Igreja: Livro-entrevista do Papa alerta para «perversão da religiosidade» que leva ao terrorismo e fundamentalismo

Francisco diz que gostaria de deixar Igreja «distante dos interesses mundanos e próxima do povo»

Foto: Lusa/EPA

Cidade do Vaticano, 25 out 2023 (Ecclesia) – O Papa alertou para a “perversão da religiosidade”, que leva ao terrorismo e fundamentalismo, no livro-entrevista ‘Non sei solo. Sfide, risposte, speranze’ (Não estás só. Desafios, respostas, esperanças), publicado esta terça-feira, na Itália.

“A ideologização do elemento religioso, o que na África se chama Islão radical, é um problema e representa uma perversão da religiosidade”, refere Francisco.

A conversa é conduzida pelos jornalistas Francesca Ambrogetti, ex-responsável da Agência Ansa na Argentina, e Sergio Rubin, do jornal ‘El Clarin’, que em 2010 publicaram o livro ‘El jesuita’ (2010), sobre a vida e pensamento do então arcebispo de Buenos Aires, cardeal Jorge Mario Bergoglio.

Questionado sobre a Igreja que “gostaria de deixar”, Francisco fala numa Igreja “materna”, como aquela que o acolheu.

“Gostaria de deixar uma Igreja evangélica, com espírito evangélico. Uma Igreja próxima de Jesus através do Evangelho, da oração e da Eucaristia. Uma Igreja, em última análise, distante dos interesses mundanos e próxima do povo, que é um serviço à sociedade porque, caso contrário, torna-se o serviço do poder”, precisou.

Francisco reforça alguns dos apelos lançados em mais de 10 anos de pontificado, convidando a “ultrapassar preconceitos” na relação com quem deixa a sua terra, “por parte de quem acolhe e dos próprios refugiados, que devem esforçar-se e abrir-se a um novo contexto cultural”.

“O problema na Europa é que se estão a formar guetos de imigrantes nalgumas cidades”, adverte.

O Papa mostra-se preocupado com os jovens a quem são “fechadas na cara todas as portas, pelo simples facto de terem origens diferentes”.

Parece-me uma atitude irracional passar de um certo medo ao terror e fechar as fronteiras. Por que não sentamos e analisamos como podemos agir em prol da integração? E por que não estabelecemos também quantos podemos integrar?”

O Papa fala das consequências do colonialismo e, em particular, da apropriação dos recursos naturais, criticando o “fracasso do Ocidente na sua tentativa de exportar o seu próprio tipo de democracia para certos países”.

Francisco alude à situação na Síria como exemplo das crises provocadas pelos conflitos armados e a falta de respostas da comunidade internacional.

“Tudo o que aconteceu lá é horrível, fruto de uma mistura de guerras em que escolas e hospitais foram usados como escudos humanos, com grande número de mortes de civis”, lamenta.

A conversa alude à defesa da vida “em todas as suas fases, desde a conceção até à morte natural”, pedindo compromissos concretos, do ponto de vista político e económico.

“Não basta opor-se ao aborto e, depois, deixar de interessar-se pela mulher que se vê a braços com uma gravidez indesejada”, adverte.

O cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, então com 76 anos, entrou para o conclave de 2013, a 12 de março, e foi eleito no dia seguinte como sucessor de Bento XVI, assumindo o inédito nome de Francisco.

A obra ‘Non sei solo’ tinha sido lançada na Argentina, com o título ‘El Pastor’, por ocasião do 10.º aniversário de pontificado, tendo o Papa assumido que este “será avaliado em grande parte” pela forma como enfrentou a crise dos abusos sexuais de menores e valorizou o “grito silencioso” das vítimas.

As conversas abordam temas ligados ao matrimónio e a família, ecologia, papel das mulheres na Igreja ou aspetos pessoais, como a viagem à Argentina, que Francisco quer realizar.

“Quando me perguntam como me defino, respondo ‘um padre’. É a minha vocação”, afirma.

O Papa rejeita a ideia de uma “solidão do poder” e diz que estaria disposto a visitar a China “amanhã”, se isso fosse possível.

OC

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Agência ECCLESIA

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