LUSOFONIAS – Obrigado D. Abílio Ribas!

Tony Neves, em Roma

D. Abílio Ribas foi um grande missionário em três frentes: Portugal (no início e fim da sua vida), Angola e S. Tomé e Príncipe. Guardo dele a aliança perfeita que ele sempre conseguiu fazer entre uma inteligência fulgurante e uma simplicidade de vida à prova de tudo.

Confesso que o conheci já ele estava nomeado Bispo de S. Tomé e Príncipe. Visitou-nos nesses dias,  na Casa da Filosofia dos Espiritanos, em Braga, onde eu era um jovem estudante. Cativou-me a sua alegria e estilo de relação simples, a ponto de termos feito uma rábula a brincar com duas características da sua personalidade, confidenciadas pelo P. José Castro, seu amigo de longa data e aventuras dramáticas: oferecemos ao recem-nomeado Bispo uma mitra de cartolina presa a um fio (porque D. Ribas era uma pessoa muito distraída!) e um poste de electricidade como báculo (para simbolizar um bispo muito enérgico!). Ficamos todos felizes porque ele foi quem mais se divertiu!

Mas avancemos. Este homem de Deus nasceu nas montanhas do Soajo, Viana, há 94 anos. Entrou no Seminário de Godim, na Régua, quando já tinha 13 anos. Professou como Espiritano em 1953 e foi Ordenado Padre em 1957. Sofreu um grande choque em 1970 quando o seu irmão António, também Padre Espiritano, morreu num acidente na Silva, em Barcelos, quando o carro onde seguiam Espiritanos foi abalroado pelo comboio na passagem de nível sem guarda.

O P. Abílio trabalhou em Angola de 1959 até 1984, vivendo os complicados tempos do fim da guerra colonial, aguentando as consequências do marxismo-leninismo agressivo do pós-independência e sendo uma das vítimas da guerra civil, pois ficaria gravemente ferido na sequência de uma mina que fez explodir, a 1 de junho de 1980, o carro onde seguia, num acidente que vitimou igualmente os Padres José Castro e Manuel Gonçalves.

Sempre muito discreto, mas eficiente, exerceu cargos de enorme responsabilidade como Superior dos Espiritanos em Angola (de 1973 a 1977) Reitor dos Seminários Maiores de Luanda (1967-1973) e do Huambo (1980-1982), bem como último Diretor da Rádio Ecclesia, até à sua nacionalização e confiscação em 1978. Seria ainda Secretário da Conferência Episcopal e da Caritas, sendo surpreendido com a nomeação para Bispo de S. Tomé e Príncipe, a 21 de dezembro de 1984.

As Ilhas Verdes tiveram-no como primeiro Bispo residente a ali se dedicou de alma e coração. O seu discurso de entrada foi avaliado por D. José Cordeiro (Arcebispo de Braga), na homilia do funeral, como o de um precursor da sinodalidade tão falada hoje. De facto, D. Abílio Ribas apresentou-se assim ao povo santomense: ‘Irmãos caríssimos, eis-me aqui: eis o vosso Bispo! Aceitai-o. Ele vem em nome do Senhor. Aceitai-o tal como ele é: com suas fraquezas físicas, intelectuais e espirituais … Não trago planos de trabalho pré-fabricados. A minha ação aqui será traçada convosco para que resulte no máximo proveito para vós. Convosco, com os abnegados missionários (as) que há tantos anos aqui trabalham, faremos um plano de ação de onde a pastoral familiar, juvenil, catequética, vocacional seja continuada e, se possível, reforçada. Tudo convosco e para vós…”  A verdade é que o dia 24 de fevereiro de 1985 ficou registado na história de S. Tomé e Príncipe como data significativa: pela primeira vez, ali se ordenou um Bispo!

Encontrei-o a primeira vez em S. Tomé quando, ido de Luanda, em 1992, acompanhei o Papa João Paulo II na primeira visita de um Papa a S. Tomé. Visitei-o, mais tarde, em março de 2001 para fazer uma reportagem e preparar o Projeto Ponte dos Jovens Sem Fronteiras. Ali viveria um intenso mês de Agosto, com uma quinzena de JSF, divididos entre Ribeira Afonso e a cidade capital. D. Ribas foi incansável no acolhimento e inexcedível na simpatia. Ficamos ligados o resto da vida.

Aos 75 anos foi dispensado da animação da Diocese, mas a sua Missão continuou intensa e feliz. Quis regressar à vida fraterna em comunidade e foi nomeado, em 2006, para Viana do Castelo. Assim, podia apoiar a sua família e paróquia no Soajo e colaborar na pastoral do Santuário de S. Bento da Porta Aberta.

A sua saúde foi ficando mais frágil e, por isso, foi nomeado em 2015 para a Comunidade do Fraião, em Braga, beneficiando até à morte, a 2 de fevereiro, dos cuidados do Lar Anima Una, tão apreciados e elogiados por si.

Sempre que posso, visito o Lar Anima Una. O abraço e o sorriso de D. Ribas foram uma constante. Tive a alegria de ainda receber um vídeo com a sua mensagem de Natal. Quase não dava para perceber, mas o sorriso e a amizade foram até ao fim.

Obrigado! Deus, certamente, o abraçou e recompensou. Reze por nós!

Tony Neves, em Roma

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