Manuela Silva
Publicada em Maio de 2015, dois anos depois do início do seu pontificado e logo após a encíclica intitulada Alegria do Evangelho, a carta encíclica “Laudato si’. Sobre o cuidado da casa comum” viria a revelar-se um dos textos pontifícios de maior divulgação nos meios intelectuais não confessionais. Pelo contrário, podemos dizer que, ainda hoje, não é suficientemente lida, aprofundada e, menos ainda, posta em prática, nas nossas comunidades eclesiais. Tal realidade não pode deixar-nos indiferentes.
Esta constatação motivou um conjunto de entidades eclesiais a formar uma rede composta por organizações e movimentos da Igreja em Portugal, bem como pessoas a título individual, com o propósito de dar a conhecer aquela carta-encíclica sobre o cuidado da casa comum e promover, no seio de paróquias, movimentos, congregações religiosas, escolas, etc, o que designamos como “focos de conversão ecológica”.
Acerca desta Rede, criada em Novembro de 2017, dos seus objetivos, da sua composição e das suas realizações, pode consultar-se o site casacomum.pt entretanto criado. Nele se encontram, também, notícias de ideias e factos bem como documentos relacionados com a proposta do Papa Francisco de conversão ecológica e empenho de crentes e não crentes em promover uma ecologia integral que responda aos desafios da grave crise ecológica com que estamos confrontados.
Neste e em próximos números do Mensageiro de Santo António, iremos falar da Laudato si’ e das várias temáticas que nela se abordam.
No presente artigo, limito-me a fazer uma breve apresentação de conjunto, com um confessado propósito: despertar, desde já, o interesse do leitor/a para ler a carta encíclica na íntegra.
O documento desdobra-se em seis capítulos
- O que está a acontecer à nossa casa comum
Fala-se da poluição e das mudanças climáticas, da questão da água, da perda da biodiversidade, da deterioração da qualidade da vida humana e da degradação social, da desigualdade planetária, da fraqueza das reações dos responsáveis políticos, e da diversidade de opiniões face aos fenómenos detectados, a sua magnitude, as suas causas e as diferentes soluções para os enfrentar. - O Evangelho da criação
Trata-se de uma visão teológica e da sabedoria decorrente das narrativas bíblicas, designadamente a perspectiva da harmonia de toda a criação, e suas implicações no entendimento do sentido da comunhão universal e no destino comum dos bens. Relevo especial merece o que podemos aprender através da contemplação do olhar de Jesus sobre todas as criaturas. - A raiz humana de crise ecológica
É dada grande atenção ao papel da tecnologia e da globalização baseada no paradigma tecnocrático e na maximização do lucro do capital e à crise do antropocentrismo com as suas consequências negativas do ponto de vista do esbanjamento e desperdício de recursos e demais atitudes predadoras por parte dos humanos em relação ao Planeta em que habitamos. - Uma ecologia integral
Trata-se de um conceito inovador que engloba a dimensão ambiental, económica e social; a ecologia cultural; a ecologia da vida quotidiana; o princípio do bem comum; a justiça intergeracional. - Algumas linhas de orientação e acção
Neste capítulo, o Papa faz apelo ao diálogo necessário sobre o meio ambiente na política internacional, nas políticas nacionais e locais, à necessidade de transparência nos processos decisórios, ao objectivo da plenitude humana, ao papel das religiões no diálogo com as ciências. - Educação e espiritualidade ecológicas
Francisco deixa o convite, que é um apelo a outro estilo de vida, a uma educação para a aliança entre a humanidade e o ambiente, à conversão ecológica; à alegria e à paz, ao amor civil e político, aos sinais sacramentais; à contemplação da Trindade e da relação entre as criaturas; a Maria, a rainha de toda a criação; à expectativa da vida eterna.
A terminar esta apresentação intencionalmente genérica e em jeito de síntese, recordo a adjetivação feita por D. Manuel Clemente ao referir-se à Laudato si’: Uma encíclica global, integral, actual, contemporânea, que apela a uma conversão ecológica.
Junto a esta apreciação do cardeal-patriarca de Lisboa e presidente da Conferência Episcopal as palavras de um autor insuspeito, Edgar Morin, declaradamente ateu, que se refere a esta encíclica dizendo: A Laudato si’ é talvez o primeiro acto de um apelo mundial para uma nova civilização.
Para os próximos artigos deixo, desde já, uma interrogação: que mensagem nos traz a LS?