No fim de semana em que decorre em Roma o Jubileu dos Catequistas, e em véspera da apresentação de dois programas de prevenção da violência sexual contra crianças, é convidada da Renascença e da Agência ECCLESIA a coordenadora do Grupo Vita

Entrevista conduzida por Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)
Vamos começar por falar destes programas, o programa Girassol e o Lighthouse Game, que são concebidos pelo Grupo Vita. São um instrumento de prevenção, imagino, em primeiro lugar. Em que é que eles consistem?
Sim, o programa Girassol é destinado a crianças entre os 7 e os 9 anos e o Lighthouse Game um jogo digital para crianças entre os 10 e os 12, porque sabemos que nestas idades tudo o que é digital é também mais apelativo. É importante salientar que a prevenção cabe aos adultos e, por esse motivo, o Grupo Vita tem nos últimos dois anos trabalhado com as mais diversas estruturas da Igreja, no sentido de as capacitar, de as formar, tentando criar aqui uma Igreja mais segura e mais acolhedora.
Estes programas sendo direcionados para crianças até os 12 anos, o objetivo é que envolvam toda a comunidade?
Exatamente. Só queria salientar que às vezes há uma ideia errada de que o envolvimento das crianças seria pôr o ónus da responsabilidade nelas, que eram elas que tinham a responsabilidade de se manter em segurança. Claro que não, a responsabilidade é dos adultos, e a responsabilidade de as manter em segurança é dos adultos e é por isso que temos trabalhado com a Igreja nesse sentido.
No entanto, sabemos, depois de várias décadas de investigação que tem sido feita nesta área, noutros países, que envolver as crianças de forma ativa é especialmente importante, porque elas precisam de ter alguns conhecimentos e algumas competências, não só para saber reconhecer eventuais situações abusivas, mas também para saber reagir e saber como e a quem revelar. Nós também fazemos prevenção rodoviária com as crianças, nós também as ensinamos a saber o que fazer se houver um sismo, e é exatamente na mesma lógica de lhes dar algumas ferramentas e por isso é importante também desconstruir um pouco a ideia que às vezes prevalece de que fazer prevenção da violência sexual envolvente crianças é falar de sexo ou é falar de sexualidade ou de ideologia de género, e não é.
Prevenção da violência sexual é falar de respeito, é falar de segurança, é falar de limites, é falar de consentimento, é falar de ajudar as crianças a saberem distinguir, por exemplo, o que é um toque adequado ou inadequado, o que é um segredo seguro ou inseguro, saber o que fazer nessas situações, saber revelar a quem revelar, o que fazer, se pessoa a quem revela, não acreditar na criança, achar que a criança está a inventar ou a mentir. Portanto, são todas estas competências que são trabalhadas nestes programas de uma forma lúdica, porque as crianças aprendem a brincar de uma forma ativa e envolvendo naturalmente os adultos significativos da criança.
Nesse sentido, pergunto também como é que vai ser feito o acompanhamento destes programas?
Nós agora em outubro vamos abrir já ações de formação, já estão disponíveis no nosso site a partir do dia 30 deste mês estas datas, e, portanto, todas as pessoas, no contexto da Igreja, sejam professores, catequistas, escuteiros, enfim, todo o universo, que desejem implementar estes programas vão receber uma formação online ou presencial, vamos ter as duas modalidades, cada programa tem uma formação de cerca de três horas e só depois é que nós disponibilizamos esse programa.
Depois o que é que nós vamos fazer durante este ano letivo? Nós vamos acompanhar, vamos monitorizar a implementação do programa, não só para perceber se está a ser bem implementado, que dúvidas é que podem surgir e vamos tentar acima de tudo avaliar o impacto, ou seja, o que é que muda nestas crianças, porque nós estamos a falar de um programa e um programa não é uma ação pontual, é algo que é continuado, é um processo. As crianças precisam de tempo para amadurecer as ideias, para consolidar as suas aprendizagens e, portanto, estes programas estão desenhados para serem sequenciais e para serem aplicados, diria que em média, o ideal será uma atividade por semana. São atividades de meia hora, quarenta minutos, que depois estão organizadas naturalmente em função dos diversos temas.
Como dissemos no início, este é o fim de semana dos Jubileus dos Catequistas, que também são uma parte importante ao nível da prevenção do flagelo. Como é que têm corrido os contactos entre eles e o Grupo Vita?
