Lisboa: Universidade Católica Portuguesa homenageia Angela Merkel, valorizando «defesa do humanismo europeu» e «liderança fundada em valores, livre e sem medo»

Antiga chanceler da Alemanha recebeu doutoramento Honoris Causa, numa cerimónia em que defendeu que é necessário «voltar a lutar pela liberdade»

Foto: Arlindo Homem

Lisboa, 09 jul 2025 (Ecclesia) – A Universidade Católica Portuguesa atribuiu hoje o doutoramento Honoris Causa à antiga chanceler alemã Angela Merkel, numa cerimónia em que a reitora valorizou a sua “liderança fundada em valores, livre e sem medo”.

“Cientista, líder política, alemã e europeia, serviu o seu país como chanceler durante 16 anos, numa vida de serviço à causa pública e ao bem comum. É por isso este o tempo certo para homenagear Angela Merkel, reconhecer a grandeza da sua ação, o futuro que nos jogou, a particularidade da sua liderança”, afirmou Isabel Capeloa Gil, reitora da UCP.

No discurso que proferiu, no Auditório Cardeal Medeiros, em Lisboa, a responsável reconheceu a “defesa dos valores do humanismo europeu” empreendida por Angela Merkel, quando, em 2015, a crise dos refugiados assolava as fronteiras da Europa.

O seu gesto característico de mãos juntas, muitas vezes designado o ‘losango de Merkel’, foi, neste período, um coração, demonstrando que sem a alma humanista não existe a Alemanha, nem a Europa. Perante a avalanche dos desprotegidos, a sua resposta foi determinante.”

Isabel Capeloa Gil considera que, “num tempo sempre incerto, Angela Merkel foi a mulher certa para as circunstâncias”.

De acordo com a reitora da UCP, com esta distinção – a atribuição do mais alto título da Universidade – a instituição reconhece “no seu legado as sementes do futuro” que deve alimentar.

“Porque a sua ação, guiada corajosamente pela defesa da liberdade, se estrutura na capacidade extraordinária de ler os sinais do tempo e de a eles reagir, mas sobretudo de antecipar e prevenir”, completou.

No final da intervenção, Isabel Capeloa Gil agradeceu o “tempo justo” das escolhas da antiga chanceler alemã, que dá a “possibilidade de a Europa continuar a ter futuro”.

Foto: Arlindo Homem

O presidente da República português, Marcelo Rebelo de Sousa, padrinho do Doutoramento Honoris Causa de Angela Merkel, marcou presença na cerimónia, a quem competiu realizar o discurso do elogio (Laudatio).

O chefe de estado caracterizou a distinção como um “gesto digno, nobre, visionário e justíssimo”, evocando “três razões muitos simples, mas decisivas” para a atribuição do douramento Honoris Causa ser, no seu entender, “um imperativo categórico”.

“A doutoranda preferiu sempre que pôde na sua vida a linha reta às curvas, mesmo que elas parecessem atingir a mesma reta final.  A doutoranda preferiu sempre que pôde na vida juntar à frieza de ferro a razão, a compaixão nascida de raízes e de memórias nunca esquecidas”, realçou.

Além disso, Marcelo Rebelo de Sousa destacou que Angela Merkel “preferiu sempre, mas sempre na vida, a convicção filosófica e a religiosa aos mais importantes valores políticos económicos, sociais, culturais e por maioria de razão as conveniências estratégicas”.

No discurso, o presidente da República português ressaltou também a “irremovível oposição sobre migrações”, adotada pela antiga chanceler da Alemanha, contra a “vaga tentadora, egoística” que, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, “sobe e subirá até que os seus feiticeiros sejam vítimas dos seus feitiços”.

Na cerimónia marcada pela imposição das insígnias e a entrega doutoral, a chanceler emérita também interveio, tendo lembrando os regimes de ditadura na Alemanha e em Portugal, expressando que a reunificação alemã, na altura, foi “um milagre”, perante todos os novos conflitos que estão em curso no mundo.

Segundo Angela Merkel, “a política não deve tomar decisões pelas pessoas, deve empoderar as pessoas, para que estas consigam realizar aquilo que pretendem, encontrando as suas respostas”.

A homenageada abordou, no discurso, a presença de partidos populistas praticamente em todos os países da União Europeia, defendendo que que é necessário “solucionar a questão”.

Foto: Arlindo Homem

“Vamos optar por utilizar a retórica destes partidos políticos? Vamos deixar que eles definam a agenda? Ou será que nós, os partidos democráticos do meio, é que conseguimos definir a ordem de trabalhos e conseguimos encontrar soluções olhando para o cerne da questão e não encontrar soluções meramente táticas?”, questionou.

“Espero que consigamos resolver os problemas dos refugiados, das migrações. Para isso é importante pensarmos em conjunto como europeus”, sublinhou.

Angela Merkel assinalou que é necessário “voltar a lutar pela liberdade”, enfatizando que “não se pode olhar para trás” a pensar “que está resolvido”.

“Não, as gerações todas têm de lutar pela liberdade”, frisou, indicando que hoje existem partidos populistas e redes sociais, algo que não existia no passado e que abre novas possibilidades, tanto do ponto de vista negativo como positivo.

Segundo a antiga chanceler alemã, “a liberdade não pode existir apenas para alguns, tem que existir para todos”.

“Devo dizer que a política não vale nada se os cidadãos não participarem, cada um deve participar”, reiterou.

LJ/OC

O magno chanceler da UCP, D. Rui Valério, foi o responsável por encerrar a cerimónia, na qual acentuou que “não há verdadeira paz sem verdade”.

“A ignorância, as fake news, as manipulações criam suspeitas, medos e conflitos. Pelo contrário, o saber crítico, honesto e rigoroso, que esta universidade cultiva, ilumina os caminhos da reconciliação. Investir na educação, promover o pensamento livre e responsável, é, por isso, um ato profundamente pacificador”, referiu.

O também patriarca de Lisboa destacou que “o diálogo entre culturas, religiões, povos e ideologias é hoje a condição mínima para a paz” e que “a Universidade, lugar por excelência do debate livre e plural, tem aqui uma missão insubstituível”.

“Terceira reflexão: O saber deve traduzir-se em responsabilidade social. O conhecimento sem responsabilidade gera arrogância e distância. A sabedoria autêntica, pelo contrário, aproxima, serve, compromete-se com o bem comum”, desenvolveu.

Desta forma, D. Rui Valério considera que “é justo reconhecer publicamente aqueles que, com espírito de serviço e visão de futuro, colocam o seu saber e a sua liderança ao serviço da construção da paz, como hoje” fez a UCP “ao homenagear a chanceler Angela Merkel”.

A atribuição do grau de doutora Honoris Causa à antiga chanceler alemã contou com a presença de várias personalidades, entre elas o ministro Adjunto e da Reforma do Estado, Gonçalo Matias; o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas; o presidente da CIP, Armindo Monteiro; o antigo presidente da Comissão Europeia José Manuel Durão Barroso; o antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornelas.

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