LUSOFONIAS – Rota dos Moinhos de Jancido

Tony Neves, em Roma

Nasci e cresci no campo. A casa agrícola da família ainda tinha os animais no rés do chão e as pessoas a morar no primeiro andar. Habituei-me, desde criança, a trabalhar na agricultura. Sei fazer quase tudo e, por isso, as minhas passagens pela aldeia natal são quase sempre agrícolas. Gosto de pegar numa enxada ou numa foice, cuidar dos animais, subir às árvores para apanhar fruta, participar nas colheitas de milho ou nas vindimas. Nunca senti que o meu trabalho em criança merecesse o título de ‘trabalho infantil’, pois os meus pais tiveram sempre a preocupação de me mandar à escola, à Igreja, ao futebol, havendo sempre muito tempo para recreio e diversão, quer com os irmãos e primos quer com o resto da vizinhança, pois a aldeia era uma grande família.

Tudo isto a propósito da ‘Rota dos Moinhos de Jancido’ – assim se chama a minha pacata aldeia, no concelho de Gondomar. Muitos dos terrenos mais férteis estavam nas margens do Rio Sousa, onde tantas vezes fui semear, sachar, mondar, regar, tirar o pendão e as espigas ao milho que ali cultivávamos. Ou então semear o azevém para pasto ou tratar os calondros para confeitarias. Estes campos cultivados junto ao Rio Sousa estavam num vale fundo onde a natureza é de sonho. Mas, para fazer pão, os agricultores, além do milho, cultivavam o centeio e precisavam de moer estes cereais. Para tal, aproveitavam as nascentes do alto da colina para construir moinhos de água. Ainda me lembro de ver alguns funcionar. O mais interessante é olhar para o passado e ver como as pessoas uniam forças, as suas e as da natureza, pois nesta Rota quase todos os moinhos (e são muitos) moíam com a mesma água, estando uns quase construídos em cima dos outros.

Com o andar dos tempos, os agricultores abandonaram os campos à beira rio, deixaram que este levasse na torrente a Ponte de Longras e os moinhos foram tomados pelas silvas e outras plantas invasoras e árvores. Há alguns anos a esta parte, ‘jovens’ da minha geração (casa dos 50), decidiram pôr mãos à obra e lançaram-se na aventura – sem qualquer suporte autárquico – de reconstruir a Ponte de Longras. Depois, progrediram para a área dos Moinhos e alguns deles já estão refeitos. Não ficaram por aí, pois investiram na limpeza dos campos na margem sul do rio, construindo um percurso hoje muito palmilhado por centenas de pessoas. Sempre que vou à minha terra, percorro estes quilómetros de beleza natural. No ano passado, o povo juntou-se e plantou centenas de árvores e arbustos ‘indígenas’: carvalhos, freixos, azevinhos…, numa aposta ecológica que empenhou muita gente.

Há muito ainda a fazer para que a cidadania responsável tome conta de todas as pessoas em todas as comunidades. Os desafios ecológicos são enormes e a natureza tem de ser protegida e amada. Os trabalhos de ‘ecologia integral’ – como eu lhes chamo – continuam, com os voluntários a limpar cada vez mais território e com mais árvores a ser plantadas e cuidadas, evitando assim os incêndios e tornando a natureza mais bela e para usufruir de forma saudável. Para mim estava reservado um ‘Freixo’ que plantei mesmo junto à Ponte de Longras, encostadinho às águas do Sousa que, na época das cheias, tomaram conta de todo o vale. Foi apenas um sinal que quis amplificar nas redes sociais, como prova da minha gratidão por este trabalho voluntário e como sinal da minha adesão total a todas as iniciativas que apostem numa ecologia integral.

Ali, naquelas margens do Sousa, pessoas e natureza estão unidas. E dá gosto olhar para os rostos de quem por ali passeia, pois lê-se neles a alegria de cuidar da sua saúde, enchendo os olhos e o coração da beleza de uma paisagem de sonho.

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Agência ECCLESIA

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