Igreja: «Enquanto houver buscadores na humanidade estamos salvos» – Padre António Bacelar

Depois de nove anos na coordenação internacional dos padres e diáconos permanentes diocesanos do Movimento dos Focolares, em Itália, o padre da diocese do Porto regressou ao território em 1100 quilómetros feitos a pé e partilhados no livro «Regressar para sempre partir – memórias de um peregrino»

Foto: Agência ECCLESIA/LFS

Lisboa, 19 mar 2025 (Ecclesia) – O padre António Bacelar afirmou a necessidade de buscadores na humanidade e na Igreja, rejeitou “pessoas estacionadas, que invocam mais o currículo” do que a experiência e sublinhou a importância da “dúvida, da interrogação, da busca”.

“Enquanto houver buscadores na humanidade estamos salvos e haja mais também buscadores na Igreja, gente que é capaz de ir para além do sofá, que é capaz de caminho e de um caminho onde tem lugar a dúvida, a interrogação, a busca. Preocupa-me mais que entre crentes não haja buscadores do que não crentes que busquem. Preocupa-me mais gente que invocam o currículo de um percurso de tudo aquilo que fizeram na igreja, do que gente capaz de buscar, capaz de se abrir, de se interrogar”, apresentou à Agência ECCLESIA.

O padre António Bacelar fala numa Igreja que nasce a partir da escolha de Deus sobre cada um e a “resposta que cada um lhe dá”.

“A primeira escolha é sermos discípulos, é sermos cristãos. Eu encontro uma consonância muito grande com uma carta do Papa Francisco dirigindo-se a bispos e padres na América Latina, onde diz que ninguém foi batizado padre ou bispo, todos fomos batizados cristãos. E isto, eu vou-me permitindo declinar com as diversas funções de uma paróquia: ninguém foi batizado catequista, nem leitor, nem acólito. É como discípulos, e com o Espírito que somos capazes de seguir, e que a vida se renova”, explica.

Natural de Paredes de Coura, o padre António fez todo o seu crescimento no Porto, formou-se no Seminário diocesano e é atualmente pároco da Maia, mas durante nove anos esteve ao serviço do Movimento dos Focolares coordenação internacional dos padres e diáconos permanentes diocesanos.

Findo o trabalho em Itália, decidiu marcar o regresso a Portugal com uma peregrinação que uniu Saint-Jean-Pied-de-Port, na fronteira entre Espanha e França, e a Maia, local onde assume a paróquia, num total de 1100 quilómetros.

“Esta ideia dos buscadores tocou-me profundamente e fez-me encontrar-me comigo mesmo e agradecer também uma certa evolução. Há 30 anos, quando comecei a fazer os caminhos de Santiago, era-me espontâneo censurar quem não vinha com o Evangelho na mão e escolhia antes vir com o Paulo Coelho. Hoje não me impressiono tanto porque, mais do que uma atitude, joga-se sempre uma passagem – o desafio de uma passagem da religião à fé, mais do que uma atitude religiosa ou devocional”, traduz.

Ordenado em 1986, confirmou a sua vocação para ser padre diocesano numa “ligação estreita com movimento dos Focolares” e durante nove anos, entre 2014 e 2023, o padre António Bacelar foi coordenador internacional dos padres e diáconos permanentes diocesanos do Movimento dos Focolares viajando pela Ásia, África e Américas onde foi convidado a uma conversão à sobriedade.

“Mianmar, Paquistão, Síria, Burkina Faso, Venezuela, Andes peruanos, Argentina, Burundi, Zimbábue, Índia, Chile marcaram-me com experiências desconcertantes. O que mais me tocou é aquilo menos espetacular: visitar, estar e partilhar a vida com alguns colegas em algumas periferias”, recorda.

Em Portugal, nos seus primeiros anos como padre, e durante 26 anos, esteve ligado, na diocese do Porto à pastoral universitária e juvenil.

“D. Júlio Tavares Rebimbas, que me ordenou em 1986, chama-me e confia-me à pastoral universitária, dizendo – e essas palavras ficaram muito marcadas e têm muito a ver com os tempos que vivemos de sinodalidade – Ele dizia-me, tu não sabes o que é pastoral universitária, e eu também não, mas juntos descobriremos o caminho”, recorda.

Na pastoral juvenil e universitária o padre António Bacelar testemunhou uma “mudança de civilização”, acompanhando jovens que “não tinham Internet, telemóvel, não tinham ‘low cost’, Bolonha ou Erasmus”.

“Só estes cinco elementos, em poucos anos, provocaram uma grande reviravolta, e uma grande exigência, a que também procurei responder. Foi e continua a ser a grande marca da minha vida. A dimensão de solidariedade cresceu muito, quer através de uma certa comunhão de bens, através de um fundo de solidariedade, acorremos a 700 casos de necessidade, um serviço de explicações, mas toda a relação até com estudantes africanos”, indica.

O padre recorda já “uma mudança de paradigma” que implicava “não fazer as coisas para os jovens universitários, mas com eles, e a partir deles”.

Desde 2023, o padre António Bacelar é pároco “a tempo inteiro” na Maia, onde conjuga as palavras “caminho” e “serviço”.

A conversa com o padre António Bacelar pode ser acompanhada no programa Ecclesia, emitida hoje na Antena 1, pouco depois da meia-noite, e disponibilizada no podcast «Alarga a tua tenda».

LS

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