Religiosa foi declarada venerável, pelo Papa Francisco, em 2023
Lisboa, 12 fev 2025 (Ecclesia) – A irmã Lúcia de Jesus, considerada como a memória das Aparições de Fátima, entre maio e outubro de 1917, morreu a 13 de fevereiro de 2005, aos 97 anos de idade, depois várias décadas vividas em clausura no Carmelo de Coimbra.
20 anos depois, o seu processo de canonização decorre no Vaticano, tendo sido reconhecida como venerável, em junho de 2023, com a publicação do decreto que reconhece as “virtudes heroicas”.
“A distinção entre a vida da Venerável Serva de Deus e as Aparições é difícil, porque muito do seu sofrimento se deveu a elas: esteve sempre escondida, protegida, guardada. Vê-se nela toda a luta para manter unidas a excecionalidade dos acontecimentos que presenciou e a normalidade de uma vida monástica como a do Carmelo”, referea Santa Sé.
Esta é uma fase do processo que leva à proclamação de um fiel católico como beato, penúltima etapa para a declaração da santidade; para a beatificação, é agora necessária a aprovação de um milagre atribuído à intercessão da religiosa carmelita.
Lúcia Rosa dos Santos, mais tarde a irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, nasceu em Aljustrel (Fátima), a 28 de março de 1907; foi batizada dois dias depois, a 30 de março, e fez a primeira comunhão aos seis anos de idade.
Juntamente com os santos Francisco e Jacinta, seus primos, foi um dos três videntes que testemunharam seis aparições de Nossa Senhora na Cova da Iria, segundo os seus testemunhos, reconhecidos pela Igreja Católica.
Francisca e Jacinta Marto morreram em 1919 e 1920, respetivamente; Lúcia ficou “mais algum tempo”, como lhe disse Nossa Senhora na aparição de 13 de junho de 1917.
Após as Aparições de Fátima, Lúcia Rosa dos Santos (nome de batismo), entrou no Colégio das Irmãs Doroteias, no Porto, em 1921, congregação onde foi religiosa a partir de 1928, permanecendo na Comunidade de Tuy e Pontevedra, na Galiza.
No dia 25 de março de 1948, a Irmã Lúcia entrou para o Carmelo de Santa Teresa em Coimbra, onde tomou o hábito de carmelita no dia 13 de maio de 1948 e professou em 31 de maio de 1949.
Por indicação do bispo de Leiria D. José Alves Correia, a Irmã Lúcia redigiu as memórias das Aparições de Fátima entre 1935 e 1941, cuja edição crítica foi publicada em setembro de 2016, as quais foram retomadas a pedido de monsenhor Luciano Guerra, reitor do Santuário.
No dia 13 de maio de 1967 regressou a Fátima para participar no cinquentenário das Aparições, a pedido do Papa Paulo VI, e nas três peregrinações do Papa João Paulo II (1982, 1991, 2000).
A Irmã Lúcia morreu no dia 13 de fevereiro de 2005 e foi sepultada no Carmelo de Coimbra; o seu corpo foi trasladado para a Basílica do Rosário de Fátima no dia 19 de fevereiro de 2006, onde foi tumulado ao lado da sua prima, Santa Jacinta Marto.
Em declarações à Agência ECCLESIA, D. Virgílio Antunes, bispo de Coimbra e antigo reitor do Santuário de Fátima, evoca a “ligação muito forte” com a irmã Lúcia, ao longo da sua vida, evocando alguém “com clarividência, com visão, com capacidade de liderança, com vivência da fé”. “O seu percurso de vida, enquanto adolescente, enquanto jovem, enquanto consagrada, tanto nas Irmãs Doroteias como depois nas Irmãs Carmelitas, no Carmelo de Coimbra, dá-nos esta sua abertura ao mundo: não foi uma religiosa fechada dentro do claustro”, observa. O bispo de Coimbra sublinha que a religiosa deixou o “testemunho de uma fé muito profunda, bem enraizada, uma fé vivida em Igreja e muitíssimo aberta a todas as realidades humanas e sociais”. “É um modelo de acolhimento e de abertura”, insiste. O vice-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa sublinha ainda a importância das “Memórias” da vidente, uma “fonte única para conhecer esta realidade das Aparições, da mensagem, da espiritualidade, até da teologia do fenómeno de Fátima, com o significado que tem para a vida da Igreja e da sociedade em geral”. Também padre Armindo Janeiro, vigário-geral da Diocese de Leiria-Fátima, evoca o papel “fundamental” da religiosa, cujos escritos permitem “o acesso à experiência das crianças”, videntes da Cova da Iria. “Celebrar estes 20 anos é, de alguma maneira, revisitar os seus textos, revisitar a sua experiência de fé e a sua sabedoria. O equilíbrio que ela teve ao enfrentar tantas dificuldades e tantos desafios, ao longo da vida, e perceber que ela nunca se desviou dessa experiência profunda, manteve-se sempre fiel ao mandato que recebeu por parte de Nossa Senhora”, acrescenta o sacerdote. A Ordem dos Carmelitas Descalços em Portugal evoca hoje este aniversário com uma conferência, no Carmelo de Santa Teresa em Coimbra, às 16h00, proferida pela irmã Ângela Coelho, vice-postuladora da causa de canonização; às 18h00, o bispo de Coimbra preside à Missa com a presença do reitor do santuário de Fátima, padre Carlos Cabecinhas, e do provincial da Ordem dos Carmelitas Descalços, padre Vasco Nuno. |
A fase diocesana do processo de beatificação e canonização da Irmã Lúcia de Jesus chegou ao fim a 13 de fevereiro de 2017, na igreja do Carmelo de Coimbra; a causa teve início em 2008, três anos após a sua morte, tendo na altura Bento XVI dispensado o período de espera de cinco anos determinado pelo Direito Canónico.
