LUSOFONIAS O ‘Amou-te’ do Papa Leão

Tony Neves, em Roma

Foto. Tony Neves

‘Amou-te!’ (‘Dilexi te’), sobre o amor para com os pobres – quase todos os sabemos já -, é a 1ª Exortação Apostólica do Papa Leão XIV, mesmo que esteja afirmado que quem teve a ideia e traçou as traves-mestras do documento foi o Papa Francisco. Já este Papa tinha feito o mesmo com Bento XVI, também publicando ‘A Luz da Fé’ (‘Lumen Fidei’), a  29 de junho de 2013.

Quando um Papa publica um documento corre sempre muita tinta nos media tradicionais, nas redes sociais e conversas cruzadas. Se se trata do primeiro, então as ondas são mais altas e bravas e a espuma leva mais tempo a dissolver-se nas águas! ‘Dilexi te’ foi regra, não exceção. Por isso, depois de ter lido e ter sido confrontado com reações e reflexões para todos os gostos, só agora ganhei coragem (e alguma distância) para escrever algo sobre esta Exortação Apostólica.

Este meu comentário é para me convencer a não fazer nenhum comentário! Ou seja, limito-me a apresentar recortes do documento, propondo-os à reflexão livre de quem me ouve ou lê. Aí vão eles:

‘Estou convencido de que a opção preferencial pelos pobres gera uma renovação extraordinária tanto na Igreja como na sociedade, quando somos capazes de nos libertar da autorreferencialidade e conseguimos ouvir o seu clamor’ (nº7). ‘A condição dos pobres representa um grito que, na história da humanidade, interpela constantemente a nossa vida, as nossas sociedades, os sistemas políticos e económicos e, sobretudo, a Igreja’ (nº9). ’É de louvar que as Nações Unidas tenham colocado a erradicação da pobreza como um dos objetivos do Milénio’ (nº10). ’Preocupam-nos, de modo particular, as graves condições em que vivem muitíssimas pessoas devido à escassez de alimentos e água potável. Todos os dias morrem milhares de pessoas por causas relacionadas com a desnutrição’ (nº12). ‘A Igreja, se deseja ser de Cristo, deve ser Igreja das Bem-Aventuranças, Igreja que dá vez aos pequeninos e caminha pobre com os pobres, lugar onde os pobres têm um espaço privilegiado’ (nº21). ‘O apelo do Senhor à misericórdia para com os pobres encontrou a sua máxima expressão na grande parábola do juízo final, que é também uma representação gráfica da bem-aventurança dos misericordiosos’ (nº28). ‘Quando perguntaram ao Diácono S. Lourenço onde estavam os tesouros da Igreja, trouxe consigo, no dia seguinte, os pobres: ‘estes são os tesouros da Igreja!’(nº38). Para S. João Crisóstomo, ‘a caridade não é uma via opcional, mas o critério do verdadeiro culto’ (nº42). ‘Santo Agostinho via no cuidado dos pobres uma prova concreta da sinceridade da fé’ (nº45). ‘No gesto de limpar uma ferida (aos doentes), a Igreja proclama que o Reino de Deus começa entre os mais vulneráveis’ (nº52). ‘O trabalho silencioso dos beneditinos foi fermento de uma nova civilização, onde os pobres não eram um problema a resolver, mas irmãos e irmãs a acolher’ (nº56). ‘A tradição monástica ensina, portanto, que oração e caridade, silêncio e serviço, celas e hospitais, formam um único tecido espiritual’ (nº58). ‘Quando a Igreja se inclina para quebrar as novas correntes que prendem os pobres, ela torna-se sinal da Páscoa’ (nº61). ‘Francisco não fundou um serviço social, mas uma fraternidade evangélica’ (nº64). ‘As Ordens Mendicantes foram, assim, resposta viva à exclusão e à indiferença’ (nº67). ‘A educação dos pobres, para a fé cristã, não é um favor, mas um dever’ (nº72). ‘A resposta ao desafio colocado pelas migrações contemporâneas pode-se resumir em quatro verbos: acolher, proteger, promover e integrar’ (nº75). ‘A Igreja, como mãe, caminha com os que caminham. Onde o mundo vê ameaça, ela vê filhos; onde se erguem muros, ela constrói pontes’ (nº75). Paulo VI, na 2ª sessão do Vaticano II: ‘A Igreja olha com particular interesse para os pobres, necessitados, aflitos, famintos, que sofrem, encarcerados, que têm fome’ (nº85). ‘A caridade é uma força que muda a realidade, um autêntico poder histórico de transformação’ (nº91). ‘É necessário mudar a ditadura de uma economia que mata’ (nº92). ‘Tanto o anúncio como a experiência cristã tendem a provocar consequências sociais. Procuremos o seu Reino’ (nº97). ‘O cuidado com os pobres faz parte da grande Tradição da Igreja, como um farol de luz que, a partir do Evangelho, iluminou os corações e os passos dos cristãos de todos os tempos’ (nº103). ‘Para nós, cristãos, a questão dos pobres remete-nos à essência da nossa Fé’ (nº110).’Por sua natureza, o amor cristão é profético, realiza milagres, não tem limites: é para o impossível’ (nº120).

A provocação está feita. Há que aprofundar e tentar viver os valores gravados nas páginas deste primeiro documento pastoral do Papa Leão. Fica o desafio.

Tony Neves, em Roma

(Os artigos de opinião publicados na secção ‘Opinião’ e ‘Rubricas’ do portal da Agência Ecclesia são da responsabilidade de quem os assina e vinculam apenas os seus autores.)

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