Tony Neves, no Paraguai
A Missão Espiritana no Paraguai começou em Lima, há mais de 50 anos, lá bem no interior do país, em contexto rural, onde quase só falavam (e ainda falam) o guarani. Com o andar dos tempos, esta missão internacional foi aumentando em número de missionários e de locais de Missão. A preocupação com ganhar um rosto guarani levou a um esforço de pastoral vocacional que faz com que hoje haja dois Padres, um Irmão paraguaios e diversos jovens em formação.
A minha visita começou com um dia de formação aos Noviços Espiritanos da América Latina. Este ano especial que marca a entrada numa Congregação Religiosa está a acontecer na Casa de Formação Espiritana, em Reducto, Diocese de San Lorenzo, cidade periférica da Capital Assunção. O Responsável desta etapa formativa é o Irmão Mariano Espinoza, um Espiritano paraguaio que tem uma longa experiência de Missão nos campos de refugiados na Tanzânia. Os oito Noviços vieram do Brasil (5), Paraguai (2) e México, com percursos muito diferenciados, quanto às idades, às formações académicas e trabalhos já realizados. Foi um sábado muito rico, com reflexões partilhadas sobre a Missão Espiritana hoje, à luz dos documentos mais actuais da Igreja e da Congregação.
Tive a oportunidade de acompanhar o P. José Costa, português de Lordelo – Paredes, pároco de Virgen del Rosario, a algumas das comunidades que compõem a sua vasta e exigente paróquia de periferia. Visitei o Centro Pastoral, um projecto Sol Sem Fronteiras, onde estava a decorrer um encontro de famílias. Também ali aconteceu algo de original: alguns cabeleireiros da região aceitaram oferecer uma tarde de voluntariado, cortando o cabelo a algumas dezenas de crianças de famílias pobres. Há cursos de costura e consultas médicas. Assisti ao lançamento dos ‘alcoólicos anónimos’, iniciativa que visa combater uma das maiores pragas do país, o consumo exagerado de álcool. Pude, igualmente, acompanhar o P. José Costa na visita a uma família para acertar a ida de um jovem dependente de droga para um centro de recuperação criado e liderado pelos franciscanos. Deu para entender que fora do asfalto há muito pobreza escondida debaixo das árvores que tomam conta da paisagem desta periferia da capital. Este é um aspecto bonito destas terras: desde há muito que é proibido cortar árvores, medida ecológica que ajuda a proteger as pessoas na estação quente, de autêntica canícula, onde as temperaturas se podem aproximar dos 50º! O lado menos bom desta política ecológica é que, atendendo às frequentes tempestades, caem muitas árvores ou galhos destruindo os fios da electricidade que povoam as ruas, de poste em poste, retirando a energia a muitas famílias.
As visitas às famílias e às comunidades mostram um rosto muito querido deste povo que fala guarani: faz parte do bom acolhimento a oferta de comida e bebidas tradicionais. Se, em família, é comum beber de manhã o mate (chá quente, feito com ervas aromáticas) e o téréré à tarde (chá gelado), há muitas outras comidas e bebidas típicas que se oferecem a quem visita ou se reúne. Mas há que dar atenção aos nomes: o cozido é uma bebida doce; a tchipa é uma espécie de pão de queijo; a sopa paraguaia também é uma comida sólida; as empanadas são uma espécie de croquetes que podem ter carne, peixe, queijo… Como é um povo que gosta de se reunir e festejar, são típicos os churrascos e as ‘comilonas’, ou seja, a organização de refeições para congregar as pessoas ou para vender a comida como take away.
Momento forte foi a Assembleia anual do Grupo Espiritano, em Assunção. Foram três dias intensos de formação, partilha e confraternização. São 12, originários do Paraguai, Portugal, Nigéria, Serra Leoa, Cabo Verde, Angola, México e República Democrática do Congo. O mais antigo ali é o P. Victor Oliveira, de Ribeira de Pena, chegado ao mundo guarani há mais de 40 anos. Estão em cinco comunidades, seja nas periferias da capital, seja no interior do país, lá onde a pobreza é mais dura e onde trabalhar pela defesa dos direitos humanos é exigência quotidiana.
O Bispo de S. Pedro, dom Pedro Jubinville, Espiritano canadiano, numa intervenção na Assembleia, disse que os missionários no Paraguai vivem num tempo entusiasmante se se deixarem provocar, mobilizar e comprometer.