Os catequistas têm mostrado uma disponibilidade muito grande nas várias dioceses do país, no sentido de colaborarem connosco a dois níveis, por um lado pedem formação, pedem ações de capacitação, e de facto temos aqui um universo já de algumas centenas ou talvez milhares de catequistas que têm vindo a ser envolvidos nestas ações pelo país fora. Os catequistas, bem como os professores de Educação Moral e Religiosa Católica, foram também envolvidos na construção destes programas, ou seja, tivemos aqui a preocupação de ir construindo estes conteúdos e que fossem sendo revistos por estes, nós chamamos-lhes embaixadores. Portanto, são pessoas da Igreja que estão relacionadas com a Igreja Católica e que têm naturalmente um conhecimento também muito mais aprofundado daquelas que são as dúvidas que surgem, que é a linguagem que é adequada, e, portanto, tivemos aqui esta preocupação para que toda a Igreja se possa rever nestes programas, porque foram construídos em parceria com a Igreja.
Portanto, estes embaixadores têm aqui um papel importante. Salientar também que estes programas já foram pré-testados com mais de 50 crianças, e tivemos aqui a colaboração de algumas escolas católicas, a APEC (Associação Portuguesa de Escolas Católicas), o SNEC (Secretariado Nacional de Educação Cristã), que têm sido aqui parceiros muito importantes em todo este processo, e as crianças trouxeram aqui um input também importante, naturalmente fizeram sugestões, fizeram críticas e os programas foram também ajustados e melhorados em função desta fase prévia. Portanto, diria que estes programas são aqui um produto de todos, não é só do grupo que o solicita…
E sem as resistências habituais?
Por parte das crianças não há resistências absolutamente nenhumas, aliás, quando fizemos o pré-teste do jogo digital, os miúdos saíram de lá superanimados a dizer quando é que sai o próximo nível do jogo, onde é que está este jogo na App Store? Por parte dos adultos, eu diria que até terem alguma formação, há algumas resistências, há alguma hesitação, que tem exatamente a ver com o tema: será que eu me sinto confortável para abordar o tema? Será que eu sei responder às perguntas dos miúdos?
A partir do momento em que trabalhamos numa ação formativa, estes temas, de uma forma descontraída, sem temas sexuais, porque eu acho que essa é a grande dificuldade, muitas vezes, quando se confunde a prevenção com a sexualidade e com o sexo, e de facto não é disso que se trata. Estes programas trabalham o corpo, trabalham os limites, trabalham os diferentes tipos de toques, segredos, pedir ajuda, no fundo ajudamos as crianças a estabelecer relações saudáveis.
O que eu queria também salientar é que estes programas não vêm de forma alguma, “diabolizar” a Igreja. Ou seja, sabemos que a maior parte dos abusos sexuais não acontece na igreja, acontece em casa, acontece na escola, no fundo acontece no mundo digital, nos contextos onde as crianças estão. E, portanto, estes programas foram desenhados em função disso, e por isso, ao longo de todas as atividades, nós encontramos situações que acontecem em casa, na escola, no desporto, na net, mas também na igreja. Mas também é na Igreja que muitas vezes as crianças, as personagens dos nossos programas, muitas vezes encontram acolhimento.
É muitas vezes ao professor ou ao catequista que pedem ajuda, que revelam. Portanto, é também importante salientar que estes programas naturalmente foram desenhados pensando no contexto da Igreja, e são os primeiros programas a nível mundial que são especialmente desenhados para o contexto da Igreja, é importante salientar isso. Naturalmente há aqui todo um enquadramento da religião, mas depois os temas e a forma como eles são abordados, no fundo seguimos as orientações da literatura que já são de algumas décadas.
Nós vamos olhar agora um bocadinho para o resto do trabalho do Grupo Vita.Há uma associação que protesta, alegadamente, a demora na atribuição da compensação às vítimas dos abusos sexuais na Igreja, entre outras questões. Eu pergunto se encontra razões para este protesto?
