Jornadas em Fátima apelam à protecção da infância

Uma apelo à “qualidade da infância” dominou o final dos trabalhos das Jornadas Sobre as Crianças Institucionalizadas, promovidas pelo Santuário de Fátima durante os dias 2 e 3 de Junho. Neste evento, inserido nas comemorações dos 90 anos das aparições, participaram cerca de 300 pessoas de todo o país, na maioria ligadas a Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, funcionários de serviços das áreas da Assistência e Segurança Social e também jovens estudantes. Na manhã de 3 de Junho, o juiz conselheiro Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção e Crianças e Jovens em Risco, defendeu que “não há qualidade humana sem qualidade de infância” e que, no momento actual em que se vivemos – de “uma situação preocupante, de pobreza, desemprego, droga e alcoolismo” – deve haver esperança e trabalhar-se para encontrar soluções para os problemas, porque “não há crises irreversíveis”. No caso das crianças que vivem em instituições, uma situação que Armando Leandro considera “legítima”, mas que deve ser pensada como última alternativa às situações, a resposta a dar passa pelo acompanhamento à família da criança, pela adopção ou pela existência de famílias de acolhimento. Noutra intervenção, Catalina Pestana, provedora da Casa Pia de Lisboa, afirmou a necessidade da intervenção precoce junto das crianças institucionalizadas e das suas famílias. “A intervenção precoce é determinante, é fundamental. Não tenham medo de dar mimo aos vossos meninos, nunca ninguém morreu de mimos a mais e com mimos a menos não está provado”, disse. “Todas as crianças têm direito a uma educação que se inicie precocemente no contexto de uma família adequada, seja ela biológica ou de adopção”, considera a Provedora da Casa Pia. Na última conferência das Jornadas, intitulada “Ajudar a crescer para uma vida saudável e feliz”, Catalina Pestana disse saber “apenas que a felicidade é totalmente subjectiva, pode ser construída no mundo economista do ter ou na aventura simples do ser”. Estado No âmbito da educação, e no sentido do crescimento interior da pessoa, Catalina Pestana considera que “todos queremos fugir ao sofrimento, (mas) ninguém cresce sem saber lidar com o sofrimento”, “porque sofrimento é crescimento”. “Temos de nos debruçar sobre a riqueza da família para não termos que nos envergonhar. Somos o país da Europa com o maior número de crianças institucionalizadas”, afirmou Catalina Pestana, que, ainda assim, considera que não é caso se alterar a legislação, uma vez que “Portugal está à frente do mundo em termos de qualidade legislativa” no que se refere à protecção de menores e que, também nesta área, “não precisávamos mais do que a Lei fundamental para actuar”. “É altura de o Estado perceber que tem de articular respostas. Respostas sectoriais não são eficazes. (…) Está na altura de exigir – todos nós que temos as mãos na massa –, é altura de o Estado que nos representa perceber que tem que articular as respostas. (…) Precisamos de uma política integrada para a infância e para a juventude”, defende Catalina Pestana, que apelou a uma política que concerte as áreas social, educação, saúde e justiça. Família A respeito da violência vivida e sentida pelas crianças e jovens que vivem em instituições, Adelino de Jesus Antunes, director do Colégio D. Nuno Álvares Pereira da Casa Pia de Lisboa, referiu que a “violência precocemente vivida por aqueles que tiveram que ser acolhidos em instituição é muitas vezes só o eclodir do grito de tantos silêncios afogados em revolta interior. (…) Em primeiro lugar parece importante conhecer os contextos da violência sobre a criança e o adolescente ou emanados deles, para só depois se implementarem as condições para a diminuição gradual da expressão violência”. Para este responsável, também a estadia prolongada da criança na instituição provoca revoltas. (…) “Tenta-se construir a alma colectiva e a criança fica com a ideia que faz parte de um todo e que não é ninguém”, afirmou Adelino Antunes na conferência intitulada “Preconceitos sociais e lógicas defensivas das crianças”, onde salientou que “a agressividade dos comportamentos e as tendências desviantes, mostram-se como insuperáveis, levando à exaustão física e psíquica de muitos que tentam controlá-la sem perceberem que a fúria do rio não pode ser contida entre margens emparedadas”. Uma das formas sugeridas pelo Dr. Adelino Antunes para superar estes problemas passa pela reestruturação do funcionamento das próprias instituições e também da mentalidade dos educadores, apontando para alternativas ao acolhimento, e, de entre elas, o acolhimento em família. “Uma família só pode ser substituída por outra família, seja de acolhimento, de adopção ou de empréstimo. (…) É preciso que se olhe para a família de acolhimento, como um figura única no acolhimento da criança”, afirmou Adelino Antunes que disse “bater palmas” à iniciativa do Governo de pretender reduzir em 25% o número das crianças institucionalizadas, embora, ainda assim, a considere “pouco corajosa”.

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