O processo implicou a análise de milhares de cartas e textos, além da auscultação de 61 testemunhas.
Francisco e Jacinta Marto, os outros dois videntes de Fátima, foram canonizados pelo Papa Francisco, na Cova da Iria, a 13 de maio de 2017.
LFS/OC
O decreto com a proclamação das virtudes heroicas da Irmã Lúcia, que ofereceu “a sua vida pela Igreja e pela conversão dos pecadores”, foi lido em Fátima na peregrinação de 13 de julho de 2023. “Profeta da ‘graça e misericórdia’ que Deus quer derramar sobre o mundo, oferece a sua vida, em união com Jesus-Eucaristia e com o Coração Imaculado de Maria, pela Igreja e pela conversão dos pecadores. Embora vivendo em clausura, a sua vida tornou a sua cela um lugar com um horizonte mundial”, refere o texto. O decreto com a proclamação das virtudes heroicas da Irmã Lúcia, do Dicastério para as Causas dos Santos da Santa Sé, assinala a vidente de Fátima foi “chamada a difundir no mundo a devoção ao Coração Imaculado de Maria”, vendo-se a si mesma “dentro da luz que se espargia das Suas mãos difundindo-se sobre a terra”. O Papa Francisco, “aceitando e confirmando” os votos do Dicastério para as Causas dos Santos, aprovou a publicação deste decreto. “Constam as Virtudes teologais da Fé, Esperança e Caridade para com Deus e para com o próximo, bem como as Virtudes cardeais da Prudência, Justiça, Fortaleza e Temperança, e as Virtudes anexas, em grau heroico, da Serva de Deus Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado (no século: Lúcia dos Santos), Religiosa Professa da Ordem dos Carmelitas Descalços, no caso e para os fins em questão”, pode ler-se. O documento também o percurso biográfico da Irmã Lúcia, que faleceu no Carmelo de Coimbra, há 20 anos, “com grande fama de santidade”. “Em virtude da fama de santidade e de sinais, foi celebrado, no Tribunal Eclesiástico da Diocese de Coimbra, o Inquérito Diocesano, em duas fases distintas, entre 2012 e 2017, cuja validade jurídica foi reconhecida pelo Dicastério, com Decreto de 14 de setembro de 2018”, indica o decreto. Em 1916, com os seus primos, os santos Francisco e Jacinta Marto, teve, por três vezes, Aparições do Anjo da Paz e, nos dias 13, de maio a outubro (à exceção de agosto) de 1917, Aparições da Virgem do Rosário; tornando-se, depois da morte dos primos, “a única guardiã da Mensagem de Fátima, tendo Nossa Senhora ‘como refúgio e caminho para Deus’”. Antes de entrar na Ordem do Carmelo, em Coimbra, “com o desejo de um maior recolhimento e silêncio”, a 25 de março de 1948, a Irmã Lúcia foi para o Instituto de Santa Doroteia, em Espanha, a 24 de outubro de 1925: em Pontevedra, a 10 de dezembro, “teve a Aparição de Nossa Senhora e do Menino Jesus, foi pedida a Devoção dos Primeiros Sábados”; em Tuy, a 13 de junho de 1929, “teve a Aparição de Nossa Senhora e da Santíssima Trindade, na qual lhe pedia a Consagração da Rússia ao Coração Imaculado de Maria”, realizada a 25 de março de 1984, por João Paulo II. “A partir do silêncio do claustro tornou-se uma figura universal, guardando no seu coração os dramas do mundo, através da oração e dos sacrifícios, unindo harmoniosamente as dimensões mística e profética. Esta última desenvolveu-se, também, através de uma intensa atividade epistolar e literária”, destaca o decreto das virtudes heroicas. |