Parcialmente encontro. Encontro parcialmente porque, se pensarmos em todo o processo de atribuição das compensações, de facto tem sido um processo moroso, e essa morosidade eu diria que se justifica, por um lado, porque estamos a entrevistar as pessoas que pediram esta compensação, uma a uma. Neste momento já entrevistamos 70 pessoas, de um grupo de 84, sendo que destes 84 houve pessoas que desistiram, houve pessoas que deixaram de contactar, houve pessoas que não se enquadravam no objetivo destas compensações, porque traziam-nos situações de abuso fora da Igreja, portanto não eram aqui enquadráveis, e temos algumas pessoas que pediram a compensação mais recentemente agora no verão, e que estão a ser agendadas agora, setembro, outubro, porque temos pessoas a residir no estrangeiro, e portanto temos que fazer aqui uma conciliação de agendas também com as pessoas, naturalmente, porque vêm a Portugal. Isto implica um conjunto de deslocações, porque estamos a falar do norte a sul do país, Açores e Madeira, porque eram estas e foram, e são, estas comissões de instrução que vão ter com as pessoas ao seu local de residência, e, portanto, estas 70 entrevistas, obrigam a muitas horas da deslocação, estamos a falar também de algumas pessoas que faltaram à entrevista, umas com justificação, outras nem tanto, e as entrevistas tiveram de ser remarcadas. Portanto, esta primeira fase, de facto, foi morosa, porque envolve toda esta logística.
E isso fez derrapar os prazos, de alguma maneira?
Não, não fez, porque se bem nos recordamos, o Grupo Vita, tendo em conta o universo de pedidos que havia, e sabendo as deslocações que havia para fazer, desde o início o nosso compromisso foi, até o final do mês de agosto, 31 de agosto de 2025, que teríamos os parceiros preparados para entregar ao segundo grupo. E não foi por acaso que fizemos um comunicado no dia 1 de setembro, isso foi exatamente para dar conta do cumprimento deste prazo, efetivamente à data de 1 de setembro, e hoje, à data de hoje, temos cerca de 94, 95% dos pareceres prontos para entregar ao grupo de fixação das compensações, e, portanto, esta primeira parte, de facto, foi cumprida, não houve derrapagem.
E esta comissão de fixação de compensações já está a trabalhar, já há alguma definição de valores, de alguma indemnização?
Essa é uma pergunta que tem de ser feita à CEP (Conferência Episcopal Portuguesa), porque efetivamente eu sei quem são as pessoas que o Grupo Vita designou para esse segundo grupo, porque ao Grupo Vita foram pedidas duas pessoas, segundo o regulamento é isso que está previsto. O Grupo Vita designava duas pessoas, a CIRP (Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal) designa uma, a Equipa de Coordenação Nacional designa duas e a CEP designa duas. Isto dá um total de sete pessoas. Essas sete pessoas eu sei que estão identificadas, agora, se já começaram a trabalhar, efetivamente, ou quando é que começam a trabalhar, eu diria que é, de facto, à CEP que isto tem de ser perguntado. Da nossa parte, e quando eu digo da nossa parte, não estou só a falar em nome do Grupo Vita, estou a falar em nome das comissões de instrução, os pareceres estão prontos para entrega.
Eu diria, portanto, que, voltando até um bocadinho atrás, o compromisso da CEP, se bem nos recordamos, foi de que estes processos estivessem terminados até ao final de 2025, dezembro, e estamos em setembro. Portanto, aqui também não há derrapagem, diria eu. Eu compreendo que na perspetiva de algumas vítimas, de facto, isto é muito tempo, é verdade, há vítimas com quem eu falei há quase um ano, há quase um ano que eu entrevistei algumas pessoas, em outubro, novembro, e portanto, aí eu percebo, não é, mas de qualquer das maneiras, sempre foi dito a todas estas pessoas, os prazos que estavam previstos, tendo em conta o número de pedidos que havia, portanto, esta é a parte…
Haverá razões para protesto, então, para depois de dezembro, digamos assim?
Sim, diria que sim, sim, diria que depois de dezembro há razões, penso eu, para que, de facto se venha aqui cobrar este prazo que a CEP apresentou.
Esta é a parte em que eu concordo com este protesto, com esta manifestação. Há outra parte de algumas críticas que têm vindo, ao de cima…
Com acesso ao parecer, por exemplo, a possibilidade ou não de aceder ao parecer?
