Na semana que a Igreja Católica dedica às migrações, apresentamos uma entrevista com a directora do Serviço Jesuíta aos Refugiados Na semana que a Igreja Católica dedica às migrações, apresentamos uma entrevista com a directora do Serviço Jesuíta aos Refugiados, Maria do Rosário Farmhouse. Porque, se há bem poucos anos, eram os emigrantes quer marcavam esta semana, cada vez mais há necessidade de espaços de análise e reflexão sobre aqueles que chegaram ao nosso país à procura de melhores condições de vida. O Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) é uma organização internacional da Igreja Católica, sob a responsabilidade da Companhia de Jesus (Jesuítas). Foi fundado em 1980, pelo Padre Pedro Arrupe, então Superior Geral da Companhia de Jesus, vendo nos refugiados os mais desprotegidos deste mundo. O JRS tem como missão “acompanhar, servir e defender” os direitos das pessoas refugiadas e deslocadas à força, em qualquer parte do mundo. Hoje está em 70 países. Nos países lusófonos, exerce a sua acção em Portugal, Angola, Brasil e Timor Leste. ECCLESIA – Esta Semana Nacional das Migrações acontece num mês que é tradicionalmente dedicado às férias, mas há muitos imigrantes para quem isso não será uma realidade. Maria do Rosário Farmhouse – É verdade, grande parte dos imigrantes em Portugal está a trabalhar nesta altura do ano, que é precisamente quando há mais procura. Nem todos têm condições para ir ao seu país. E – Essa é uma realidade muito próxima da dos emigrantes portugueses das décadas de 50 e 60… MRF – Há de facto muitas semelhanças, porque os primeiros anos são os de resolver tudo, organizar a vida, e só depois começar a pensar num eventual retorno ao país de origem. Muitos ainda estão sós, não têm cá a família, e a prioridade é juntar dinheiro. E – Que problemas trazem para os imigrantes os vazios criados pelo período de férias? MRF – A maioria dos serviços de apoio aos imigrantes estão encerrados, para começar. Logo, um imigrante que esteja numa aflição tem menos sítios onde recorrer. Contudo, devemos ter em conta que a grande dor de cabeça é não ter onde deixar os filhos, porque não têm ninguém de família e estão a trabalhar. Conhecemos muitos casos desses, com filhos a ficarem sozinhos em casa, que nos preocupam muito. E – Não se conhecem projectos a pensar especificamente nestes problemas de verão? MRF – Não, ainda só estamos a tentar começar. O importante é que começam a aparecer algumas preocupações e interacções, para acolher e ajudar imigrantes. O problema é que aquilo que se conhece é, geralmente, dispendioso. E – A situação não é mais fácil para quem não tem cá família… MRF – Não, o reagrupamento familiar ainda está muito atrasado e isso faz com que as pessoas passem quase um ano à espera dos seus. Isto traz uma instabilidade emocional enorme, principalmente para os que não podem ir ao seu país de origem. Outra circunstância que impede as saídas é a renovação dos vistos, que neste momento não tem um processo de renovação automática: os imigrantes recebem um papel para renovar os vistos apenas passados 4/5 meses. E – Há casos de sucesso no âmbito do reagrupamento familiar? MRF – Sim, temos tido alguns casos de sucesso, até porque são processos muitíssimo dolorosos: as crianças ficam com a sensação de abandono – a data vai-se prolongando, porque a burocracia é muita – e espero que rapidamente eles andem mais depressa. E – Em relação aos problemas do reconhecimento de habilitações académicas, qual é o ponto da situação? MRF – O problema dos médicos está a seguir o seu curso e dos 120 médicos temos 74 que são reconhecidos como tal em Portugal. Estamos a iniciar um programa para enfermeiros, juntamente com a Fundação Gulbenkian, a Escola de Enfermagem Francisco Gentil e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Noutras áreas ainda há muito por fazer no reconhecimento das qualificações, o que é uma pena! E – Até que ponto a população imigrante marca a celebração da Semana Nacional de Migrações? MRF – Marca muito, como já começa a acontecer, por exemplo, nos festejos das aldeias. Portugal está a mudar, está melhor, e todos os países que se abriram à imigração atingiram níveis de desenvolvimento notáveis. Nós não estamos a ser invadidos e eu acho que a presença significativa de imigrantes altera muito a nossa realidade. E – Até que ponto o tempo deférias, que é tempo de mobilidade, ajuda a aceitar a população imigrante? MRF – Penso que nas férias temos uma maior tolerância ao estrangeiro, logo acabamos por nos habituarmos à sua presença e perceber melhor o que é estar fora, não conhecer a língua… Espero é que esta atitude se prolongue ao longo do resto do ano. Dossier AE • Semana Nacional de Migrações