restantes signatários, levanta esta interrogação substantiva: em que medida a mulher que recebe uma criança mediante uma gravidez de substituição, pode considerar esta criança como “sua”?
A investigação neurocientífica das diversas e mútuas relações mãe/filho, geradas durante a gestação, que são muito fortes e condicionam mudanças no desempenho cerebral da mulher grávida, dá a esta questão do Relatório a maior atualidade científica. Questão que nenhuma legislação pode resolver nos seus Artigos normativos.
2. O Parecer numericamente vencido, deve ser lido com cuidado e na totalidade, pois fundamenta, com rigor filosófico e ético, mas também com abertura à realidade concreta que está em causa, as 17 afirmações que o constituem e suportaram o voto negativo.
Destaco duas
“4. À partida não se afigura do interesse do nascituro o facto de lhe ter intencionalmente dissociado a função materna de natureza genética e a função materna de gestação”
“12. Será sempre impossível chegar à certeza do caráter gratuito e desinteressado da gravidez de substituição. Nenhuma comissão competente poderá chegar a uma certeza objetiva e comprovável quanto à gratuidade da GDS.”
A síntese final deste Parecer dos seis qualificados Membros que votaram contra o Parecer do Cnecv agora divulgado, é perfeito:
“Pelos problemas potenciais graves e potencialmente irreversíveis que acarreta, na sua maioria com uma incidência negativa sobre o interesse, a construção de identidade e o bem-estar físico e psicológico do nascituro, entendido como prevalecente sobre o interesse do “casal beneficiário”, não consideramos eticamente justificada a aprovação da gestação de substituição”
Este Parecer merece, seguramente, a aprovação da maioria sociológica do nosso País. Oxalá mereça, igualmente, a aprovação da maioria parlamentar.
Daniel Serrão
Este parecer não foi unânime, nem consensual, mas tal não foi noticiado. O que é de lamentar porque induz em erro a opinião pública.
Do que se trata, como aqui referi (ECCLESIA,n.º 1320 de 17 Jan.) é de “alugar” o útero de uma mulher que, mesmo sem benefício material, se disponibilize para ser instrumentalizada em benefício de outra mulher e, eventualmente, do casal.
Seis membros do Conselho, do maior prestígio, nacional e internacional – Michel Renaud, Ana Sofia Carvalho, Agostinho Almeida Santos, F. Carvalho Guerra, J. Germano de Sousa e Maria do Céu Patrão-Neves – votaram contra e elaboraram um contraparecer que só foi aceite como Declaração de voto. Em Países com uma Democracia mais antiga e mais integrada na sócio-cultura do Povo, como por exemplo a Dinamarca, os Pareceres do seu Conselho Nacional de Ética incluem sempre todas as opiniões dos membros, mesmo que seja apenas de um, no corpo do Parecer que é oferecido à opinião pública. Porque, como é óbvio, a ética não é uma questão de maiorias numéricas, nem é deliberativa. Neste caso concreto até se pode dizer que a maioria numérica do Cnecv, na sua composição atual, não reflete a maioria sociológica representada na Assembleia da República.
O texto do Parecer dos seis prestigiados Membros do Cnecv pode ser lido na Ecclesia online.
Aqui apenas posso informar que é de uma clareza meridiana no apontar das dificuldades que semelhante instrumentalização da mulher – reduzida, de facto, a um útero que fica grávido de filho alheio, que não lhe pertence, nem lhe pertencerá após sair do seu corpo-objeto – cria no plano social, psicológico, jurídico e, principalmente, ético.
Sendo certo, como este outro Parecer assinala, que é impossível garantir sempre que não haverá negócio envolvido, a legalização desta prática, exercida por médicos, abre a porta a desvios, até alguns aberrantes, muito difíceis de prever, de evitar e de punir.
O Relatório que antecede este outro Parecer, da responsabilidade de Michel Renaud, Professor de Filosofia e de Ética mas acolhido pelos restantes signatários, levanta esta interrogação substantiva: em que medida a mulher que recebe uma criança mediante uma gravidez de substituição, pode considerar esta criança como “sua”?
A investigação neurocientífica das diversas e mútuas relações mãe/filho, geradas durante a gestação, que são muito fortes e condicionam mudanças no desempenho cerebral da mulher grávida, dá a esta questão do Relatório a maior atualidade científica. Questão que nenhuma legislação pode resolver nos seus Artigos normativos.
2. O Parecer numericamente vencido, deve ser lido com cuidado e na totalidade, pois fundamenta, com rigor filosófico e ético, mas também com abertura à realidade concreta que está em causa, as 17 afirmações que o constituem e suportaram o voto negativo.
Destaco duas
“4. À partida não se afigura do interesse do nascituro o facto de lhe ter intencionalmente dissociado a função materna de natureza genética e a função materna de gestação”
“12. Será sempre impossível chegar à certeza do caráter gratuito e desinteressado da gravidez de substituição. Nenhuma comissão competente poderá chegar a uma certeza objetiva e comprovável quanto à gratuidade da GDS.”
A síntese final deste Parecer dos seis qualificados Membros que votaram contra o Parecer do Cnecv agora divulgado, é perfeito:
“Pelos problemas potenciais graves e potencialmente irreversíveis que acarreta, na sua maioria com uma incidência negativa sobre o interesse, a construção de identidade e o bem-estar físico e psicológico do nascituro, entendido como prevalecente sobre o interesse do “casal beneficiário”, não consideramos eticamente justificada a aprovação da gestação de substituição”
Este Parecer merece, seguramente, a aprovação da maioria sociológica do nosso País. Oxalá mereça, igualmente, a aprovação da maioria parlamentar.
Daniel Serrão