Sim, com acesso ao parecer, ou a forma como as entrevistas são conduzidas. Algumas pessoas disseram inclusive que nós obrigámos a assinar um termo de confidencialidade, enfim, há aqui algumas distorções: aquilo que nós pedimos às pessoas, e parece-me que é um bocadinho obvio é que antes de fazer uma entrevista assinem um termo de consentimento informado. Consentimento informado significa que sabem o regulamento, que o conhecem, e quem não conhece nós lemo-lo com a pessoa ali ao nosso lado, explicamos, que nos autoriza a recolher dados, porque temos aqui um regime de proteção de dados, e, portanto, eu tenho de ter autorização da pessoa para poder escrever, tirar notas daquilo que a pessoa está a dizer, e para poder passar esta informação a um relatório para um segundo grupo.
E também com este compromisso, é isso que esse consentimento informado diz, de que no final de tudo isto, até três meses no final do processo, toda esta informação é destruída exatamente para garantir a privacidade. Portanto, este é o termo de consentimento que as pessoas assinam no início, sendo que algumas pessoas levaram cópia, porque pediram, outras pessoas tiraram fotografia com o telemóvel, não há problema absolutamente nenhum, é um termo de consentimento informado, sem o qual nós não avançamos. Depois, a forma como as entrevistas têm sido conduzidas, eu lamento, de facto, ler algumas inverdades, de uma forma muito explícita, que algumas vítimas alegam. Nunca foi perguntado a ninguém se doeu. Eu estava nessa entrevista e a pessoa que estava comigo na comissão de instrução perguntou o que é que sentiu.
Nunca foi pedida a nenhuma vítima, também estava nessa entrevista, que mostrasse como é que foi o toque abusivo. Isso seria manifestamente desadequado, até porque nós não vamos pedir a alguém para mostrar uma situação que foi abusiva, seria repeti-la. Aquilo que foi pedido foi que a pessoa clarificasse, porque a pessoa disse, ele tocou-me, e nós perguntamos, tocou onde?
Há uma coisa muito importante que é preciso clarificar. O segundo grupo de atribuição das compensações não vai ter oportunidade, não vai falar com as pessoas. Se restarem dúvidas ao segundo grupo de atribuição de compensações, na dúvida pode haver uma não atribuição de compensação.
Portanto, este material da entrevista é fundamental para a decisão do segundo grupo?
Claro, é fundamental que a informação vá com a clarificação possível e as perguntas que nós fazemos são de clarificação, porque se alguém disser, o padre tocou-me, se tiver tocado no ombro ou se tiver tocado na cabeça, isso não configura crime de natureza sexual. Portanto, eu percebo que seja difícil, e isso é explicado às pessoas, nós percebemos que é difícil falar sobre isto, é difícil clarificar determinadas questões, mas sem esta clarificação o meu receio é de que o segundo grupo possa arquivar alguns processos dizendo que não há lugar a compensação porque não se configura informação suficiente para concluir pela existência de um crime sexual. O sr. António Grosso, e digo o nome dele porque ele também, no fundo, refere-o de forma explícita na comunicação social, também diz uma inverdade muito significativa quando diz que foi escalpelizada a situação de abuso quando lhe pediram para falar da situação de abuso. Tendo em conta os inúmeros relatos que esse senhor já fez na comunicação social e que são públicos, não foi feita uma única pergunta sobre o abuso sexual a esse senhor. Esse senhor quis, sim, dizer algumas coisas por sua espontânea vontade. Receio é que às vezes a forma como estas informações são trazidas ao de cima de facto suscitem muitas dúvidas em todas as outras pessoas que até podem estar a pensar em pedir uma compensação, em pedir um processo de ajuda e possam ficar inibidas, porque efetivamente no universo de 70 entrevistas identificamos cerca de 4 pessoas que nos disseram de forma clara que não se sentiram bem, que não gostaram da entrevista, que teriam prescindido daquele momento e que não concordavam com a forma como o processo estava a ser conduzido. Quatro em 70.
Tenho pena que as outras 66 não são entrevistadas porque não dão a cara, porque preferem manter e bem o seu anonimato, a sua privacidade, mas gostaria que ficasse claro que aquilo que algumas vítimas dizem não é representativo da forma como a maior parte se sente e sentiu.
O Grupo Vita continua a receber queixas de abuso. Há casos recentes e já agora, se sim, estão todos relacionados com a Igreja?
