Lusofonias: Angola… com Miguel Torga!

Tony Neves

Miguel Torga, escritor e médico, visitou Angola em 1973, já às portas de uma ‘independência’ que, naquela época era palavra proibida. Em Luanda, viu e denunciou, no seu Diário XII, o contraste gritante entre os brancos ricos e remediados e os angolanos de origem africana que enchiam já os pobres musseques nas periferias da capital. Acabo de visitar Angola e também, como Torga, entrei por Luanda. Vi, como ele, a Baía, a Ilha, a Cidade Alta, cheia de grandes prédios e abarrotar de carros de boa cilindrada. Ali habitam os ‘mais iguais’ deste país lusófono. Também visitei o musseque do Prenda, na Senhora da Paz, onde as casas são de construção muito frágil, as ruas são caminhos estreitos de poeira (e lama quando chove!), os cheiros não evocam essências de perfumes de Paris e Nova Iorque! São pobres os que ali moram, pois, quase todos, chegaram fugidos da guerra à procura de uma tábua de salvação. Se em 1973 a diferença de cor era imagem de marca, hoje não, mas as injustiças mantêm-se, infelizmente. De qualquer forma – há que dize-lo – respira-se um ar de mais liberdade por terras de Angola, e isso dá esperança e rasga novos caminhos ao futuro deste povo.

Depois, como Miguel Torga, desci ao Lubango. A cidade fundada por madeirenses está cercada pelo santuário da Senhora do Monte e ‘abençoada’ pelo grande Cristo-Rei que se vê lá no alto da montanha. Saindo do Lubango, podemos tomar o caminho de Moçâmedes e lá encontraremos a belíssima Serra da Leba, no maciço da Chela. Podemos ir ver a magnífica e amedrontadora Fenda da Tundavala. Podemos rumar ao outro lado e visitar a histórica Missão da Huíla, a mãe de todas as missões do sul, onde trabalham os Espiritano e as Irmãs de S. José de Cluny. Emociona visitar o cemitério onde jazem os missionários que ali deram a vida, quase todos, em tenra idade. Assim compreenderemos o que escreveu Miguel Torga: ‘Depois do aéreo deslumbramento do maciço da Chela e do abissal fascínio da Tundavala, a rasa emoção do cemitério da Huíla. Aqui jaz… aqui jaz…aqui jaz… E são nomes de todas as nacionalidades, portugueses, belgas, franceses, alemães, inscritos lado a lado em humildes lousas iguais, seguidos de uma inscrição trágica: falecido com 24 anos, com 45, com 51, com 32…nomes de homens que vinham ao encontro da morte certa e prematura por conta de Deus e do semelhante. Por conta da Fé, da esperança e da caridade’.

Sim, estas páginas de fé continuam a escrever-se. Senti isso na Missão da Senhora das Dores, na Huíla, no Munhino… Há muitos candidatos a padres. Há comunidades vivas e felizes. Há muito investimento na educação, na saúde, no apoio social. A Missão continua em força por terras de Angola, país que tem todas as condições para oferecer dignidade e felicidade a quem por lá viva e trabalhe.

 

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Agência ECCLESIA

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