Tony Neves, em Roma
Ser líder exige carisma, mas também obriga à aquisição de competências. A arte de ir ao leme aprende-se, cultiva-se e aperfeiçoa-se. Não se pode dormir à sombra de uma nomeação, convencidos de que o Espírito Santo garante a inspiração da Missão. Tudo isto vem a propósito de mais um Encontro de Novos Superiores Espiritanos, que está a acontecer em Roma nestes dias. Vieram dos quatro cantos do mundo e foram eleitos ou nomeados. Em comum, têm o facto de serem Missionários do Espírito Santo e exercerem a responsabilidade de animar.
São complexos os tempos que vivemos e difíceis os desafios a que é necessário responder para que a missão corresponda à vontade de Deus e às urgências do presente. Basta escuta-los, um por um, para percebermos logo que há ali carismas evidentes para o exercício desta missão, mas existe também a humildade e lucidez suficientes para compreender que é preciso estudar, partilhar, aprender a ser líder com competência e coerência de vida.
O programa, preparado pelo Conselho Geral, ataca em várias linhas e direções. Basta olhar para a estrutura e as temáticas. Assim, vemos como é importante caldear a oração com a partilha, as conferências com os momentos de relaxe e confraternização, as visitas simbólicas com a leitura e interpretação de documentos. Há ainda lugar para exercícios práticos de administração e troca de experiências sobre momentos duramente críticos ou de felizes e efusivas celebrações. Há que ganhar estofo para aguentar quer os momentos de evidente vitória, bem como aqueles em que o chão parece desaparecer de debaixo dos pés de um responsável pelo bom andamento de uma família religiosa e pela concretização do projeto missionário traçado em capítulos, assembleias e outras reuniões.
Uma Congregação com mais de 300 anos tem já uma longa história para contar e muitos compromissos concretizados. Neste tempo de encontros, a memória é decisiva, pois ela põe a nu um carisma, uma instituição e, sobretudo, pessoas muito concretas. Estas, ao longo dos tempos, tiveram intuições extraordinárias e fizeram história de anúncio de Evangelho, de criação de estruturas, de dinamismos de solidariedade fraterna. Há muitas razões para dar graças a Deus por tudo quanto foi feito, mas há sobretudo a responsabilidade de ler os sinais dos tempos e, hoje, fazer o que estiver ao alcance para ajudar a construir um mundo mais humano, mais fraterno e mais cristão.
Há dados que são incontornáveis e um deles é a geografia onde a missão acontece. Quando se vive e anuncia o Evangelho num contexto de violência, pobreza extrema, injustiças gritantes, violações sistemáticas dos direitos humanos, anticlericalismo, falta de liberdade… como acontece com frequência, os missionários tentam viver e testemunhar a paz e a justiça evangélicas, apelar à reconciliação, ativar mecanismos de solidariedade e de reparação dos danos causados por estes dinamismos geradores de tragédia humana. É apenas um exemplo – contudo, extremamente doloroso – de como o ambiente molda as pessoas e condiciona a missão que ali se é chamado por Deus a fazer, enquanto membros de uma Igreja que quer fazer do mundo um espaço de felicidade e salvação, pois este é o plano de Deus.
Posso quase dizer que o mundo todo veio a Roma. Assim, chegaram missionários da Amazónia, Camarões, Congo Brazzaville, Etiópia, Guadalupe, Guiana Francesa, Haiti, Martinica, Ilha Maurícia, Nigéria, Irlanda, Senegal, Ilha Reunião, Seychelles e África do Sul. Juntaram-se aos que já cá estamos, originários dos Estados Unidos, Tanzânia, Portugal, França e Suíça.
Após encontros iniciais com apresentações de líderes e partilha de projetos missionários, foi dado um espaço largo à formação sobre liderança e animação. Ocuparam largo tempo os temas fortes da formação, da Justiça, Paz e integridade da Criação, da proteção de menores e adultos vulneráveis, do desenvolvimento, da comunicação, da vida em comunidades interculturais, da partilha de espiritualidade e missão com os Leigos, bem como dos desafios lançados pelas nomeações missionárias aos jovens confrades e às comunidades que os acolhem.
Fora de casa, o Encontro foi marcado pela participação na Audiência do Papa Francisco, na Praça de S. Pedro, bem como pela Peregrinação a Assis.
A arte de liderar implica sabedoria, formação, disponibilidade, abertura, empenho, reconciliação, diálogo, paciência e muita inspiração do Espírito Santo. Mas, sobretudo, implica serviço. Por isso, na Missa de Abertura, o Superior Geral presidiu ao rito do lava-pés a todos os novos Superiores, repetindo este gesto tão simbólico de Cristo, realizado na Última Ceia. E, claro, citou o Mestre: ‘Como Eu vos fiz, fazei vós também!’(Jo 13,15).