Igreja: «Quem dizes que eu sou?» as palavras de Jesus que levaram Sónia Monteiro a doutorar-se em Teologia

A investigação sobre o «perdão» levou a teóloga a viver quase nove anos nos Estados Unidos da América, mas foi na sua aldeia, em Airão São João Batista, Guimarães, que aprendeu a fazer as perguntas que a fazem hoje permanecer numa «Igreja poliédrica»

Foto: Agência ECCLESIA/CB

Lisboa, 14 mai 2025 (Ecclesia) – Sónia Monteiro, jurista de profissão e teóloga com investigação sobre o perdão, assumiu que a pergunta cimeira que tem conduzido a sua vida veio de Jesus – «Quem dizes que eu sou?» e que procura concretizar no estudo teológico.

“Esse desejo de querer saber mais, de fazer perguntas, também se verifica no contexto da Teologia, mas no Movimento internacional do Graal eu percebo que este desejo de saber mais das coisas de Deus, não tinha de ser um desejo que se limitava à minha leitura de livros e que eu deveria dar espaço a isto. Era uma forma de aprofundar, do ponto de vista intelectual, a minha fé”, conta à Agência ECCLESIA.

“Jesus pergunta: vocês, quem é que dizem que eu sou? E quem é que tu dizes que eu sou? É uma pergunta que tem um eco muito grande na minha vida e, eu acho que é essa a pergunta que me faz estudar Teologia”, acrescenta.

Sónia Monteiro esteve quase nove anos em Nova Iorque, na Universidade de Fordham, da Companhia de Jesus, em estudos que desenvolveu em torno do perdão, e assume que ao ler a sua história pessoal, encontra o lugar deste tema como fio condutor da sua vida mas também da vocação.

“A minha forma de responder à vocação primeira, que é a vocação a ser discípula, passava pela Teologia, por articular esta fé e abrir, através da Teologia, a possibilidade de outros fazerem também um encontro com Deus”, traduz.

Para a teóloga, o perdão “é o lugar de encontro” e de “abertura a uma vida nova”.

“Apesar do erro que eu fiz, apesar do mal que eu fiz, apesar do mal que é feito, é possível outra coisa. O mal não é a última palavra. A bondade da criação permanece. É superior ao mal. E existe sempre a possibilidade de recomeçar”, indica.

Sónia Monteiro acredita que o tema «perdão» deve ser conjugado na política, nas áreas económicas e também a Teologia deve olhar sobre ele, procurando contrariar a sua “banalização” ou a forma como “muitas vezes é encarado no sentido do dever”.

“Se verdadeiramente escutarmos as experiências das pessoas, o perdão não é nada banal, é muito difícil, é muito exigente. Um dos objetivos do meu trabalho era como é que devolvemos a beleza deste ato humano que nos foi confiado – como é que falamos dele de uma forma que faça justiça à sua beleza, à sua dificuldade e ao seu mistério? Como é que lhe devolvemos o valor ao mesmo tempo sem colocar mais um fardo nas vítimas ou naqueles que já foram violentados, traídos, ofendidos? Porque quando dizemos tens de perdoar, esse ‘tens’, tem um peso. E se calhar há outra forma de mostrar a beleza sem colocar mais um peso; podemos falar do perdão de uma forma mais libertadora, mais criadora, da possibilidade a que abre, mas que é uma possibilidade que nos convoca a uma liberdade”, convida.

“Em Igreja devemos cuidar mais o discurso, para traduzirmos mais esta beleza e este mistério, e de como ele também nos fala desta gratuidade de Deus e do amor de Deus”, acrescenta.

A teóloga, que regressa a Portugal, olha para o percurso da sua vida, nascida na aldeia de Guimarães, Airão São João Batista, numa família operária nas fábricas do Vale do Ave, onde, a partir das janelas da sua casa, via a igreja, dando-lhe o contexto de crescimento na proximidade e na partilha.

Foi a estudar Direito, na Universidade do Minho, que Sónia Monteiro conhece a Companhia de Jesus, a espiritualidade inaciana, e abre espaço para um momento, que assume ser de viragem, na sua vida quando aceita fazer Exercícios Espirituais, um retiro segundo a proposta de Santo Inácio de Loyola.

Com um grupo de amigos, que partilhavam a espiritualidade inaciana e a vontade de ser discípulos, integra o ‘Magis’, uma experiência que levava o grupo, um fim-de-semana por mês ao interior de Cabeceiras de Basto para formar animadores e animar a celebração da palavra na ausência de presbítero.

“Anos depois, participar no ‘Magis’, ajudou a articular a minha própria experiência paroquial, da minha aldeia, com uma fé mais amadurecida, uma dimensão mais pessoal da fé e, por outro lado, responsabilizou-me sobre a forma de partilha com outras comunidades. Fez-me perceber o sentido de celebrar, de nos reunirmos em torno da palavra de Deus, em torno da nossa fé, mesmo quando não há um sacerdote disponível e que isso é possível”, reconhece.

Sónia Monteiro entende-se participante de uma “Igreja poliédrica”, que os anos nos Estados Unidos da América, mas também os dois anos como leiga para o desenvolvimento em Angola, lhe mostraram, olhando para este momento como “cheio de oportunidades”.

“Uma das frases que mais me marcam no pontificado do Papa Francisco, da encíclica «Evangelii Gaudium », é a da ‘Igreja em saída’, de uma Igreja que pode estar ferida, magoada, mas que arrisca. Não sabe o caminho mas caminha, e chama a uma presença em diálogo com uma cultura que é plural, que é secular. A Igreja não pode compreender-se a partir de um centro e esta atitude de escuta, de humildade, é fundamental se a Igreja quer continuar a dialogar com o mundo”, traduz.

A conversa com Sónia Monteiro pode ser acompanhada esta noite no programa ECCLESIA, emitido esta noite na Antena 1, pouco depois da meia-noite, e disponibilizado no podcast «Alarga a tua tenda».

LS

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