Aparentemente inúteis, os Mosteiros de Clausura são “oásis” que fazem bem a toda a humanidade. Esta foi a mensagem que Bento XVI deixou no passado Domingo para a jornada “pro orantibus” que a Igreja celebra hoje, para agradecer ao Senhor pelo dom de tantas pessoas que, nos mosteiros e nas ermidas, se dedicam totalmente a Deus na oração, no silencio e no escondimento. “Os mosteiros de vida contemplativa oferecem-se-nos como oásis nos quais o homem, peregrino sobre a terra, pode melhor atingir as nascentes do Espírito e repousar ao longo do caminho. Estes lugares, portanto, aparentemente inúteis, são ao contrário indispensáveis, como os pulmões verdes de uma cidade: fazem bem a todos, mesmo àqueles que não os frequentam ou mesmo ignoram a sua existência”, apontou. Esta Jornada acontece na memória litúrgica da apresentação de Nossa Senhora no templo. Bento XVI recordou que também nos nossos dias – e frequentemente para surpresa de familiares e amigos – “não poucas pessoas abandonam carreiras profissionais muitas vezes prometedoras para abraçar a regra austera de um mosteiro de clausura”. “O que é que as impulsiona – perguntou ainda o Papa – a dar um passo de tão grande compromisso senão o facto de ter compreendido, como ensina o Evangelho, que o Reino dos céus é um tesouro pelo qual vale verdadeiramente a pena abandonar tudo?”. “Estes nossos irmãos e irmãs testemunham silenciosamente que no meio das vicissitudes quotidianas, ás vezes bastante convulsas, o único apoio que não vacila é Deus, rocha inquebrantável de fidelidade e de amor”, disse. Profissão em Portugal No Sábado passado o Mosteiro de Santa Beatriz da Silva, em Viseu, esteve em festa. Longe do bulício da cidade, esta comunidade religiosa faz a experiência do silêncio numa vida completamente dedicada a Deus. São irmãs de clausura como normalmente as chamamos, irmãs que com a sua entrega e doação radical levam os homens até Deus e trazem Deus até à vida dos homens. A Irmã Maria Helena, de 25 anos de idade, filha desta comunidade intitulada Ordem da Imaculada Conceição, fundada pela nossa compatriota Santa Beatriz da Silva, realizou os seus votos perpétuos de obediência, pobreza, castidade e clausura. A alegria e a tranquilidade, de quem se doa a Deus, estavam impressos no seu rosto. Poder-se-á afirmar que Maria a envolvia em seu manto azul imaculado. Muitos foram os que acorreram ao Mosteiro. Este tornou-se pequenino para tantos que quiseram participar deste sacramental. Presidiu à celebração o Bispo de Viseu, D. Ilídio Leandro, e concelebraram com ele uma vintena de sacerdotes provenientes desta diocese, de Lisboa, Lamego e Portalegre-Castelo Branco. A Irmã Maria Helena natural de Pregança, Patriarcado de Lisboa, ingressou com dezanove anos neste convento. A sua ternura para com Maria, a Mãe Imaculada, a vontade de abraçar Deus em maior intimidade foram sinais de eleição que a levaram a optar por esta Ordem da Imaculada Conceição, que embora seja de raiz portuguesa, talvez ainda seja pouco conhecida no nosso país. Mas os desígnios de Deus são insondáveis! Num tempo em que os critérios de escolha nem sempre nos põem diante de Deus, encontramos alguém capaz de nos interrogar pela sua opção: «O silêncio que me proporciona a Clausura para o encontro com Deus é a fonte de harmonia que envolve toda a minha vida. Que me impele a levar na patena da oração ao Pai, cada homem. Encontrei o sentido para a minha vida nesta Ordem contemplativa. Quero que Deus seja o tudo da minha vida, e dessa forma seja também para aqueles que Ele vai pondo no meu caminho.» Pe. Paulo Ferreira OFM Testemunho “Deus olhou-me com misericórdia…toda a minha vida se transformou…” Gostaria com este artigo de transmitir o que pode ser uma vida tocada por Deus. Isto porque a alegria que levo dentro é maior quando é partilhada… Eu sou a Irmã Maria Helena e pertenço à Ordem da Imaculada Conceição, que está cá em Viseu, como única presença exclusivamente contemplativa. Se há uma expressão que defina a minha experiência vocacional é sem dúvida a já conhecida frase de Jesus: “Não fostes vós que me escolhestes; Fui eu que vos escolhi a vós…” (cf. Jo 15, 16a). Ao contemplar a minha vida vejo claramente que nada foi fruto do acaso, TUDO foi conduzido pela mão de Deus, como um Pai conduz o seu filho. Nasci no seio de uma família cristã e fui introduzida na vida de fé sobretudo pela minha mãe e pela minha avó. Era apenas uma jovem no meio de tantas outras. Gostava muito de estar com os amigos a conversar, de ouvir música, de ver televisão, … Mas havia algo mais que me atraía, … o silêncio, pequenos momentos de oração ou simplesmente olhar para o crucifixo. Transmitia-me paz…e gostava principalmente de o fazer quando estava sozinha no meu quarto, sentia de alguma forma sede de solidão e silêncio, mesmo não lhe dando nome e guardando-o só para mim. Outro ponto importante da minha vida foi experimentar que cada ano na escola, uma nova amizade, os