«O nosso país vive um desequilíbrio a nível da justiça social. É preciso repensar o país», afirma D. Ildo Fortes
Mindelo, Cabo Verde, 19 fev 2025 (Ecclesia) – O bispo de Mindelo, em Cabo Verde, alertou para a fome no país lusófono, para a “situação gritante” em algumas casas sem luz, água ou casa de banho, e os problemas da população na saúde, segurança e educação.
“Nós precisamos de nos envergonharmos, é uma palavra que o Papa Francisco usa muito. Eu penso que todos nós, Governo, Igreja, temos que nos envergonhar da situação em que nós nos encontramos, como é que irmãos nossos, como é crianças do nosso tempo, vivem nessas situações”, disse D. Ildo Fortes, esta segunda-feira, aos jornalistas, na cidade do Mindelo, na ilha de São Vicente, citado pelo portal Vatican News.
O bispo de Mindelo dedicou três semanas à visita pastoral às três paróquias da Ilha de São Vicente, e, no final, afirmou que em Cabo Verde, “evidentemente, está mal distribuída a riqueza ou a pobreza”, e precisam de “uma política séria para pensar as prioridades da população”.
“Nós sabemos que somos um país pobre, mas temos muitas ajudas; quando nas visitas que eu faço damos conta que há pessoas que não têm assistência a nível da saúde, quando há escolas que não tem coisas básicas para os meninos, perguntamos: o que é que andamos a fazer?”, explicou.
Segundo D. Ildo Fortes, é um problema falar da fome, “em Cabo Verde parece que é um tabu”, porque fome foi nos “anos 40 e 50, mas há gente a passar fome”, e deu o exemplo de uma escola que visitou, às 15h30, onde perguntou ‘todos almoçaram?’ e algumas crianças ainda não tinham almoçado, estavam “à espera que a escola desse a refeição”.
“Isto é inadmissível, o que é isto se não passar fome, é passar privação. Se não posso tomar três refeições no mínimo por dia estou em situação de carência. Nós não aparecemos naqueles jornais ‘gente a morrer de fome em alguns países de África’, mas entre nós há muita miséria”, alertou.
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Para o bispo de Mindelo a pergunta é se não poderiam “emagrecer um bocadinho a máquina do Estado”, porque considera que há muitas despesas “em representações, em coisas do género, e canalizar para quem mais precisa”, porque este país pobre é “um país de ricos”, e se lutaram pela independência contra a exploração exterior não podem admitir que “haja gente a viver bem, com salários chorudos e, às vezes, aumentos”, enquanto outras pessoas ganham o salário mínimo, “um salário de miséria”, e nem são capazes “de num mês fazer uma viagem interilhas”.
“O nosso país, vive um desequilíbrio a nível da justiça social, áreas como saúde, segurança das pessoas, na educação, a meu ver, é preciso repensar o país todo. Repartir pelas ilhas os serviços, os investimentos porque assim todos estarão bem, quando colocamos tudo num só sítio vamos criar um desequilíbrio muito grande”, desenvolveu, na semana que se assinala o Dia Mundial da Justiça Social (20 de fevereiro).
Em Cabo Verde, acrescenta D. Ildo Fortes, a pobreza é um envergonhada, “as pessoas não se dizem pobres”, mas quando entram em algumas casas “a situação é gritante”: “No século XXI, nestes 50 anos da nossa independência muita gente não tem luz em casa, muita gente não tem água em casa, muita gente não tem uma casa de banho”.
Em janeiro deste ano, no dia 8, o bispo de Mindelo disse à Agência ECCLESIA que o Ano Santo 2025, dedicado à esperança, se realizava “num momento crucial” para o arquipélago lusófono, devido aos “momentos difíceis”, como “a pobreza, gente que não vê o sentido da vida, suicídios, muitos atos de violência”, para além dos problemas globais.
A Diocese de Mindelo tem 17 paróquias em cinco ilhas, a ilha de Santa Luzia, está desabitada, mas tem uma capela, confiada aos pescadores, que foi construída em fevereiro de 2017, e benzida por D. Ildo Fortes no ano seguinte.
CB/OC