Igreja/Sociedade: «Precisamos de novas representações da Pietà que integrem as tragédias da contemporaneidade» – Padre António Martins

Professor de Mariologia na UCP sublinha desafios deixados pelo Jubileu da Espiritualidade Mariana

Foto: Lusa/EPA

Lisboa, 10 out 2025 (Ecclesia) -O padre António Martins, professor de Mariologia na Universidade Católica Portuguesa (UCP), afirmou que os “dramas” da humanidade de hoje podem inspirar novas visões da tradicional representação da Virgem Maria com Jesus morto, nos braços.

“O que é que vivemos contemporaneamente? Com tantos dramas semelhantes, se calhar precisamos de novas representações da Pietà que integrem as tragédias da nossa contemporaneidade”, refere o entrevistado do Programa ECCLESIA emitido este domingo, na Antena 1 da rádio pública, a respeito do Jubileu da Espiritualidade Mariana, a que o Papa presidiu na Praça de São Pedro, com a presença de dezenas de milhares de pessoas.

O padre António Martins, responsável pela comunidade da Capela do Rato, em Lisboa, assinala que a imagem da Virgem Maria na ‘Pietà’ é a de uma “mulher frágil que acolhe a maior fragilidade que pode existir existencialmente, uma mãe que perdeu um filho”.

“Maria, junto da cruz, completamente impotente perante a morte do Filho, que perde no maior dos horrores e da violência”, recordou, acrescentando que “ali estão condensadas todas as tragédias da contemporaneidade, na Ucrânia ou em Gaza”.

O docente da UCP aponta ainda outras atitudes de Maria que podem inspirar a Igreja Católica, recordando a ligação com o processo sinodal, como figura que “escuta, reza, medita, dialoga, acompanha, discerne, decide e age”, sublinhada no recente Congresso Mariológico Internacional, no qual participou, em setembro.

“Maria vai ao encontro de Isabel numa atitude de serviço, de cuidado, de missionação”, exemplifica.

O padre António Martins aborda a resposta da jovem Maria ao anjo, aquando da Anunciação, o “eis-me aqui”, como síntese da resposta cristã.

“Essa expressão tão precisa, tão incisiva, tão significativa de Maria (…) é o sim de cada cristão, de cada Igreja, de cada comunidade, em cada dia, em cada momento, com o ano jubilar ou para além dos anos jubilares”, afirmou.

O sacerdote alude a “uma espiritualidade do quotidiano”, que transparece nas referências bíblicas à Virgem Maria, falando numa espécie de “passividade ativa”.

“É deixar que a nossa vida seja desfeita e refeita por uma Palavra que é exterior a nós”, rompendo com a lógica de eficácia e programação permanentes, precisou.

Foto: Agência ECCLESIA

O padre António Martins afirma que a fé cristã é inseparável da dimensão física, destacando que “o mistério da encarnação não é uma ficção teológica, é uma realidade”.

Nesse sentido, acrescenta, a espiritualidade mariana reenvia “para a dimensão afetiva”, manifestada na piedade popular como “explosão do sentir crente”, mas que exige “uma leitura crítica” para evitar “guetos de excessiva emoção” ou “fundamentalismos” junto aos santuários.

Evocando o pensamento do teólogo Hans Urs von Balthasar (1905-1988), o docente da UCP referiu que “o princípio mariano ou feminino é ontologicamente primeiro do que o princípio funcional e hierárquico petrino”, defendendo a sua complementaridade na vida eclesial.

OC

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