Sim, nós continuamos, a última recebi ontem à noite. Nós continuamos a receber processos de ajuda, pedidos de ajuda por parte de vítimas, nem todos relacionados com as compensações financeiras. Nós temos 84 pedidos de compensação até o momento e pediram-nos ajuda já há mais de 140 vítimas, portanto temos aqui um universo de vítimas que não pede esta compensação, pede apoio psicológico, pede apoio psiquiátrico, pede apoio espiritual também.
Por vezes sim, também este ano em 2025 também tivemos cerca de 10, 12 situações em que fomos contactados por situações que não tinham absolutamente nada a ver com a Igreja, situações de abuso intrafamiliar ou de abuso na escola ou até de assédio laboral, portanto violência doméstica. Sim, continuamos a ser procurados e aí naturalmente o que fazemos é depois encaminhar para as entidades competentes, porque não é a missão do Grupo Vita esse tipo de situações.
Nós vamos já caminhando para a reta final desta entrevista, muito brevemente, não sei se teve a oportunidade já de ver o livro/entrevista do Papa Leão XIV que saiu sobre vários temas. E ele fala especificamente da vontade de prosseguir o caminho deixado por Francisco no combate aos abusos sexuais, dando atenção às vítimas. Há também uma intenção que ele diz que segue de Francisco, de não fazer disto o foco central da vida da Igreja. Pergunto que entendimento tem da posição do Papa?
O meu entendimento, até o momento, daquilo que já ouvi ou li, é de que há aqui o desejo e a disponibilidade para manter aqui uma continuidade e como disse alguém outro dia, acho que neste momento já não se faz marcha atrás, já não dá para voltar atrás. Este processo está em andamento, receio que possa não ter o mesmo fôlego que teve com o Papa Francisco, mas efetivamente as coisas também têm o seu tempo e também é importante dar tempo ao tempo e perceber como é que o nosso Papa, neste momento, pretende conduzir estes processos.
Aquilo que eu sinto aqui na Igreja em Portugal, sinto que ainda andamos a compassos muito diferentes. Nem todos os bispos, nem todas as congregações, de facto, veem esta problemática da mesma forma, apesar de ver uma evolução positiva nos últimos dois anos. Hoje a realidade é muito diferente do que era em maio de 2023, quando o Grupo Vita começou. A Igreja é uma engrenagem morosa, complexa e, portanto, os processos de mudança não acontecem do dia para a noite, é preciso tempo.
Nós estamos a falar de uma mudança de cultura na Igreja, uma mudança de paradigma, não é apenas de identificar as vítimas que já foram identificadas, encaminhar e agora compensar financeiramente. Há todo um processo de mudança muito mais estrutural que está em marcha e que naturalmente demora o seu tempo e, portanto, acredito que nos próximos anos esse processo tem necessariamente de se manter.
Eu queria terminar com o congresso que o Grupo Vita vai organizar a 27 de novembro em Fátima, com o objetivo de refletir sobre o percurso realizado até aqui, no que concerne a este combate aos abusos sexuais na Igreja Católica. Eu perguntava-lhe quais são os objetivos desta iniciativa?
Os objetivos deste congresso, que é internacional, portanto, temos alguns convidados estrangeiros e destaca apenas o padre Hans Zollner, do Vaticano, e destaco Marie Keenan, da Irlanda, e também alguém da Porticus, a Irene Salgado, portanto, estamos a falar de parceiros que têm muitos mais anos de experiência nesta problemática, noutros países. O grande objetivo é também trazer aqui algum input de quem já tem um caminho mais longo do que o nosso, é cruzar olhares, é cruzar perspetivas, é partilhar saberes e é providenciar aqui ou potenciar uma reflexão conjunta. E, por isso, nós temos uma parte da manhã com mesas, portanto, que se vão sucedendo e depois à tarde temos a oportunidade de ter workshops temáticos, em grupos mais pequenos para se poder aprofundar algumas temáticas e, no fundo, também rentabilizar ao máximo os nossos convidados que trazem aqui a sua experiência e a sua sabedoria e que queremos também beber dela e aprender e trabalhar em conjunto. O Grupo Vita tem estabelecido parcerias, nos últimos meses, muito importantes com alguns países, com a Espanha, com o Brasil, com a Bélgica e, portanto, estamos aqui também a tentar criar aqui uma rede de trabalho, porque, efetivamente, pois naturalmente cada país tem a sua especificidade, mas há aqui variáveis que são muito transversais e podemos aprender todos uns com os outros e crescer juntos nesta parceria, neste trabalho em rede.