Igreja/República: Vitalidade do catolicismo no pós-1910 foi «surpreendente», diz bispo do Porto

D. Manuel Clemente considera que as celebrações do centenário permitiram um melhor conhecimento dos campos em confronto

Lisboa, 17 Fev (Ecclesia) – D. Manuel Clemente, bispo do Porto e historiador, afirmou hoje em Lisboa que a “vitalidade” do catolicismo no confronto com a I República (1910), foi “surpreendente”.

“O catolicismo português de há cem anos revelou-se mais consistente do que muitos esperavam”, declarou, na sede da Universidade Católica Portuguesa (UCP).

O prelado falava no colóquio «Sociedade, cultura e conflito nos 100 anos da República Portuguesa», promovido pela Faculdade de Ciências Humanas da UCP, entre os dias 16 e 17 de Fevereiro.

Numa abordagem à relação entre Igreja e República, em 1910, D. Manuel Clemente alertou para “leituras apressadas” e assinalou que o centenário foi “uma excelente oportunidade” para um melhor conhecimento entre as duas partes.

O bispo do Porto falou numa “notável capacidade de resistência” dos católicos portugueses face a um conjunto de medidas “laicizadoras” do novo regime republicano, entre 5 de Outubro de 2010 e a primavera do ano seguinte, coroadas com a Lei da Separação de 20 de Abril de 1911.

Neste contexto, sublinhou a “incapacidade das sucessivas tentativas de implantar uma religião cívica”, que vinham já das primeiras décadas do século XIX; procurando extrair do “espaço público” qualquer referência “confessional”.

Depois de Abril de 2011, verificava-se uma “restrição do culto ao espaço religioso, propriamente dito, que continuasse a existir”, face a um ideário “civil, patriótico e progressista”.

A resistência da Igreja Católica integra-se nesse quadro, com muitos “fiéis” ao lado do episcopado na resistência à Lei da Separação, uma atitude “surpreendente” até para os próprios bispos.

“O que se tinha como fraqueza do catolicismo”, que não resistiria ao embate das medidas republicanas, “deu lugar a uma grande surpresa pela resistência do catolicismo”, disse D. Manuel Clemente.

Este especialista recordou divisões e “profundas tensões internas”, também no seio do republicanismo, convidando a superar “reducionismos”, tanto o “político” como o “cultural”, sobre o catolicismo do início do século XX.

Até à I República e depois da sua implantação, declarou D. Manuel Clemente, o catolicismo foi contando com “novos protagonismos” e sucedem-se “iniciativas que alentaram o novo modo de ser católico”.

“O catolicismo português e ocidental como que se redefinira nalguns pontos maiores”, o que tornou “mais fácil unir os católicos e lançá-los no apostolado comum”, dentro da ordem política vigente, prosseguiu o bispo do Porto.

Essa “insuspeita” militância católica inseriu-se num novo modelo de relacionamento Igreja-Estado, sobretudo após o início da I Guerra Mundial (1914-1918) e da presidência de Sidónio Pais (1917-1918), com a “participação” nas instituições republicanas.

Em conclusão, D. Manuel Clemente considera que os campos em confronto acabaram “mais distintos” e que, 100 anos depois, “continua a ser problemático substituir cruzes por árvores, ainda que seja possível juntá-las”.

Ao longo de dois dias de trabalhos, o congresso abordou temáticas como «A filosofia e as ideias da República», «A sociedade e as dinâmicas da República» ou «A cultura e os espaços públicos da República».

OC

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Agência ECCLESIA

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