Celebração multiplica gestos e símbolos para assinalar passagem da morte para a vida
Lisboa, 16 abr 2022 (Ecclesia) – A Igreja Católica celebra nas últimas horas deste Sábado Santo e nas primeiras de Domingo de Páscoa o principal e mais antigo momento do ano litúrgico, a Vigília Pascal, assinalando a ressurreição de Jesus.
Esta é uma celebração mais longa do que habitual, em que são proclamadas mais passagens da Bíblia do que as três habitualmente lidas aos domingos, continuando com uma celebração batismal e a comunhão.
Nos primeiros séculos, as Igrejas do Oriente celebravam a Páscoa como os judeus, no dia 14 do mês de Nisan, ao passo que as do Ocidente a celebravam sempre ao domingo.
O Concílio de Niceia, no ano 325, apresentou prescrições sobre o prazo dentro do qual se pode celebrar a Páscoa, conforme os cálculos astronómicos (primeiro domingo depois da lua cheia que se segue ao equinócio da primavera): de 22 de março a 25 de abril.
“Até ao século V, a Vigília era noturna, depois começou progressivamente a antecipar-se para as primeiras horas de sábado”, explica à Agência ECCLESIA o padre Pedro Lourenço, diretor do Departamento de Liturgia do Patriarcado de Lisboa.
Em entrevista emitida hoje na Antena 1 da rádio pública, o especialista recordou a proibição das Missas a partir do meio-dia, dado que o jejum eucarístico começava à meia-noite anterior, que vigorou na liturgia católica.
“No Sábado Santo, aconteceu a mesma coisa”, relata, o que levou a celebração pascal a começar pelas 10 da manhã.
É estranho falarmos da noite e fazer um lucernário de manhã. Para ajudar a esta teatralização, de certo modo, até se tapavam as janelas das igrejas, para fingir que era de noite.
A manhã de sábado era preenchida pelo “Aleluia Pascal”, ficando conhecida popularmente como “Sábado de Aleluia”.
A partir de um maior “conhecimento histórico” e do desejo de “autenticidade dos ritos que celebra”, restaurou-se o que é “próprio de uma vigília”, repondo-a na noite, “inaugurando assim o dia de Páscoa, o terceiro dia do Tríduo Pascal”.
Em 1951, o Papa Pio XII mandou celebrar a Vigília Pascal de novo como nas origens, isto é, na noite do Sábado Santo para o Domingo da Páscoa; a reforma do Concílio Vaticano II (1962-1965) confirmou esta disposição.
Atualmente, é ordenado que a Vigília seja celebrada à noite, pelo menos depois que o sol se ponha, e antes do amanhecer de domingo.
“A Vigília Pascal começa com o acender da luz, a luz que brilha nas trevas, é significativo que seja já depois do pôr do sol”, destaca o padre Pedro Lourenço.
A vigília começa com um ritual do fogo e da luz que evoca a ressurreição de Jesus; o círio pascal é abençoado, antes de o presidente da celebração inscrever a primeira e a última letra do alfabeto grego (alfa e ómega), e inserir cinco grãos de incenso, em memória das cinco chagas da crucifixão de Cristo.
A inscrição das letras e do ano no círio são acompanhadas pela recitação da fórmula em latim ‘Christus heri et hodie, Principium et Finis, Alpha et Omega. Ipsius sunt tempora et sæcula. Ipsi gloria et imperium per universa æternitatis sæcula’ (Cristo ontem e hoje, princípio e fim, alfa e ómega. Dele são os tempos e os séculos. A Ele a glória e o poder por todos os séculos, eternamente).
O ‘aleluia’, suprimido no tempo da Quaresma, reaparece em vários momentos da Missa como sinal de alegria.
“A Vigília Pascal é de uma riqueza maravilhosa”, indica o diretor do Departamento de Liturgia do Patriarcado de Lisboa.
A celebração articula-se em quatro partes: a Liturgia da Luz ou “lucernário”; a Liturgia da Palavra; a Liturgia Batismal; e a Liturgia Eucarística.
O entrevistado destaca uma “perspetiva cósmica”, na passagem da escuridão para a luz, com referência a vários elementos da natureza.
A liturgia da Palavra “percorre a história da Salvação”, propondo sete leituras do Antigo Testamento, que recordam “as maravilhas de Deus na história da salvação” e duas do Novo Testamento: o anúncio da Ressurreição segundo os três Evangelhos sinópticos (Marcos, Mateus e Lucas), e a leitura apostólica sobre o Batismo cristão.
A Liturgia Batismal é parte integrante da celebração, pelo que mesmo quando não há qualquer Batismo, se faz a bênção da fonte batismal e a renovação das promessas, sublinhando uma história de salvação “concretizada” na vida da comunidade católica, destaca o padre Pedro Lourenço.
Do programa ritual consta, ainda, o canto da ladainha dos santos, a bênção da água, a aspersão de toda a assembleia com a água benta e a oração universal.
Para o liturgista, a entrada em vigor da nova edição do Missal Romano, em língua portuguesa, e a superação de várias das limitações impostas pela pandemia de Covid-19 são um convite a viver “de maneira nova” a Vigília Pascal.
O sacerdote do Patriarcado de Lisboa reconhece que muitos não participam na Vigília Pascal, por ser uma cerimónia longa, mas destaca que “perdem algo muito rico”, uma proposta de “intensidade especial”.
“A Páscoa é o coração da vida litúrgica da Igreja”, conclui.
A nota tradução do Missal entrou em vigor na última Quinta-feira Santa
OC