Missionário passionista e investigador sociopolítico pede apoio da comunidade internacional
Ocua, Moçambique, 02 fev 2025 (Ecclesia) – O padre Kwiriwi Fonseca, missionário passionista e investigador sociopolítico de Moçambique, considera que o país precisa de soluções que envolvam todas as partes para superar as crises política e humanitária.
“Eu vivi de perto muita fome nas aldeias, sinto vergonha de passar lá”, refere o convidado da entrevista semanal conjunta Ecclesia/Renascença, emitida e publicada aos domingos.
“Estamos a viver uma crise humanitária”, insiste.
O religioso falou desde Cabo Delgado, norte de Moçambique, onde o ciclone tropical Chido, do último mês de dezembro, provocou a destruição de casas, infraestruturas, capelas e postes de eletricidade, deixando população sem água e energia em alguns distritos.
“Aqui na região assolada pelo ciclone não vimos nenhuma ajuda, em muitos lugares ainda não tem chegado a ajuda”, alerta.
O padre Kwiriwi Fonseca realça que a falta de chuva, a fome e a violência levam o povo ao “desespero”.
“O povo hoje não tem o que comer e muitas das palhotas ainda estão destruídas, muitos ainda não conseguiram erguer com as poucas condições que têm”, relata.
O entrevistado comenta ainda o impacto das manifestações dos últimos meses em Moçambique, com barricadas, pilhagens e confrontos com a polícia, já terão provocado mais de 300 mortos e 600 pessoas feridas, segundo organizações da sociedade civil.
“O problema hoje em Moçambique é sério”, indica o investigador sociopolítico, para quem a criação de uma estrutura de diálogo, com a ajuda da Igreja Católica, “seria um bom caminho”.
“Se se organizasse uma comissão que pudesse somar, junto com a Conferência Episcopal de Moçambique, para dar passos de diálogo, conversas com todos os envolvidos, todos os atores políticos, sociais, acredito que se poderia encontrar esse processo de cura”, refere.
Após a divulgação dos resultados das eleições de 9 de outubro, que deram a vitória a Daniel Chapo, a Procuradoria Moçambicana decidiu abrir um processo contra o candidato presidencial Venâncio Mondlane, líder da oposição, por subverter princípios do Estado democrático.
“Há falta de coragem, há falta de vontade, há falta de compreensão de que o povo acreditou na força política de Venâncio”, afirma o padre Fonseca.
Para o religioso, Moçambique continua com “problemas antigos, problemas colocados debaixo do tapete”.
“O país precisa de paz”, sustenta, desejando que o presidente moçambicano e o líder da oposição possam dialogar, cara a cara, “de forma aberta”.
Quanto ao papel da Igreja, o missionário passionista entende que “não deve ficar sossegada, não se deve calar”, repetindo apelos em favor da paz e da justiça.
“Não se deve pensar que já fizemos o suficiente, enquanto continuar não há como calar a boca”, acrescenta.
A conversa decorreu desde Santa Cecília de Ocua, a paróquia 552 da Arquidiocese de Braga, em resultado de um projeto de cooperação entre a arquidiocese portuguesa e a diocese de Pemba.
“A equipa missionária tem feito trabalho não só da evangelização, mas de atuação na área social”, refere o padre Kwiriwi Fonseca.
Questionado sobre a violência no norte do país, o sacerdote católico diz que se “usa a religião para se esconder aquilo que os terroristas querem”.
“É um instrumento, ou disfarce, para que as pessoas pensem que se trata de uma guerra religiosa”, denuncia.
Para o entrevistado, é necessário que, “em cada paróquia, em cada encontro” se promova o diálogo inter-religioso, evitando o agravamento das tensões.
Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (ECCLESIA)