Padre Hugo Gonçalves, Diocese de Beja
A Igreja Católica vive um momento único e, ao mesmo tempo, um desafio constante quando se trata de dar espaço e voz aos jovens. Recentemente, assistimos a dois marcos importantes que nos convidam à reflexão: as Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ) em Lisboa e o Jubileu dos Jovens. Ambos os eventos foram expressões poderosas de fé, esperança e entusiasmo por parte de uma juventude que se sente chamada a participar ativamente da vida da Igreja. Contudo, a questão que persiste é: depois destes encontros vibrantes, onde se coloca a juventude no coração da Igreja? Têm, de fato, um lugar para serem ouvidos e acompanhados de forma genuína e comprometida?
Com frequência, ouvimos a afirmação de que os jovens são o “futuro” da Igreja. De fato, são o futuro, mas também são o presente. Não podemos reduzir a sua importância a uma mera promessa para o amanhã. Os jovens são os protagonistas de hoje, com inquietações, sonhos e desafios próprios que pedem uma resposta da Igreja no presente imediato. O futuro da Igreja está nas suas mãos, mas o que estão a construir não deve ser ignorado ou tratado como algo secundário.
Entretanto, muitos jovens sentem-se marginalizados. A mesma Igreja que lhes dá uma enorme visibilidade nos grandes eventos, como as JMJ, muitas vezes não consegue ouvir as suas preocupações de maneira profunda e continuada. As inquietações que partilham, as propostas que trazem, muitas vezes são minimizadas, ou até esquecidas, nas esferas de decisão e ação da Igreja. Como podemos afirmar que eles são o futuro, se, na prática, lhes cortamos as pernas, como se costuma dizer popularmente, ao não reconhecerem plenamente o valor dos seus projetos e visões?
Quando falamos de acompanhamento, não nos referimos apenas a atividades esporádicas ou a programas pontuais. A verdadeira escuta dos jovens exige um esforço contínuo, uma dedicação real e uma mudança de mentalidade dentro da Igreja. Não se trata apenas de dar um lugar à juventude nas cerimónias, mas de permitir-lhes ser parte ativa da missão da Igreja. Eles precisam de ser acompanhados em todas as dimensões da sua vida – espiritual, pessoal, social, e profissional. E mais importante ainda: as suas inquietações, os seus projetos e os seus sonhos precisam de ser levados a sério.
Acompanhamento é também compromisso. Quando os jovens falam da sua fé, das suas lutas interiores ou dos seus desafios em lidar com um mundo cada vez mais distante dos valores cristãos, é crucial que a Igreja esteja pronta para responder de forma honesta, empática e prática. A Igreja deve criar espaços de diálogo real, onde os jovens possam ser ouvidos de forma autêntica, sem a pressão de terem que se encaixar num molde pré-definido. Se lhes damos o microfone, é fundamental que as suas vozes sejam escutadas e que as suas propostas não caiam no vazio.
A questão mais urgente é: qual é o lugar real que queremos dar aos jovens na Igreja? O lugar não pode ser apenas o de espectadores, participantes em grandes eventos ou futuros líderes. Devemos estar dispostos a ouvir, a aprender com eles, a partilhar o nosso conhecimento e experiência de fé, mas também a acolher as suas novas formas de entender a fé e viver a espiritualidade. Ao longo dos séculos, a Igreja soube crescer e transformar-se, acompanhando as mudanças sociais e culturais, sempre fiel aos princípios do Evangelho, à Tradição e ao Magistério. Agora, mais do que nunca, precisamos de ser fiéis a essa vocação, ouvindo com atenção as novas gerações, que têm algo valioso a contribuir para a renovação da Igreja.
Se não dermos a devida importância às vozes jovens, corremos o risco de perder uma enorme riqueza que se esconde nas suas perspectivas frescas e criativas. Quando falamos em juventude, falamos de uma geração com um potencial imenso para transformar a sociedade e a própria Igreja. No entanto, para que este potencial floresça, precisamos de mais do que palavras bonitas e promessas de futuro. Precisamos de ações concretas, de envolvimento real e de uma Igreja que se ponha em escuta, disposta a caminhar com os jovens, de igual para igual, e não de cima para baixo.
Portanto, a reflexão sobre o lugar dos jovens na Igreja não deve ser uma mera retórica ou uma questão a ser resolvida apenas nos grandes eventos. Ela deve ser uma prática diária e concreta. Se afirmamos que os jovens são o futuro da Igreja, que o sejam também no presente, com voz, com espaço, com acompanhamento sério. A Igreja precisa de criar um espaço de acolhimento e diálogo onde as inquietações dos jovens sejam levadas a sério, onde os seus projetos possam ser avaliados com honestidade e, quando possível, implementados de forma que fortaleçam a missão da Igreja.
A juventude é chamada a ser, de facto, o presente da Igreja, e o nosso compromisso é garantir que, ao longo deste caminho, eles não sejam apenas ouvidos, mas acompanhados com amor, atenção e coragem. Só assim, de mãos dadas com as novas gerações, poderemos caminhar rumo a um futuro de renovação e vivência autêntica da fé cristã.
Pe. Hugo Gonçalves
Diocese de Beja
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