Francisco critica quem colocou «salvação dos bancos» acima dos interesses das pessoas
Cidade do Vaticano, 18 jun 2015 (Ecclesia) – O Papa defende na sua nova encíclica, publicada hoje, que os direitos e necessidades das populações estão acima dos interesses financeiros e do mercado, criticando o “paradigma tecnocrático” nas sociedades atuais.
“A política não deve submeter-se à economia e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia”, escreve, num texto intitulado ‘Laudato si’. Sobre o cuidado da casa comum’.
Na primeira encíclica (grau mais importante das cartas assinadas por um pontífice) dedicada aos temas ecológicos, Francisco adverte para as consequências deste paradigma sobre a economia e a política, gerando decisões “em função do lucro” e permitindo que as “forças invisíveis do mercado regulem a economia”.
“A finança sufoca a economia real. Não se aprendeu a lição da crise financeira mundial e só muito lentamente se aprende a lição da degradação ambiental”, adverte.
Neste sentido, o Papa argentino sustenta que “a salvação dos bancos a todo o custo”, fazendo pagar o preço à população, sem a contrapartida de uma reforma do sistema, apenas “reafirma um domínio absoluto da finança que não tem futuro e só poderá gerar novas crises”.
Francisco deixa várias críticas ao “mecanismo consumista” promovido por um paradigma “tecnoeconómico” e afirma que “o mercado, por si mesmo” não garante “desenvolvimento” ou “inclusão social”.
“A aliança entre economia e tecnologia acaba por deixar de fora tudo o que não faz parte dos seus interesses imediatos”, observa, apontando o dedo à “ganância desenfreada” e ao “princípio da maximização do lucro”.
O novo documento fala no crescimento “ganancioso e irresponsável” das últimas décadas, fundado na ideia dum “crescimento infinito ou ilimitado, que tanto entusiasmou os economistas, os teóricos da finança e da tecnologia”.
Francisco denuncia “a mentira” da disponibilidade “infinita” dos bens do planeta, acusando os poderes económicos de continuarem a justificar o atual sistema mundial, onde predomina a “especulação” sem respeito pela dignidade humana ou o meio ambiente.
“Assim se manifesta como estão intimamente ligadas a degradação ambiental e a degradação humana e ética”, assinala.
O Papa sublinha que a humanidade tem sido capaz de promover um desenvolvimento tecnológico e económico, mas entende que, se o mesmo não deixar “um mundo melhor e uma qualidade de vida integralmente superior”, não se pode considerar como “progresso”.
O pontífice argentino liga a crise ecológica à crise moral e à “cultura do relativismo”, antes de apelar a novos estilos de vida e refutar “uma conceção mágica do mercado”.
“Não se pode justificar uma economia sem política”, sustenta.
Francisco entende que para lá da possibilidade de “terríveis fenómenos climáticos ou de grandes desastres naturais”, a humanidade tem também de estar atenta a “catástrofes resultantes de crises sociais”.
“A obsessão por um estilo de vida consumista, sobretudo quando poucos têm possibilidades de o manter, só poderá provocar violência e destruição recíproca”, avisa.
A encíclica observa que a rentabilidade não pode ser o único critério a ter em conta e lamenta que uma “mentalidade utilitária” olhe para a biodiversidade como “um reservatório de recursos económicos”, sem ter em consideração “o seu significado para as pessoas e as culturas, os interesses e as necessidades dos pobres”.
OC