problemas normais da vida, … cada coisa nova que surgia, ou mesmo obstáculos que tinha de ultrapassar, para alcançar algo de que gostava ou me parecia bom para mim, no fim perdiam aquele valor inicial. E acabava por viver tudo sem outro valor que o de uma etapa para algo mais… o meu lugar no qual seria realmente feliz. Dentro de mim, no mais profundo do meu ser ficava um vazio que era de certo modo, uma preparação para esse algo mais para o qual Alguém me ia levando. Apesar de ser ainda muito nova, pois percebi tudo isto muito cedo (mesmo não o sabendo expressar assim), tudo isto ecoava dentro de mim, … mas o mundo tem muitas vozes e eu muitas vezes escutei-as e deixei-me levar… Mesmo assim, Deus, como bom artista, com as circunstâncias da vida, ia moldando o meu ser, … cada situação foi um presente do seu Amor, ainda que só agora saiba reconhecer o seu grande valor, o seu significado mais profundo. Assim quis o Senhor… Por volta dos dezasseis anos conheci a Vida Contemplativa por meio de um sacerdote, que me acompanhava espiritualmente. O “mistério” que envolvia a vida destas Irmãs surpreendeu-me, pois me falava de uma profunda intimidade com o Senhor. O silêncio atraía-me… E além disso era uma Ordem Mariana. Maria teve, e tem actualmente, um papel muito importante na minha vida. Percebi muitas vezes a sua ajuda silenciosa e discreta, é uma verdadeira Mãe e aquela que melhor nos pode levar a Cristo, pois foi a sua primeira discípula, … caminhou na Fé. Depois deste pequeno parêntesis… eu estava a terminar o último ano antes de entrar na Universidade, e com resultados razoáveis, … mas como eu disse antes era só uma etapa… Passado um ano entrei no Mosteiro e ainda que tenha passado por algumas dificuldades, reconheço que Deus pode mais, imensamente mais, do que podemos pedir ou imaginar, e DE TUDO E SEMPRE TIRA O BEM. Todo o caminho inicial de formação foi marcado por abundantes graças que são difíceis de expressar. Foram momentos de abertura ao Amor, de grande intensidade para a minha vida humana e espiritual. Só posso proclamar com Maria: “O Senhor fez em mim maravilhas”. E o Senhor continua a sua obra… Agora… chegou o momento da minha Profissão Solene, da entrega total ao Senhor. Encontro-me diante do passo mais definitivo da minha vida, isto porque o horizonte que se me depara é imenso, absoluto e eterno, mas a responsabilidade é traduzida pelos pequenos passos diários de uma vida entregue. Percebo-me débil diante do que prometo, mas percebo que sou acolhida maternalmente… pois por Maria entrego a minha vida ao Senhor, ponho a minha mão na sua e confio. Como gostaria de expressar o que pode acontecer a uma alma que se entrega a Deus… Ele conhece-nos por dentro, não com um conhecimento que nos julga, mas sim com um conhecimento amoroso. Ele ama-nos tal como somos, não espera que sejamos melhores para nos amar… Percebi nesta caminhada já realizada, que é de Deus que aprendemos a Amar e a amarmo-nos sem condições nem preconceitos. Por isso entregar-se a Ele é a melhor maneira de viver em plenitude, … de VIVER VERDADEIRAMENTE. Porque será que uma pessoa consagrada emite os votos de Pobreza, Castidade e Obediência, pergunto-me eu a mim mesma, para lhe dar a minha resposta pessoal?! Identificação mais perfeita com Cristo, o Consagrado, Sim. Mas nesta base deve ser traduzido o meu dia a dia – como dizia mais acima – em cada gesto, palavra ou sorriso… Estes pilares da consagração tocam profundamente as raízes do meu ser e levam-me a ser uma nova criatura… É a Pobreza de aceitar ser o que se é, deixando-se moldar pela acção de Deus na nossa história. É a Castidade de amar com o coração de Deus o irmão que temos ao lado. De fazer actos de amor das coisas mais simples do dia a dia. É a obediência de perceber nas vozes da Igreja, dos superiores, dos irmãos e dos acontecimentos do mundo a voz de Deus, a Sua Vontade. É, por fim, a Clausura de ser reservada só para Deus, de dedicar-me exclusivamente a Ele e por isso ter um coração dilatado para abraçar a humanidade, cada homem em particular e de levá-los na patena da oração à Presença do nosso Pai. Tudo isto não é algo já feito e plenamente interiorizado; não são actos que se realizam automaticamente depois de os prometer… são edificação diária, semente que amadurece ao sol e à chuva e também ao vento do Espírito que a vai levando para onde e como Deus quer. Tudo isto se resume em “duas ou três” palavras-chave: Deus Trindade, Maria e os irmãos. Descobri Deus como o mais importante da minha vida; Cristo como o exemplo apaixonante a imitar, exemplo de plenitude de vida. O Espírito Santo como o fiel inspirador dos meus actos, suave Presença de Deus Amor. Maria é a companheira fiel, a Mãe atenta aos acontecimentos do meu viver. Por tudo isto percebi os homens como irmãos. Agora… é só tornar-se VIDA cada dia. Irmã Maria Helena Martins Alexandre – Convento de Santa Beatriz da Silva Ordem da Imaculada Conceição (O.I.C.)