Discurso inaugural da viagem à Córsega destacou «cidadania construtiva» dos cristãos
Ajácio, França, 15 dez 2024 (Ecclesia) – O Papa alertou hoje, na ilha francesa da Córsega, para a “privatização da fé”, apelando a uma laicidade que entre em diálogo com as religiões.
“Há necessidade de desenvolver um conceito de laicidade que não seja estático e rígido, mas evolutivo e dinâmico, capaz de se adaptar a situações diversas ou imprevistas, e de promover uma cooperação constante entre as autoridades civis e eclesiásticas para o bem da comunidade”, indicou, no Palácio de Congressos e Exposições de Ajácio, perante os participantes no congresso sobre a “Religiosidade Popular no Mediterrâneo”, que teve início este sábado.
Francisco cumpre este domingo a sua 47ª viagem internacional, visitando a Córsega num programa com atenção especial ao Mediterrâneo.
O primeiro discurso da visita destacou a importância das manifestações de piedade popular para o diálogo com a sociedade, no seu todo.
“A piedade popular, as procissões e as rogações, as atividades caritativas das confrarias, a oração comunitária do santo Rosário e outras formas de devoção podem alimentar esta cidadania construtiva dos cristãos”, referiu o pontífice, perante responsáveis católicos de vários países.
O Papa foi recebido, no local, pelo bispo de Ajácio, pelo ministro francês do Interior, autoridades regionais e representantes da sociedade civil.
Perante cerca de 400 pessoas reunidas no Auditório ‘Pascal Paoli’, Francisco apelou ao “compromisso e testemunho diante de todos, em prol do crescimento humano, do progresso social e do cuidado da criação, sob o signo da caridade”.
“Precisamente por isso, a partir da profissão da fé cristã e da vida comunitária animada pelo Evangelho e pelos Sacramentos, surgiram ao longo dos séculos inúmeras obras de solidariedade e instituições, como hospitais, escolas, centros de assistência – em França são muitos! –, nas quais os crentes se comprometeram em favor dos necessitados e contribuíram para o crescimento do bem comum”; indicou.
A intervenção identificou a “audácia de fazer o bem” como ponto de partida para “um caminho partilhado também com as instituições laicas, civis e políticas”.
O Papa citou Bento XVI para defender uma “sã laicidade”, indicando que esta “significa libertar a religião do peso da política e enriquecer a política com o contributo da religião, mantendo entre ambas a distância necessária, uma distinção clara e uma colaboração indispensável”.
“Desta forma, sem preconceitos nem oposições de princípio, poderão ser disponibilizadas mais energias e sinergias num diálogo aberto, franco e fecundo”, acrescentou.
A piedade popular, muito enraizada aqui na Córsega, e que não é superstição, faz emergir os valores da fé e, ao mesmo tempo, exprime o rosto, a história e a cultura dos povos. É neste cruzamento, sem confusão, que se concretiza o diálogo constante entre o mundo religioso e o mundo laico, entre a Igreja e as instituições civis e políticas”.
Francisco convidou os jovens a participar “mais ativamente” na vida sociocultural e política, desafiando ainda os responsáveis públicos a “permanecerem sempre próximos do povo, escutando as suas necessidades”.
Após deixar o ‘Palais des Congrès’, o Papa seguiu em veículo aberto até junto da imagem da ‘Madonnuccia’, padroeira de Ajácio, a quem a população local atribui a proteção contra a peste em 1656, numa ilha então sob o domínio genovês.
O programa da manhã prossegue com a recitação do ângelus, na Catedral da Assunção de Maria, com membros do clero e institutos religiosos.
Desde a sua eleição, em 2013, o Papa Francisco fez 47 viagens internacionais, tendo visitado 67 países, incluindo Portugal (2017 e 2023).
OC