LUSOFONIAS – O Sínodo não acabou, começa agora!

Tony Neves, em Roma

O Papa encerrou a Assembleia Sinodal (26.10) e, na sua intervenção, fez uma síntese do documento final e, sobretudo, do caminho a fazer. Começou por dizer que não será publicada nenhuma Exortação Apostólica, ou seja, o documento final é assumido como texto do Magistério e será aplicado assim. O Papa reconhece que o caminho sinodal realizado foi importante e tem que ser valorizado. Lembrou que Cristo nos chama a ser testemunhas do Evangelho mais com a vida do que com palavras. Há que abrir portas sem levantar muros. É preciso reconhecer que todos somos necessitados de misericórdia e, por essa razão, não podemos ser rígidos. A rigidez é um pecado. Em tempos de guerra, é preciso testemunhar a paz. O Papa divulgou ainda a notícia de que há dez grupos de estudo a trabalhar temas que implicam um aprofundamento. Parece-me bem, pois há que continuar a amadurecer os frutos desta árvore sinodal e tal exige tempo, reflexão, oração. De qualquer modo, registei com agrado a promessa do Papa não adiar infinitamente as decisões corajosas que é preciso tomar. Por isso aguardo, aguardo.

O Papa cita Madeleine Delbrel, poetisa, mística e ensaísta francesa, proclamada Venerável em 2018, que nos deixou 17 tomos de escritos com as suas obras. Ela escreveu: ‘há lugares onde o Espírito sopra, mas há um Espírito que sopra em todos os lugares’.

Olhemos o Documento Final. Destaco a inspiração em textos de Páscoa e um apelo muito forte à conversão. ‘Conversão’ das relações, dos processos e dos vínculos. Destaco o maior protagonismo dos leigos, particularmente das Mulheres na vida e na missão da Igreja, a todos os níveis. Destaco a importância dada a uma melhor articulação dos processos de decisão, o que implica coisas complicadas como a transparência, a prestação de contas e a avaliação. Destaco ainda a obrigação dos Dicastérios Romanos fazer amplas consultas antes de publicarem documentos importantes. Destaco a abertura e a misericórdia como imagens de marca da Igreja para ‘’todos, todos, todos’. O Papa continua a insistir na opção pelos mais pobres, o que implica a atenção aos mais frágeis. Há, por isso, um reforço da cultura da proteção dos menores e adultos vulneráveis. Há uma aposta forte nos valores impressos na doutrina social da Igreja. Destaco a dimensão ecuménica, o diálogo inter-religioso e intercultural, a insistência na importância de documentos como a Laudato si, a Fratelli tutti, o Documento de Abu Dhabi sobre a Fraternidade Humana… Há ainda, enfim, as mudanças pedidas para uma formação mais integral dos futuros padres e outros agentes de pastoral. Tudo isto joga a favor de uma Igreja sinodal missionária.

Abre-se um tempo de profundas mudanças. E acho que, após este Sínodo, há boas condições para que a Igreja seja mais feliz e mais aberta, acolhedora, fraterna, solidária, comprometida com o anúncio do Evangelho, sabendo nós que a missão constrói ou ajuda a construir uma nova humanidade. Espero uma Igreja mais sinodal, ou seja, em que as decisões são ponderadas por todos, em que o diálogo é a palavra-chave, a par da conversão (conversão das relações, dos processos, dos vínculos), uma Igreja com um rosto mais feminino e mais laical, um presbiterado com uma formação mais aberta e um rosto mais plural, uma Igreja mais credível, porque mais segura, uma Igreja mais comprometida na busca da paz e da fraternidade, através do diálogo, da oração, da reconciliação pela justiça, pela partilha solidária. Finalmente, eu quero uma Igreja mais plural, uma Igreja que capitaliza a riqueza da diversidade de pessoas, povos e culturas que a compõem, por isso, uma Igreja mais missionária.

O meu balanço final da caminhada eclesial feita até agora é muito positivo, pois valorizou as dinâmicas sinodais da conversação no Espírito, da escuta e discernimento dos caminhos decisivos para o presente e o futuro da Igreja. Não se quer construir uma Igreja de eventos, mas sobretudo uma Igreja de processos. Eu acho que houve sensibilidade e bom senso ao evitar fraturas precoces e isso nota-se no facto dos temas mais fraturantes continuarem a ser aprofundados em comissões especializadas.

Na Missa de encerramento, o Papa pediu uma Igreja de pé (não sentada!), uma Igreja que acolhe os gritos da humanidade (não uma Igreja surda!) e, sobretudo, uma Igreja que caminha com Cristo pelas estradas do mundo, ou seja, uma Igreja missionária. Termino com D. Gabriel Mbilingi, arcebispo do Lubango, que disse: ‘o Sínodo não acabou. O Sínodo começa agora!’. Eu estou completamente convencido disso. Faço minhas estas palavras.

Tony Neves, em Roma

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Agência ECCLESIA

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