Igreja/Portugal: Encontro Nacional sublinhou «aspetos essenciais da sociedade» que interpelam missão da Vida Consagrada

Programa passou pelo desafio do mundo digital e da inteligência artificial, desafios da sinodalidade, interculturalidade e intergeracionalidade

Fátima, 14 fev 2024 (Ecclesia) – A Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal (CIRP) realizou, entre 10 e 13 de fevereiro, a jornada nacional de estudos da Vida Consagrada, este ano dedicado aos “desafios da sociedade atual”.

“O tema foi neste horizonte de retomar alguns aspetos essenciais da sociedade de hoje que nos interpelam na nossa vida e na nossa missão; escolhemos estes desafios da sociedade atual à Vida Consagrada e as várias conferências vão a vários âmbitos principais: olhar para o presente e para o futuro”, explicou o padre Manuel Barbosa, da Comissão da Semana de Estudos da Vida Consagrada da CIRP, à Agência ECCLESIA.

Os trabalhos, que decorreram em Fátima, incluíra reflexões como ‘a sociedade atual portuguesa’, a ‘profecia da Vida Consagrada’, ‘o desafio do mundo digital e da inteligência artificial’, ‘os novos areópagos da profecia’, ‘A tarde do cristianismo de T. Halik. Desafios e pistas’, ‘desafio da mística e da espiritualidade’, ‘desafio da sinodalidade’ e da ‘hospitalidade’.

“A abertura foi uma análise da sociedade que muitas vezes vemos como lugar em contraposição. A sociedade e o mundo naturalmente têm os sinais dos tempos, que nos interpelam e devemos olhá-lo no sentido positivo, aquilo que nos interpela não como contraposição mas como algo onde estamos inseridos, e temos de ser profecia concreta”, desenvolveu o padre Manuel Barbosa, sacerdote dehoniano.

Conferencista no 39.º Encontro Nacional da Vida Consagrada, o padre Jerónimo Trigo, professor na Faculdade de Teologia da UCP, assinalou que dizer consagrado tem uma “dimensão teológica no sentido em que percebe que há um chamamento divino e se dá uma resposta neste contexto”, e a partir dai essa “dimensão teológica não se pode escamotear”.

“Estas temáticas que se põem na sociedade e na Igreja são temáticas que nos afetam também, dai a necessidade de uma formação mais específica para as enfrentar, não basta uma dimensão interna, mas é necessário ter o conhecimento e a sensibilidade para a realidade social na qual estamos inseridos”, acrescentou.

O padre Jerónimo Trigo apresentou uma reflexão sobre a ‘formação da consciência crítica’ e observou que todos evocam a palavra consciência que, naquele contexto, “significa a interioridade profunda da pessoa”, de alguma maneira “despojada de referências exteriores” e que tem alguma “referência a Deus”.

“Que nos fala no íntimo de nós próprios. Podemos chamar-lhe ‘coração’, como diz a Bíblia, podemos chamar ‘consciência’, numa linguagem mais grega. Mas tem a ver com uma dimensão profunda, íntima, e, às vezes, até despojada de interesses exteriores e também uma dimensão com outras pessoas”, desenvolveu o professor universitário.

Na Igreja Católica, a Vida Consagrada é constituída por homens e mulheres que se comprometeram, pública e oficialmente, a viver (individualmente ou em comunidade) os votos de pobreza, castidade e obediência para toda a vida, em Institutos de vida consagrada – religiosos, monásticos, contemplativos, seculares, novos institutos, a Ordem das Virgens, os eremitas – e as sociedades de vida apostólica; inclui leigos, sacerdotes, religiosas e religiosos.

O painel ‘O desafio da interculturalidade e da intergeracionalidade na Vida Consagrada’, juntou três religiosos com diferentes idades, experiências e origens, e foi coordenado pelo padre Manuel Barbosa, que destacou que esta “é fundamentalíssimo e não é totalmente novo” esta reflexão, sendo preciso “compreender esta realidade”.

“É preciso transformar, é preciso ter uma atitude de mente, de coração, no sentido de conversão, quando falamos em comunidades geracionais e interculturais, ou multiculturais: Numa comunidade há várias gerações, a idade, há culturas diferentes, e não é uma questão só de facto, mas tentarmos trabalhar, procurar a escuta, o acolhimento”, explicou o sacerdote dehoniano.

João Souza, da Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos), é natural do Brasil e lembra que enquanto pessoas não são “objetos isolados”, mas são constituídos também pela cultura, pelas vivências, “que são também a história”.

“Eu sinto que o grande desafio é favorecer uma cultura de encontro em que não nos anulemos mutuamente, mas façamos com que a aquilo que trago do Brasil mas recebo cá dos meus confrades portugueses, de Moçambique, dos Camarões, sirvam de resposta não apenas para nós, enquanto comunidade, mas também para o mundo”, disse à Agência ECCLESIA.

O religioso acrescenta ainda que o contacto com outras culturas “é muito importante” porque permite perceber que “o carisma está para dentro daquilo que são as peles das culturas, o carisma encarna numa cultura muito específica, no sentido de dar uma resposta ao mundo a partir da intuição evangélica”.

A irmã Maria Teresa Ramos, Franciscana Missionária de Maria, viveu 18 anos na Rússia, em São Petersburgo, de 2000 a 2018, e recorda que esta cidade russa é uma “porta para o Ocidente em relação à Rússia”, “é um ‘melting pot’” onde se encontram “todas as culturas, todas as raças e grupos étnicos”.

“Foi um momento de se poder viver esta interculturalidade e internacionalidade, mesmo em termos da congregação, era uma das primeiras missões, ser uma parábola de interculturalidade e internacionalidade e com as diferenças construir comunidade e ser testemunha de Jesus Cristo na Igreja Católica presente na Rússia”, explicou, em declarações à Agência ECCLESIA.

Segundo a irmã Maria Teresa Ramos, que já tinha partilhado esta missão nas ‘Conversas Além-fronteiras’ no outubro missionário de 2021, assinalou que num país onde os católicos são minoria também tinham “alguma coisa a partilhar à Igreja maioritária”, a Igreja Ortodoxa Russa.

“Mas temos também muito a aprender, pelo que sofreu, pelo que passou, independente das questões políticas, põe-nos no nosso lugar em relação a Deus e em relação ao mundo; aprendi muito com a espiritualidade ortodoxa e oriental. Enriqueceu-me muito o intercâmbio de culturas e espiritualidades; como franciscana ensinou-me na minoria a ser menor”, desenvolveu.

A Franciscana Missionária de Maria exemplifica ainda, neste contexto de minoria, que quando chegou à Rússia faziam encontros e se iam “quatro pessoas” ficavam “todos contentes”, uma experiência que a marcou “bastante” porque aprendeu “a relativizar as certezas”.

OC/CB

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Agência ECCLESIA

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