LUSOFONIAS – Pentecostes com docilidade

Tony Neves, em Roma

O calendário cristão tem muitas festas, mas há três que ultrapassam todas as outras em solenidade: a Páscoa, o Natal e o Pentecostes. Celebramos estes dias a descida do Espírito Santo e, com ela, o dia número um da Igreja.

Ao longo da  história, muita tinta já correu sobre o Espírito Santo e a sua Missão. Quando o Papa João Paulo II escreveu ‘A Missão de Cristo Redentor’, um grande documento missionário, chamou ao Espírito Santo o ‘protagonista da Missão’. Ora, o papa Francisco, na audiência que concedeu aos Espiritanos, a 8 de maio, no Vaticano, fez esta citação e pediu a esta Família Missionária que fosse ‘dócil ao Espírito Santo’, fazendo jus ao seu nome, à sua história e à sua espiritualidade.

As palavras do Papa, neste encontro feliz, não foram de ocasião. Pelo contrário, o Papa Francisco fez-nos uma catequese magnífica sobre os desafios da Missão hoje e lançou-nos, sem extintores, para o meio da fogueira do Espírito. Repego em algumas das suas propostas mais radicais e exigentes: ‘gostaria de tomar como ponto de partida, para uma breve reflexão, a passagem do profeta Isaías que escolhestes como guia na vossa Congregação: “Vejam, vou fazer algo de novo” (43,19). É uma expressão muito bonita, e faz parte de um texto que começa: “Não temas [Israel], porque eu te resgatei, chamei-te pelo teu nome, tu pertences-me” (Is 43,1). Quando ouço isto, vem-me à mente a mão de Deus que acaricia, acaricia o povo, acaricia cada um de vós: o Deus terno que acaricia sempre. Detenho-me nestas palavras porque me parecem refletir muito bem alguns dos valores fundamentais do vosso carisma: a coragem, a abertura e o abandono à ação do Espírito para que Ele faça algo de novo’.

O Papa Francisco evocou os grandes momentos da história dos Espiritanos e, mais adiante, disse: ‘ vemos que a Providência recompensou a sua generosa e corajosa docilidade ao Espírito: estais presentes em sessenta países dos cinco continentes, com cerca de dois mil e seiscentos religiosos e o envolvimento de muitos leigos. Graças à vossa disponibilidade para a mudança e à vossa perseverança, permanecestes fiéis ao espírito das vossas origens: evangelizar os pobres, aceitar missões onde ninguém quer ir, favorecer o serviço aos mais abandonados, respeitar os povos e as culturas, formar o clero e os leigos locais para o desenvolvimento humano integral, tudo em fraternidade e simplicidade de vida e na assiduidade da oração. Por favor, esta última coisa é importante: rezem, não deixem de rezar. E não apenas a oração formal, não, rezar! Rezem de verdade! Realizai assim aquilo a que o Venerável Libermann chamava “união prática” no serviço, fruto da docilidade habitual ao Espírito Santo e fundamento de toda a missão’.

Mas há caminhos que os novos tempos apontam, sendo urgente percorre-los com lucidez e coragem. O estímulo vem do Papa: ‘O vosso carisma, aberto e respeitoso, é particularmente precioso hoje, num mundo onde o desafio da interculturalidade e da inclusão é vivo e urgente, dentro e fora da Igreja. Por isso vos digo: não renuncieis à vossa coragem e liberdade interior, cultivai-a e fazei dela um traço vivo do vosso apostolado. Há tantos homens e mulheres que ainda precisam do Evangelho, não só nas chamadas “terras de missão”, mas também no velho e cansado Ocidente. Olhai para cada um com os olhos de Jesus, que deseja ir ao encontro de todos – de todos! Não o esqueçais: todos – aproximando-se especialmente dos mais pobres, tocando-os com as suas mãos, fixando o seu olhar no deles. E para levar a cada um o sopro refrescante e vital do seu Espírito, que é o verdadeiro “protagonista da missão” (cf. S. João Paulo II, Enc. Redemptoris Missio, 30), deixai-vos guiar por Ele, porque “não há maior liberdade do que a de se deixar conduzir pelo Espírito, renunciando a calcular e a controlar tudo” (Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, 280). Deixai que Ele vos ilumine, vos dirija, vos impulsione para onde quiser, sem pôr condições, sem excluir ninguém, porque é Ele que sabe o que é necessário em cada época e em cada momento (cf. ibid.)’.

É Pentecostes hoje. Mais uma vez e sempre. O Espírito, que sopra quando quer, onde quer e como quer, não deixa ninguém indiferente nem de braços cruzados. Impele à Missão, dá força, estimula, ilumina, inspira. Não dá margem para o ‘sempre se fez assim’ nem para o ‘está tudo perdido, não há nada que possa salvar a história!’. Pelo contrário, com a força do Espírito seremos todos mais ousados, sem fronteiras, solidários numa Missão que ajuda a construir, com discernimento e compromisso, um mundo mais humano, mais fraterno e mais cristão, com corações a bater sempre ao ritmo do Evangelho.

Um Santo Pentecostes, com a força, a coragem e a inspiração do Espírito que dá a Vida e Luz.

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