Tony Neves, na praça de S. Pedro, em Roma
10 de junho encheu de festa a Praça de S. Pedro e mais oito praças do mundo: Brazzaville, Bangui, Adis Abeba, Buenos Aires, Nagasaki, Lima, Jerusalém e do navio de resgate Mare Jonio, em Trapani, Itália. O I Encontro Mundial sobre a Fraternidade Humana, com o tema ‘Not Alone – Não sozinhos’, reuniu milhares de jovens e menos jovens que responderam ‘sim’ ao convite do Papa para uma celebração muito especial, com o objetivo de relançar o sonho de fraternidade do Papa Francisco que publicou, em 2020, a encíclica ‘Fratelli Tutti’ onde critica o regresso de certos populismos, do racismo e discursos de ódio, quase sempre amplificados pelos media e redes sociais. Este documento papal apresenta o ideal cristão da fraternidade e da amizade social, responsáveis pela construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária.
Ao longo da semana, passei algumas vezes na Praça de S. Pedro e na grande Via della Conciliazione e acompanhei o montar de tendas e mais tendas para apoio deste evento. A ida inesperada do Papa Francisco para o hospital refreou os ânimos, mas as suas palavras de incentivo fizeram avançar e concretizar este evento profundamente simbólico.
Entrei na praça no início da tarde, submetendo-me ao controlo de raio x, e pude ver o ambiente e fazer algumas fotos. Depois, percorri a Via della Conciliazione onde estavam instaladas dezenas de tendas da Coldiretti, a principal organização agrícola italiana que congrega cerca de 568 mil empresas do sector agrário. Ofereceram comida e bebida a milhares de pessoas como sinal de partilha e fraternidade e, nas diversas tendas, muitas empresas puderam divulgar e vender os seus produtos.
A abertura foi presidida pelo Cardeal Mauro Gambetti, Vigário do Papa para o Cidade do Vaticano que rezou pela rápida recuperação de Francisco e declarou: ‘no mundo, podemos viver como irmãos!’.
O Encontro girou em torno de três verbos: ‘participar, restituir, difundir’. Teve debates, partilhas de experiências e apresentações artísticas, em frente à fachada principal da Basílica de S. Pedro. Por ali passaram muitas figuras públicas, como Andrea Bocelli. Grandes momentos foram os diretos às Praças e ao navio de resgate, com espaços para testemunhos de risco e intervenções culturais muito apelativas. Marcou-me, particularmente, a passagem pelo navio de resgate e o direto à Praça da Catedral de Bangui, na RCA, onde dezenas de crianças construíram um ‘coração humano’.
Cabeças de cartaz deste evento foram 30 galardoados com o Prémio Nobel da Paz, encarregados de elaborar, com outros cientistas e académicos, uma Declaração de ‘Apelo à Fraternidade Humana’, para gritar bem alto ao mundo inteiro um rotundo ‘não à guerra!’. Coube aos Nobéis Muhammad Yunus e Nadia Murad ler o documento onde está escrito: ‘Queremos viver juntos, como irmãos e irmãs no Jardim que é a Terra. É o Jardim da fraternidade a condição de vida para todos. Somos testemunhas de como, em cada recanto do mundo, a harmonia perdida floresce quando a dignidade é respeitada, as lágrimas são enxugadas, o trabalho é remunerado de forma justa, a educação é garantida, se cuida da saúde, a diversidade é valorizada, a natureza é restaurada, a justiça é honrada e as comunidades abraçam sua solidão e seus medos.(…) Queremos gritar ao mundo em nome da fraternidade: Não mais a guerra! É a paz, a justiça, a igualdade a guiar o destino de toda a humanidade. Não ao medo, não à violência sexual e doméstica! Cessem os conflitos armados. Digamos basta às armas nucleares e às minas terrestres. Basta de migrações forçadas, limpeza étnica, ditaduras, corrupção e escravidão (…). Encorajemos os países a promover esforços conjuntos para criar uma sociedade de paz, como por exemplo, instituindo Ministérios para a paz.
Empenhemo-nos em limpar a terra manchada pelo sangue da violência e do ódio, pelas desigualdades sociais e pela corrupção do coração. Ao ódio respondamos com amor. (…). Juntos, queremos construir uma fraternidade ambiental, fazer as pazes com a natureza, reconhecendo que “tudo está em relação”: o destino do mundo, o cuidado da criação, a harmonia da natureza e estilos de vida sustentáveis (…). Que nossos filhos, nosso futuro possam prosperar em um mundo de paz, justiça e igualdade, em benefício da única família humana: só a fraternidade cria humanidade’.
O gesto simbólico mais eloquente foi o ‘Abraço da Paz’, dado por jovens com t-shirts com bandeiras do mundo inteiro, um sinal concreto de fraternidade, em sintonia com cordões humanos formados em diversas praças do mundo.
A partir da sua cama de hospital, o Papa Francisco publicou no twitter: ‘O futuro da família humana num mundo globalizado passa pelo caminho da fraternidade e da amizade social’.