«Jesus, Filho de Deus. Verdade ou Blasfémia?» é o tema das I Jornadas da Associação Bíblica Portuguesa, que arrancou com uma conversa entre a escritora e D. Alexandre Palma

Lisboa, 07 nov 2025 (Ecclesia) – A escritora Lídia Jorge destacou hoje a “mensagem de amor” que Jesus trouxe ao mundo e o triunfo da história, com mais de 2000 anos, criada em torno da sua figura, nas I Jornadas da Associação Bíblica Portuguesa, em Lisboa.
“A narrativa que se criou em torno desse Homem absolutamente extraordinário triunfou. Triunfou mesmo quando ela é rejeitada, mal interpretada, mal utilizada e foi muitas vezes ao longo dos séculos”, afirmou Lídia Jorge, na abertura da iniciativa, na Brotéria, casa de cultura dos jesuítas portugueses, no Bairro Alto.
«Jesus, Filho de Deus. Verdade ou Blasfémia?» é o tema das I Jornadas da Associação Bíblica Portuguesa, que se realizaram hoje e terminam no sábado, e se debruçam sobre a figura do misterioso homem de Nazaré.
Em declarações à Agência ECCLESIA, Lídia Jorge destacou que Jesus “acabou por criar uma narrativa tão importante”, que “é praticamente seguida por um terço da humanidade”, indicando que as outras culturas “são tão melhores quanto mais seguem aquilo que são os preceitos”.
A escritora considera que “é bom” que a questão que dá mote à iniciativa seja colocada do ponto de vista teológico e que também as pessoas que se interessam pela ciência se debrucem sobre o Novo Testamento e se questionem sobre se Cristo ser filho de Deus corresponde à realidade ou se foi uma blasfémia dele próprio.
Segundo Lídia Jorge, esta é uma questão que é “natural” e “é absolutamente fulcral”.
As I Jornadas da Associação Bíblica Portuguesa assinalam os 1700 anos do primeiro Concílio Ecuménico, em Niceia, que teve a missão de preservar a unidade da Igreja, perante correntes teológicas que negavam a plena divindade de Jesus Cristo e a sua igualdade com o Pai.
Segundo a escritora, a tensão entre a natureza divina e humana de Jesus Cristo “nunca será resolvida”, indicando que “o tempo vai trazendo novas visões, novas perspetivas”.
A criação da ideia de que há uma tríade do Pai, do Filho e do Espírito Santo é alguma coisa que, para muitos, continua a ser inadmissível. E, para outros, é o fundamento de uma Igreja, de uma civilização e de uma cultura. Eu acho que é muito difícil ultrapassar isso”.
Promovida pela revista ‘Brotéria’ e a Associação Bíblica Portuguesa, a iniciativa arrancou com Lídia Jorge e D. Alexandre Palma, bispo auxiliar de Lisboa, numa conversa com o tema “Do Nazareno ao Niceno”, moderada pela teóloga Sónia Monteiro.
O bispo olha para Jesus como uma figura “interpelante em qualquer circunstância”, tanto para aqueles que o consideram como “verdade”, bem como para os que “eventualmente o não consideram como tal”.
“A figura de Jesus não é irrelevante, não é neutra, mas é, pelo contrário, muito significativa” para “todas as pessoas”, sublinhou, em declarações à Agência ECCLESIA.

D. Alexandre Palma salienta que, “ao longo da história”, “a Igreja foi aprendendo a dizer a sua fé e tem no Concílio de Niceia um momento absolutamente axial”, mas “é chamada a encontrar esse seu mesmo discurso para cada época, em cada lugar”.
“A questão, tal como ela se colocava no século IV, teve a resposta que teve, mas isso não dispensa os cristãos depois de Niceia de continuarem sempre a revisitar essa resposta e, no fundo, essa maneira de traduzir a própria fé cristã”, disse.
O bispo admite que “há uma lógica muito de paradoxo na fé cristã”, dando o exemplo de “alguém poder ser plenamente homem, mas também plenamente divino”, “ser plenamente eterno e, ao mesmo tempo, plenamente histórico”, “ser plenamente espiritual e”, simultaneamente, “plenamente carnal, isto é, físico”.
“A fé cristã, de alguma maneira, escolhe o caminho difícil do paradoxo, que é não simplificar a sua fé e, neste caso, a identidade de Jesus, mas suster, sustentar esta dupla afirmação da plena humanidade e da plena divindade”, realçou.
Segundo o bispo, Jesus continua a interpelar muitas pessoas na atualidade, defendendo que “continua a ser um polo de discussão, de interesse, de reflexão”, quer seja, “pública, mediática”, como “científica”.
Jesus continua a ser um objeto de interesse, de debate, de estudo, de edição, no campo das artes, no campo do cinema, no campo, como digo, da investigação científica, no campo da filosofia, das letras”, reforçou.
Para D. Alexandre Palma, isso mostra “o inesgotável da figura de Jesus, que passados dois mil anos, passadas tantas páginas, tantos textos, tantas horas, tantos discursos, continua ainda a interpelar e a falar também” para o tempo atual.
|
Esta é a primeira edição das jornadas da Associação Bíblica Portuguesa que, segundo explica o presidente, padre Mário Sousa, surgiu da necessidade de os membros e biblistas divulgarem o resultado do estudo que desenvolvem, fruto do encontro anual que organizam, ao serviço da comunidade. “Este ano, comemorando-se os 1700 anos do Concílio de Niceia, que é sobretudo um concílio cristológico, […] considerámos que era importante também […] transmitirmos e partilharmos a forma como as primeiras comunidades, começando imediatamente pelos apóstolos e os primeiros discípulos, se debruçaram, se maravilharam, se perguntaram e nos transmitiram sobre a pessoa de Jesus”, conta. O padre Mário Sousa manifesta a vontade da Associação Bíblica Portuguesa em dar continuidade a esta iniciativa, assinalando que é dever deste organismo partilhar com todos o aprofundamento realizado em torno da Sagrada Escritura. “Um livro muito distante no tempo, na mentalidade, nas chaves de leitura, e que por isso é a nossa obrigação possibilitar, fornecer todo esse enquadramento para podermos extrair da Escritura tão antiga, como diz Jesus no Evangelho, sempre coisas antigas e coisas novas”, referiu. “Este ano, com este foco, que é o fundamental, quem é Jesus? Quem é este homem? É a pergunta dos discípulos. E depois, de acordo também com o caminhar do tempo, vamos escolhendo outros temas, de acordo com o interesse das pessoas”, adiantou. |
LJ/PR




