Tony Neves, no Vaticano
Há sonhos de menino que levam tempo a ganhar corpo. Este era um deles: cumprimentar o Papa e até trocar com ele algumas palavras. Aconteceu hoje, uma segunda feira que é o primeiro dia do resto da minha vida. Os Espiritanos celebram os 175 anos da fusão das duas Congregações que estão na sua origem. Explicando em duas penadas: em 1703, Cláudio Poullart des Places lançou a Congregação do Espírito Santo. Em 1842, Francisco Libermann deu origem à Sociedade do Imaculado Coração de Maria. Em 1848, estas duas famílias fundiram-se e legaram à história a Congregação que somos hoje. O título completo é pomposo: Congregação do Espírito Santo sob a proteção do Imaculado Coração de Maria. Mas nós simplificamos: somos os Missionários Espiritanos. Assim, é só fazer as contas: 2023-1848 dá 175 anos de missão intensa, agora a concretizar-se em 60 países dos cinco continentes!
Com este magnífico pretexto fornecido pelo calendário e pela história, o Papa Francisco recebeu, em audiência privada, o Conselho Geral da Congregação, acompanhado por todos os Espiritanos que trabalham ou estudam em Itália. Tudo somado, quase meia centena, pois a Casa Geral tem uma quinzena, de passagem para reuniões e outras boas razões está uma dezena, em estudos há uma dúzia, a que se juntam a dezena de Espiritanos que trabalham em Paróquias e outras missões nas periferias de Roma e Turim.
Devida e protocolarmente bem equipados, rumamos ao Vaticano e esperamos sentados pela chegada do Papa Francisco. Uma calorosa salva de palmas marcou a entrada do Papa na Sala das Audiências. Gostamos muito de ver o seu rosto feliz e sorridente e todos nos sentimos em casa, como família. O protocolo foi seguido com rigor, como convém nestes eventos. O Superior Geral da Congregação, o P. Alain Mayama, saudou o Papa e apresentou-lhe esta família missionária. Insistiu na narrativa da nossa história de dedicação missionária aos mais pobres e, falando da missão atual, mostrou a sintonia com as perspetivas missionárias do Papa Francisco assentes nos grandes documentos ‘A Alegria do Evangelho’, ‘Laudato Si’ e ‘Fratelli Tutti’.
Depois, o Papa saudou-nos e leu um discurso todo ele cheio de Missão e de incentivo a sermos Igreja sinodal, sempre em saída na direção das periferias e margens, lá onde os pobres esperam o nosso abraço e o consolo e luz da Palavra de Deus. Disse: ‘Coragem, abertura e abandono à ação do Espírito são alguns dos valores fundamentais do vosso carisma’. Insistiu na importância da oração: ‘por favor, a oração é muito importante: rezar. Não abandonar a oração. E não só a oração formal, não! Rezar! Rezar seriamente, realizando o que o P. Libermann chamava a ‘união prática’ no serviço, fruto de uma docilidade contínua ao Espírito Santo e fundamento de toda a Missão’. Pediu para os Espiritanos a especial proteção de Maria: ‘Que a Senhora vos acompanhe!’. E terminou, como sempre, com um pedido: ‘Não se esqueçam de rezar por mim. Sempre!’
Depois, vieram os cumprimentos pessoais, um momento muito esperado com expectativa e realizado com emoção, até porque guardamos uma foto para o nosso álbum especial e para larga divulgação nas redes sociais. Tive a alegria de lhe oferecer, em mãos, o jornal ‘Ação Missionária’ de março, com um dossier dedicado aos dez anos do pontificado do papa Francisco. Quando lho ofereci, depois de me apresentar como português, ele respondeu sorrindo: ‘obrigado’. Depois, expliquei que toda a imprensa missionária portuguesa publicou este artigo a salientar a dimensão missionária do seu pontificado. A resposta foi rápida: ‘Que Deus a todos abençoe!’. No fim, despedi-me, dizendo que estaria nas Jornadas Mundiais da Juventude. Ele respondeu, em sinal de despedida: ‘então, até Lisboa!’.
O último momento foi particularmente feliz, pois ele deslocou-se até nós para fazermos uma foto coletiva que ficará para a nossa história. Sempre sorridente, apesar das evidentes dificuldades de locomoção. Depois da foto e de uma enorme salva de palmas, ele deixou a belíssima e histórica ‘Sala del Concistorio’, no Palácio Pontifício, onde fomos recebidos nesta audiência papal.
Regressamos a casa felizes e empurrados para a Missão que se torna cada vez mais urgente e actual. Ainda ecoam nos meus ouvidos e guardadas no coração as palavras do Papa: ‘o vosso carisma, aberto e respeitador, é particularmente precioso hoje, num mundo em que o desafio da interculturalidade e da inclusão é vivo e urgente, dentro e fora da Igreja. Por isso vos digo: não renunciem à vossa coragem e à vossa liberdade interior, cultivai-as e que eles sejam a imagem de marca do vosso apostolado’.