LUSOFONIAS – Natal Vaticano

Tony Neves

Há 103 Presépios expostos no Vaticano. Uma centena está à sombra da Colunata de Bernini. Outro está na Sala Paulo VI, feito por jovens de Pádua. Um outro, ocupa  o lugar do costume ao fundo da Basílica de S. Pedro. O grande, vindo directamente do Peru, está ao ar livre, a ocupar o meio da Praça. Quem andar por Roma por estes tempos não pode perder a riqueza de tanta diversidade e a força simbólica da representação do nascimento de Jesus.

No Natal do Vaticano, a tradição ainda é o que era. Basta entrar na Praça para os olhos se encherem com o verde da enorme árvore de natal, vinda este ano das florestas a norte das terras por onde andou, viveu, morreu e se imortalizou Santo António. É um abeto trazido dos bosques de Andalo, no Trentino. Enorme, desafia os céus e faz concorrência ao obelisco que ocupa o ponto central da grande praça vaticana. As opiniões de quem o olham são divergentes: ‘ai, ai, andam a deitar árvores abaixo!’, ‘que beleza, temos que voltar aqui à noite para ver a iluminação!’. Também se escuta quem sai em defesa: ‘ É tudo muito ‘laudato si’, pois a árvore é retirada de florestas onde é preciso devastar’.

Saí da Praça e refugiei-me nas colunatas. Há sol, mas o frio e o vento são cortantes, algo normal nesta invernia romana. ‘Presepi in Roma’, está indicado em diversas faixas pregadas nas colunas. São 100, está dito. As pessoas acotovelam-se, de tantas que são, aproveitando o sol e a aparição do Papa Francisco à janela para o Angelus do domingo. Vale a beleza e diversidade dos Presépios, mas também o espanto dos comentários. E, desta feita, nem sequer são as numerosas crianças quem mais reage: ‘olha este presépio dos bombeiros!’. Sim, é um dos mais originais, pois está construído dentro de uma bomba de água de combate a incêndios. ‘E este aqui da ATAC !’- reacção à parte da frente de um autocarro dos transportes públicos de Roma, também ele transformado num presépio. Há-os para todos os gostos, estilos, tamanhos e materiais. À saída está um cartaz enorme com um pedido do papa Francisco: ‘Espero que esta tradição do Presépio não acabe nunca!’.

Mas o coração da Praça está ocupada com o Presépio que veio das montanhas do Peru. Pretende celebrar os 200 anos da independência deste país Andino. Levou dias e dias a construir, trabalho que fui acompanhando nas várias vezes que por ali passei. Foi inaugurado na sexta feira, 10 de dezembro. Veio da aldeia de Chopoca que fica no departamento de Huancavelica, frase multiplicada a toda a volta da estrutura do presépio.

Olha-lo dá uma sensação de equilíbrio e de coerência. Parece que mudamos de terra e caímos no mundo que o Papa Francisco descreveu na encíclica Laudato Si, propondo uma comunhão entre pessoas e natureza, numa vivência de fraternidade global, onde tudo está interligado. De facto, na paisagem que se impõe aos olhos de quem visita o presépio, estão as pessoas (todas com rostos e trajos das montanhas andinas), os animais (com especial lugar para a grande águia e os lamas), e a vegetação. Tudo muito estético, harmonioso e fraterno. Valem também os comentários: ‘olha, mãe, até o S. José e Nossa Senhora são índios!’… ‘Os Magos vieram de lamas. Não deviam vir de camelos?!’…’Vejo aquele pássaro grande e lembro-me logo da canção ‘el condor pasa!’… Segundo informação oficial, as figuras do Presépio foram feitas em tamanho natural, a partir de materiais como cerâmica, madeiras locais e fibra de vidro.

O Papa Francisco, na inauguração, pediu que o mundo não se deixe poluir pelo consumismo nem pela indiferença que mata. E disse: ‘A árvore e o presépio apresentam-nos a atmosfera típica do Natal que faz parte do património das nossas comunidades: uma atmosfera de ternura, partilha e intimidade familiar. Não vamos viver um Natal falso e comercial! Deixemo-nos envolver pela proximidade de Deus, pela atmosfera natalícia que a arte, a música, as canções e as tradições trazem aos nossos corações’. Mas o Papa lançou um desafio: ‘Deus vem para estar connosco e pede-nos para cuidarmos dos nossos irmãos e irmãs, especialmente dos mais pobres, mais fracos e mais frágeis, a quem a pandemia ameaça marginalizar ainda mais. Pois foi assim que Jesus veio ao mundo e o presépio lembra-nos disso’.

Todos estes Presépios e a Árvore estarão expostos até à Solenidade do Baptismo de Jesus, 9 de janeiro, data oficial do fim do tempo do Natal. São de visita obrigatória a quem andar por estas paragens romanas. Desejo a quantos me leem e ouvem um Santo e inspirado Natal.

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Agência ECCLESIA

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